Papo de Talarico: Uma uruguaia e a cerimônia do Sol

A ovelha negra da família que sonhava com o Brasil

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La mano Uruguai
Punta del Este (foto: Alvaro Tallarico)

Lembrei da estupenda casa do artista Carlos Páez Vilaró, em Punta Ballena, e um pôr do sol emocionante. Um dos melhores que vi na vida. Quando aquela incrível bola amarela começa a descer, soltam um poema, do próprio Vilaró, naquele local chamado de Casa Pueblo. É a cerimônia do sol. “Hola, Sol” é como começa. Ao fim, a vontade é de chorar de alegria e emoção.

O que me fez recordar essa viagem de anos atrás foi uma uruguaia de 26 anos, baixa estatura, cabelos ondulados. Seu sonho era vir para o Brasil. Disse que em seu país natal emprego é algo difícil. Por lá, já trabalhou como garçonete, bartender, com colheita em fazendas, numa rotisseria de supermercado durante três anos e outros bicos mais. Juntou dinheiro pensando na meta. Seus pais e todos disseram para não ir, afinal, Brasil seria perigoso demais.

A jovem mulher tem três irmãos, dois mais velhos, uma mais nova. Todos de pais diferentes. Contou que isso é comum no Uruguai e piorou muito com a chegada das redes sociais. As relações não tem durado muito. Com 20 anos era morou com um argentino doze anos mais velho. Foram três anos. Em seguida, dois anos com um estadunidense, o qual, nesse momento, aluga o apartamento em que ela morava.

Gordita

Conectei a uruguaia com um grande amigo, e agora estão saindo. Tenho vocação para cupido. Adoro conectar pessoas. Outro dia juntei outro amigo com um casal argentino em um restaurante e deixei os três conversando, animados. Entretanto, voltando para nossa querida uruguaia, contou também que sempre pensara diferente de sua família. Era a ovelha negra. Segundo ela, foi chato não crescer com um pai, mas correu atrás de se cuidar desde adolescente. Vai trabalhar como voluntária num hostel em Copacabana por um mês. Vive maravilhada com o tanto de árvores que temos nas ruas, com nossas praias que tem clima solar o ano inteiro, com nossa comida farta e gostosa. Ah, e barata. Ela que disse. Sua mãe, vendo as fotos que posta nas redes, disse que ela engordou cinco quilos. “Estás gordita!”. A jovem diz que foram apenas dois. Está há uma semana no Rio de Janeiro.

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O brilho no olhar dela quando fala dessa cidade caótica é encantador. Comenta que é tudo um pouco sujo, muito lixo nas ruas, mas a natureza fala mais alto. A forma como essa uruguaia vê o Rio me ajuda a esquecer nossos problemas, a insegurança. Sim, há perigos em cada esquina, mas há vida pungente e pulsante.

O poema de Carlos Páez Vilaró termina assim:

“Adiós Sol…! Mañana te espero otra vez. Casapueblo es tu casa, por eso todos la llaman la casa del sol. El sol de mi vida de artista. El sol de mi soledad. Es que me siento millonario en soles, que guardo en la alcancía del horizonte”.

Então digo: Rio, com todos seus problemas, tu és meu sol e de muitos sonhadores. Tu iluminas as ovelhas negras e plantas sementes de música em corações machucados. Tu és o caos que abraço e pelo qual rezo, toda manhã, para que, quem sabe um dia, tua palavra mude para harmonia.

Gracias, Sol; gracias, Rio.

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