Como o Réveillon está aí, vou contar uma história que vivi há dois anos, quando passei uma virada de ano bem inusitada.
Véspera de Réveillon. Tenho que sair da Zona Oeste, Curicica, para a Zona Sul da cidade, Flamengo. Tranquilo. Eu tinha o cartão especial do metrô, o intenso trânsito entre essas duas regiões não iria me atrapalhar. Meu cartão era válido de 19h às 20h. Tudo bem, tudo certo. Mas tinha uma cerveja no caminho.
Às 17h, eu estava em casa com os familiares, tomando cerveja e me refrescando no chuveirão. “Dá tempo”, eu pensei. A ideia era sair de casa às 17h30, ir para Del Castilho, encontrar uns amigos, e de lá pegar o metrô para o Flamengo. Óbvio que daria tempo.
Às 17h30, além dos familiares, chegam os amigos. Ah, vamos tomar a última do ano. “Pego o metrô na Barra, aqui do lado de casa, rapidinho chego lá”, falei, abortando a missão Del Castilho.
Às 18h30, assustado, olho a hora no celular. A cerveja faz o tempo andar mais rápido.
Saio correndo de casa. Precisava chegar antes das 20h na Barra. Caso contrário, meu cartão especial do metrô não valeria mais nada e precisaria ir de ônibus, táxi, Uber, ou seja, me ferrar no trânsito que se forma na orla do Rio na véspera de Ano Novo.
Dito e feito. Eu, carregando dois engradados de cerveja, fico, no ônibus, preso no trânsito da Barra da Tijuca, perto da praia, ainda longe do metrô. Às 21h chego à estação. Meu cartão já era. Não havia como comprar outro. Fui pegar um ônibus rumo ao meu destino, bairro do Flamengo.
Às 21h30, pego um ônibus sentido Zona Sul. Meu teor alcoólico, adquirido com muito esforço ao longo do dia, tinha ido praia abaixo. Tudo parado na orla da Barra. Não tinha como fazer outro caminho. Era sentar e esperar. E foi o que fiz.
Às 22h30, eu ainda estava mais ou menos no mesmo lugar. As pessoas que iriam passar a virada na Barra desciam do ônibus e iam andando, não aguentavam mais esperar. Uns poucos guerreiros como eu, que iriam para a Zona Sul, resistiam bravamente dentro do coletivo.
Às 23h, já saindo da orla da Barra, na esperança de chegar antes da virada na Zona Sul, dois rapazes, que estavam perto de mim no ônibus e iram passar o Ano Novo na praia de Copacabana, abriram uma vodca para festejar. Bebi com eles. Aquela vodca poderia ser meu champanhe de meia noite.
Às 23h30, chegamos à Copacabana. Mas ainda longe da praia, que estava fechada para a passagem de ônibus. O ônibus parou. Ponto final. Um drama. Sugeri aos rapazes que pegássemos um táxi. Eles ficariam o mais próximo do local que iriam em Copacabana e eu iria para o Flamengo, onde meus amigos e amigas já estavam embriagados e me mandando mensagens de zoeira e preocupação.
Às 23h45, os rapazes desembarcaram próximo à praia. Consegui escutar o suspiro de alívio de um deles, que nunca havia passado a virada em Copacabana e queria muito ver a badalada queima de fogos.
Sigo no táxi. Acho que dá tempo. Era só uma reta. Quinze minutos. Eu também suspirava, mas em silêncio. Também queria chegar antes da virada, não queria ver os fogos pela janela do carro, sóbrio.
Meia noite do dia 31 de dezembro. Chego em frente ao prédio onde meus amigos festejam na cobertura. Saio do táxi. Olho para a praia do Flamengo. Queima de fogos, pessoas festejam, se abraçam nas ruas.
Fernando, o taxista, sai do carro, aperta minha mão, me deseja um feliz ano novo. Dou um gole na vodca que os rapazes deixaram comigo. Ofereço a bebida para o motorista. Ele diz que não pode, que está dirigindo: “O trânsito da cidade do Rio de Janeiro é complicado”, afirmou com razão.
Subo para cobertura do prédio. Meia noite e uns quebrados. Os amigos fazem festa com meu atraso. Feliz ano novo.