Antonio Sá – Ministério Público: Dois pesos e duas medidas?

Colunista do DIÁRIO DO RIO opina sobre a criação de secretarias por decreto na Prefeitura do Rio

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Sergio Fernandes foi nomeado como secretário de Inclusão e Diversidade Religiosa (Foto: Reprodução)

No Diário do Município do Rio de Janeiro do dia 3 de julho, temos a publicação do Decreto Rio nº 52814, DE 30 DE JUNHO DE
2023, que cria a Secretaria Especial de Inclusão e Diversidade Religiosa – SEID.

Sobre essa nova Secretaria criada por Decreto, que será dirigida por um Deputado Estadual do mesmo partido político do Prefeito
Paes, comenta-se que, dentre as motivações para sua criação, estaria o desejo de aumentar o apoio político do senhor Prefeito
para suas campanhas de reeleição e depois de eleição ao governo do Estado, bem como fazer a fila andar na Assembleia
Legislativa, permitindo que o suplente daquele parlamentar possa assumir o cargo de Deputado na Assembleia Legislativa do
Estado do Rio de Janeiro, adquirindo assim experiência e projeção política para as próximas eleições.

Já publiquei, neste Diário do Rio, dois artigos criticando essa prática inconstitucional de anos da Prefeitura de criar Secretarias por
Decreto. Veja aqui e aqui.

Nesses artigos, eu tratava da decisão na AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE nº 0082131-95.2022.8.19.0000, em que o
Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que declarou a inconstitucionalidade de Decretos do Governador, que
criavam Secretarias. Exatamente, o mesmo que a Prefeitura faz há anos e fez agora.

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Na ementa do Acórdão daquela decisão judicial, temos o seguinte: “Representação por Inconstitucionalidade.

Secretarias de Estado criadas por Decretos Estaduais que, ainda, operaram transformação de cargos públicos.
(…)

Criação de entes obrigatoriamente por lei formal, conforme exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal. Violação aos artigos 77,
incisos II e VIII; 112 §1o, inciso II, “d” c/c art. 145, VI “a” e 149 todos da Constituição Estadual.

Cargo público cuja transformação acarreta alteração das atribuições e a compatibilização dá-se através de lei formal dada a
natureza da nova função a ser exercida.

Flagrante descumprimento do disposto no artigo 98, inciso V da vigente Constituição Estadual do Rio de Janeiro.
(…)

declarando a inconstitucionalidade dos Decretos Estaduais no47349/2020; 47626/2021; 47627/2021; 47741/2021 e 47748/2021
que criaram cinco Secretarias de Estado.”

A singela “justificativa” do Estado para criar Secretarias por Decreto é a mesma que a Prefeitura apresenta. Eles alegam que os
Decretos que criam Secretarias somente reorganizaram (sem aumento de despesa, a estrutura da Administração Pública) e
transformam (também sem aumento de despesas) cargos em comissão e funções gratificadas, vagos ou não, que já existiam na
esfera da estrutura funcional da Administração pública, todos regularmente criados por atos normativos anteriores bem antigos.

Segundo os governos do Estado e do Município, tal “tese” seria respaldada pela Emenda Constitucional – EC nº 32/2001, que teria
determinado que caberia ao Chefe do Executivo, mediante decreto autônomo, dispor sobre matérias ínsitas à organização e
funcionamento da Administração Pública, condicionadas ao não aumento de despesa e que não prejudiquem direitos individuais.

No entanto, essa “tese” jurídica não foi corroborada pela Ministério Público em sua manifestação na ação sob análise e nem pelo
Órgão Especial de nosso Tribunal de Justiça em sua decisão naquela ação judicial.

Segundo a Procuradoria de Justiça, a EC nº 32/2001 outorgou ao Chefe do Poder Executivo dispor, por decreto autônomo,
somente sobre a organização e funcionamento da Administração Pública, desde que não se trate de criação ou extinção de órgãos
independente e autônomos.

Órgãos Públicos não podem ser criados ou extintos pela só vontade, eleitoreira ou não, do governante, eis que a criação ou
extinção de órgãos ou cargos depende de lei formal porque as Constituições Federal e Estadual pautam reservas legais para a
matéria.

Veja abaixo o que determina a Constituição Estadual:

“Art. 98 – Cabe à Assembleia Legislativa com a sanção do Governador do Estado, não exigida esta para o especificado nos artigos
99 e 100, legislar sobre todas as matérias de competência do Estado, entre as quais: (…)
V – criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas, observado o que estabelece o art. 145, caput, VI, da
Constituição; 

(…)
XIII – criação, estruturação e atribuições das Secretarias de Estado e entidades da administração pública indireta;
(…)u
Art. 145 – Compete privativamente ao Governador do Estado:
(…)
VI – dispor, mediante decreto, sobre:
a) organização e funcionamento da administração estadual, que não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de
órgãos públicos; (grifos meus)
b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos; (grifos meus)
(…)
Art. 149 A lei disporá sobre a criação e extinção de Secretarias de Estado e órgãos da administração pública .”
Já a Constituição Federal determina que:
“Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49,
51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:
(…)
X – criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas, observado o que estabelece o art. 84, VI, b ;    
XI – criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública;  
(…)
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
(…)
VI – dispor, mediante decreto, sobre:
a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de
órgãos públicos; (grifos meus)
b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos; (grifos meus)”

Na manifestação do Ministério Público naquela ação judicial, afirma-se que não há dúvida de que somente por meio de lei é
permitido criar e extinguir cargos e estabelecer remunerações e atribuições, além do que, havendo a invocação do poder
discricionário do Executivo, isso ocorrerá somente mediante iniciativa legislativa, descabendo fazê-lo através de expedição de
Decretos para criação de cargos, como faz sem oposição alguma a prefeitura do Rio de Janeiro há anos.

Como pudemos ver acima, no caso de criação de Secretarias por Decreto, o Ministério Público crítica veementemente o governo
do Estado do Rio de Janeiro, mas, infelizmente, não faz nada com relação ao governo do Município do Rio de Janeiro que as cria
por Decreto há anos….

Assim sendo, vamos aguardar para ver se, agora, o Ministério Público proporá o devido questionamento judicial, no caso do novo
e dos antigos Decretos da Prefeitura do Rio que também criam Secretarias, assumindo assim efetivamente seu papel ativo de
“custos legis”, ou seja de guardião da lei e das Constituições Federal e Estadual, fiscal da correta aplicação da lei e verdadeiro
defensor da sociedade.

Se não o fizer, ficará parecendo que ele teria dois pesos e duas medidas no caso de a inconstitucionalidade for praticada pela
Prefeitura ou pelo Estado do Rio de Janeiro.

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