Decreto inconstitucional criando “Secretaria” da Receita-Rio e a CMRJ, o Puxadinho do Gabinete do Prefeito

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Centro Administrativo São Sebastião (Cass), sede da Prefeitura. Foto: Rafael Catarcione/Prefeitura do Rio.

Informo que, no Diário do Município do Rio de Janeiro de 30 de janeiro, temos a publicação de um decreto inconstitucional criando mais uma nova Secretaria Municipal.

Trata-se do DECRETO RIO Nº 55678, DE 29 DE JANEIRO DE 2025, que “Altera a organização básica do Poder Executivo Municipal”. Veja-o no seguinte sítio:

https://drive.google.com/file/d/1kswdaiSHAF-faMFt4dEN1BN3RHTckxbT/view?usp=drivesdk

Esse decreto, que possui somente três artigos, determina que a Receita-Rio terá status de Secretaria. Na realidade, está se sinalizando a “criação” de uma nova Secretaria Municipal POR DECRETO.

Ele determina também que o cargo de Auditor-Chefe da Receita-Rio fica equiparado ao cargo de Secretário para efeitos de organograma do Poder Executivo. Ou seja, o decreto sinalizaria um aumento na remuneração e no status daquele Auditor-Chefe.

E veja que só o titular desse cargo teria um aumento de remuneração. Os outros cargos da Receita-Rio não serão modificados. A nova Secretaria não terá o cargo imediatamente abaixo ao do Secretário, que é o de DAS-10A, já que este era o cargo daquele Auditor-Chefe, que agora será Secretário.

É claro que isso será passageiro, pois logo, logo virá um novo decreto recriando esse cargo DAS-10A, como ocorre amiúde na Prefeitura, com a singela desculpa de que será “sem aumento de despesa”.

Antes que argumentem que, de acordo com o texto desse decreto, as alterações a serem promovidas não implicarão aumento de despesas, ressalto que todos sabem que essa justificativa não passa de pura enrolação do governo.

A administração utiliza toda a ampla estrutura de cargos da Prefeitura para ajustar remunerações de forma indireta, recorrendo a manobras como a reorganização de cargos existentes, a extinção de cargos (inclusive vagos) e o remanejamento de funções. Dessa forma, ao eliminar determinadas posições e inflar os valores de outras, o governo afirma, de maneira conveniente, que não há aumento de despesas, quando, na realidade, há apenas uma reestruturação estratégica, inclusive utilizando cargos vagos, para atender a interesses específicos.

No passado, também por decreto, “estranhamente” o senhor Prefeito, para beneficiar o Auditor-Chefe, mudou somente o nome desse cargo em comissão de Subsecretário para Auditor-Chefe, embora não tenha aproveitado o mesmo decreto para mudar também o nome do cargo de Fiscal de Rendas para Auditor-Fiscal de Tributos.

Assim sendo, na antiga Secretaria Municipal de Fazenda e Planejamento – SMFP, atual Secretaria Municipal de Fazenda – SMF, para demonstrar a falta de coerência e a defesa de interesses individuais pelo Prefeito, passamos a ter um Auditor-Chefe para chefiar uma estrutura composta por Fiscais de Rendas e não por Auditores-Fiscais de Tributos.

Para apontar o inusitado dessa “nova Secretaria”, o decreto sob análise determina que a SMF continuará responsável pelo controle e coordenação das atividades da Receita-Rio…

Como é que é?

Inacreditável. Isso só demonstra que esse decreto visa a beneficiar somente determinado cargo, o que, salvo melhor juízo, feriria o princípio da impessoalidade.

Isso já não nos surpreende mais nos governos de Eduardo Paes.

Quem redigiu esse decreto e o próprio Prefeito que o assinou acham que os cidadãos cariocas são burros ou idiotas, pois argumentam, nos seus Considerandos, como justificativa para sua edição o seguinte:

“CONSIDERANDO a necessidade de priorização de recursos para a realização de atividades pela Administração Tributária, na forma do art. 37, XXII, da Constituição da República Federativa do Brasil; e

CONSIDERANDO a necessidade de se priorizar a atividade de arrecadação de receitas tributárias, as quais permitem a devida prestação dos serviços públicos de competência municipal,”

Linda essa justificativa, não é?

Só que, como se pode falar em priorização de recursos para a realização de atividades pela Administração Tributária e em priorizar a atividade de arrecadação de receitas tributárias sem garantir a existência de autonomia financeira e administrativa, já que será outra Secretaria a responsável pelo controle e coordenação das atividades da Receita-Rio?

Fala sério!

Logo, ao que parece, o único objetivo desse decreto seria, salvo melhor juízo, aumentar a remuneração e o status do Auditor-Chefe da Receita-Rio.

Seria bom avisar a quem redigiu esse decreto e ao próprio Prefeito que o assinou que não nos enganem, porque não gostamos.

E, se o senhor Prefeito gosta de ser enganado por quem minutou esse decreto, o problema é dele, mas o cidadão, ao contrário, odeia ser enganado.

Ora, como já escrevi em diversos artigos, essa desculpa esfarrapada de “sem aumento de despesas” não supre a inconstitucionalidade dos decretos que criam Secretarias, como o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro já esclareceu ao declarar a inconstitucionalidade dos decretos do Estado do Rio de Janeiro que criavam Secretarias com essa incorreta justificativa.

Destaco que a ação judicial contra esses decretos estaduais inconstitucionais foi proposta por Deputados Estaduais, pois a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro – ALERJ, ao contrário da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, não é submissa ao Poder Executivo e não abre mão de suas competências constitucionais.

Considerando a publicação do decreto sob análise, podemos perceber que, mais uma vez, o senhor Prefeito Eduardo Paes, tal qual um ditadorzinho de republiqueta das bananas, “brinca” com a estrutura da Prefeitura através de decretos inconstitucionais, sem a participação (na realidade, com a flagrante omissão/apoio) da Câmara Municipal do Rio de Janeiro – CMRJ, que, de novo, abre mão para o Poder Executivo de sua competência constitucional para se submeter aos caprichos e interesses pessoais e políticos do Prefeito.

Por isso, a CMRJ já é conhecida como sendo um “Puxadinho do Gabinete do Prefeito”.

Essa “delegação” inconstitucional da CMRJ, para o Prefeito, de sua competência privativa constitucional para aprovar, sem lei, a criação e a extinção de Secretarias é um desrespeito ao voto dos eleitores e aos princípios constitucionais da República e da Separação dos Poderes.

Sobre a inconstitucionalidade dos decretos do senhor Prefeito que criam ou extinguem Secretarias, recomendo a leitura do artigo abaixo:

“Cadê O MPRJ? Prefeito do Rio tem mais poder do que o Presidente da República?”

Recomendo também a leitura da íntegra do Acórdão da Representação por Inconstitucionalidade – RI, proposta por Deputados Estaduais (de uma ALERJ não submissa ao Poder Executivo, como ocorre infelizmente com a nossa CMRJ) contra os decretos do senhor Governador que criavam cargos e Secretarias, com o mesmo singelo argumento usado no decreto municipal aqui criticado, de que era sem aumento de despesas.

Veja essa íntegra no sítio abaixo:

https://drive.google.com/file/d/12nKANAfY8MA6Wku2Z7Wq6cNz0Y94htqo

Leia abaixo a Ementa desse Acórdão:

“TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

ÓRGÃO ESPECIAL

DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 0082131-95.2022.8.19.0000

REPRESENTANTES: LUIZ PAULO CORREA DA ROCHA

RUBENS JOSÉ FRANÇA BONTEMPO

REPRESENTADO: EXMO. SR. GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

RELATORA: DESA. GIZELDA LEITÃO TEIXEIRA

Representação por Inconstitucionalidade. Secretarias de Estado criadas por Decretos Estaduais que, ainda, operaram transformação de cargos públicos. Secretarias de Estado são órgãos autônomos integrantes da cúpula da Administração e a ela subordinados, tendo autonomias administrativa, financeira e técnica. Criação de entes obrigatoriamente por lei formal, conforme exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal. Violação aos artigos 77, incisos II e VIII; 112, §1º, inciso II, “d” c/c art. 145, VI “a” e 149, todos da Constituição Estadual. Cargo público cuja transformação acarreta alteração das atribuições e a compatibilização dá-se através de lei formal, dada a natureza da nova função a ser exercida. Flagrante descumprimento do disposto no artigo 98, inciso V da vigente Constituição Estadual do Rio de Janeiro. Procedência parcial da Representação, julgando-se extinto o feito em relação ao Decreto nº 47.523 de 12 de março de 2021 (que criara a Secretaria de Estado de Justiça), por perda de objeto, a teor do artigo 485, inciso VI do Código de Processo Civil, declarando a inconstitucionalidade dos Decretos Estaduais nº 47.349/2020; 47.626/2021; 47.627/2021; 47.741/2021 e 47.748/2021 que criaram cinco Secretarias de Estado. Visando resguardar-se a prestação dos serviços públicos no interesse dos cidadãos, atribui-se à presente decisão efeitos EX NUNC, buscando resguardar acontecimentos anteriores, concedendo-se o prazo de 06 (seis) meses para desarticulação das Secretarias criadas pelos Decretos antes mencionados.”

Destaco que essa RI transitou em julgado no ano passado, e o senhor Governador teve que aprovar leis na ALERJ (que não é submissa ao Poder Executivo, como infelizmente ocorre com a nossa CMRJ), convalidando tudo o que ele tinha criado por decretos inconstitucionais.

No caso do nosso município, a CMRJ, o Tribunal de Contas do Município e até o Ministério Público, seja lá por que motivo for, se omitem no que se refere aos decretos inconstitucionais do senhor Prefeito que criam cargos e Secretarias.

Para a alegria dos sonhos de poder do senhor Prefeito, os princípios constitucionais não são respeitados na Prefeitura.

Por fim, antes que queiram me criticar dizendo que sou contra a existência de uma Secretaria que trate da questão tributária, informo que sou a favor de sua criação, mas de uma Secretaria para valer, aprovada por lei, com recursos próprios e autonomia, e até com um fundo independente para financiar seus investimentos de fiscalização tributária.

E que defenda os interesses dos cidadãos e não o interesse pessoal de quem quer que seja.

O que não concordo e o que critico há muito tempo em meus artigos é a criação de Secretarias por decretos e a vergonhosa subserviência da CMRJ nessa questão ao senhor Prefeito, pois aprendi a amar e a respeitar o Poder Legislativo quando estava na ativa.

Não concordo também com o tipo de decreto como o aqui criticado que, salvo melhor juízo, parece só visar a beneficiar o Auditor-Chefe e não os cidadãos ou a Cidade.

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4 COMENTÁRIOS

  1. inconstitucional e ninguém faz nada ? Então não existe a necessidade de sustentar Tribunais , Ministérios e etc ..Já que o político faz o que quer sem respeitar nem a Carta Magna , acabou a República e a cidadania .

    • Prezado Roberto, grato pela informação complementar A ALERJ agiu em caso semelhante praticado pelo governador. Infelizmente, a CMRJ se omitiu e aceita ceder inconstitucionalmente seu poder para o Prefeito. A Justiça agiu prontamente no caso do Estado, mas ela precisa ser acionada. Só que a CMRJ, o TCM e o MPRJ nada fazem. Um abraço. Antônio Sá

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