Chico Alencar: Grande Rio abrindo caminhos para um grande Brasil

'A jovem Grande Rio, de Caxias (viva a Baixada!), com seus 34 anos, venceu pela primeira vez, com um enredo que afronta preconceitos religiosos e a intolerância fascistóide que destrói terreiros'

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Atual campeã, a Grande Rio vai falar sobre Zeca Pagodinho. Foto: Rafa Pereira

Neste Carnaval fora de época, do qual a Grande Rio, merecidamente, sagrou-se campeã, a maioria das escolas que desfilou no Sambódromo optou por enredos que contassem suas raízes ou que exaltassem aspectos das religiões de matrizes africanas, de forte ligação com suas origens. O resultado, acompanhado por quem esteve na Sapucaí ou assistiu pela TV, foram belos desfiles, de alto nível criativo e impacto visual arrebatador, embalados por uma safra de excelentes sambas-enredos.

A preferência por esse tipo de enredo não foi uma escolha influenciada pela pandemia. Longe disso. Quando foram escolhidos, em 2020, não se sabia, ainda, que o Carnaval de 2021 não aconteceria. Não houve Carnaval, mas os enredos aguardaram a hora de virem à tona.

Na verdade, no último Carnaval antes do toque de recolher forçado pela pandemia, em fevereiro de 2020, já era visível um salto de qualidade dos enredos apresentados e, consequentemente, dos sambas cantados na Avenida. As escolas saíram da zona de conforto e foram buscar em suas raízes a chave para renovar seus desfiles. Junto com essa mudança surgiu uma nova geração de competentes carnavalescos, antenados com os anseios da sociedade e com vontade de mostrar novas narrativas na Avenida.

Ao mesmo tempo, é visível, ano após ano, a participação cada vez maior nas escolas de componentes oriundos das comunidades que as compõem, o que permite um desfile com mais garra e identificação por parte de quem passa fantasiado na passarela.

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O campeonato da Grande Rio é fruto desse movimento. A jovem Grande Rio, de Caxias (viva a Baixada!), com seus 34 anos, venceu pela primeira vez, com um enredo que afronta preconceitos religiosos e a intolerância fascistóide que destrói terreiros. E louvando Exus, orixás que abrem caminhos, que orientam nas encruzilhadas da vida, que atiçam nossa vontade de existir. Somos corpos vocacionados à liberdade – girem, Pombas Giras! – carregados dos espíritos das luzes e das lutas. “As Sete Chaves vêm abrir meu caminhar/ à meia-noite ou no sol do alvorecer!” (valeu, amigo Paulo Cesar Feital, um dos autores do samba-enredo da tricolor da Baixada).

Na Série Ouro, a Império Serrano ascendeu, louvando o capoeirista baiano Besouro Mangangá, que só esteve entre nós por 27 anos. Exaltando o “mito” (verdadeiro) de quem, no alvorecer da República, não queria a Abolição só no papel (parabéns, amigo Leandro Vieira, o carnavalesco responsável pelo enredo apresentado), a verde e branco de Madureira emocionou a todos com seu lindo desfile. “A vida é rinha. Negro feito na cabeça/ não se rende a coronel”.

No desfile de São Paulo, que há tempos deixou de ser o “túmulo do samba”, a Mancha Verde foi bicampeã, denunciando com beleza e arte tudo o que mancha e exaure nosso bem mais essencial: a água. “Nem tudo que deságua é tempestade/ nem todo choro é saudade. À Terra (…) a nobre missão de preservar nosso futuro, nosso lar!”.

O Poder dos “caretas” e sisudos não entende o que vê. E, se entende, boicota. Mas a vida é amiga da arte. E o carnaval, seja nos blocos de rua e ou nas escolas, superando pandemias, devastação e preconceitos, é a mais bonita festa popular!

Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.

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