Diego Lacerda: A preservação esquecida na Lei de Incentivo à Cultura no Rio

Em 2023, cerca de 3.800 projetos foram inscritos na Lei do ISS. É importante destacar que esse número se refere apenas às inscrições — não necessariamente ao total de projetos patrocinados. Desses milhares de projetos, apenas 77 eram voltados à preservação do patrimônio histórico e cultural da cidade

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Em 2023, cerca de 3.800 projetos foram inscritos na Lei do ISS. É importante destacar que esse número se refere apenas às inscrições — não necessariamente ao total de projetos patrocinados. Desses milhares de projetos, apenas 77 eram voltados à preservação do patrimônio histórico e cultural da cidade

Como já é tradição, neste mês de maio foi lançado o edital para produtores culturais que queiram inscrever projetos na Lei de Incentivo à Cultura do município do Rio de Janeiro — mais conhecida como a Lei do ISS. A dinâmica é simples: os proponentes apresentam seus projetos, e, se aprovados, entram na fase de captação de recursos junto a empresas interessadas em patrocinar iniciativas culturais. O valor investido é abatido do ISS — Imposto Sobre Serviços — que essas empresas pagam à Prefeitura.

Apesar da importância desse mecanismo de fomento, um diagnóstico preocupante chama a atenção.

Consultando o portal de transparência Lei do ISS, da Prefeitura do Rio, observa-se que, em 2023, cerca de 3.800 projetos foram inscritos na Lei do ISS. É importante destacar que esse número se refere apenas às inscrições — não necessariamente ao total de projetos patrocinados. Desses milhares de projetos, apenas 77 eram voltados à preservação do patrimônio histórico e cultural da cidade. Isso representa aproximadamente 2% do total.

E o problema vai além. Desses 77 projetos, apenas 2 projetos, conseguiram, de fato, atrair patrocinadores. Isso ocorre, em grande parte, porque iniciativas voltadas à restauração de bens históricos e culturais ainda não possuem o mesmo apelo — o “chamariz” — que projetos de música, teatro ou eventos de grande visibilidade costumam ter. A concorrência, nesse cenário, torna-se desleal.

É uma pena. A cidade do Rio de Janeiro tem um patrimônio riquíssimo, com casas, sobrados, Igrejas e parques tombados que merecem atenção — como o Parque Ari Barroso (na Penha Circular), o Parque Natural Municipal da Cidade (na Gávea) e o Parque Natural Municipal Darke de Mattos (na Ilha de Paquetá), todos tombados.

Além disso, o Rio é o município com o maior número de escolas tombadas do estado, reconhecidas por seus valores arquitetônicos, culturais e históricos. Imagine o potencial de projetos que unam educação patrimonial com a restauração desses espaços escolares, muitos deles centenários. Seria uma revolução silenciosa na valorização da memória e no fortalecimento da identidade cultural carioca.

Infelizmente, essa não é a realidade. Se poucos projetos voltados ao patrimônio estão sendo inscritos — e menos ainda contemplados —, é urgente repensar os mecanismos da Lei de Incentivo para que essa área, tão estratégica e cheia de possibilidades, seja finalmente valorizada como merece.

Mais ainda: essa poderia ser uma poderosa alavanca para impulsionar a revitalização do centro da cidade, que concentra o maior número de bens tombados do município, como também, das não tão famosas APACs – Áreas de Proteção do Ambiente Cultural.

Uma possibilidade é a elaboração de editais específicos para projetos de restauração e revitalização de bens tombados, incluindo a educação patrimonial, tão fundamental numa sociedade onde a memória muitas vezes é deixada de lado pelos inúmeros problemas do cotidiano e pela força das intervenções imediatistas.

Esses editais poderiam ser lançados pela Secretaria Municipal de Cultura ou através do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade – IRPH, órgão da Prefeitura responsável pelos bens tombados e preservados a nível municipal. O Governo do Estado, através da SECEC, fez isso em 2024, direcionando um edital específico, via Lei Aldir Blanc, para projetos de restauração e revitalização de bens tombados pelo INEPAC. Algo semelhante poderia ser feito pela Prefeitura.

Diferentemente de eventos pontuais, projetos de restauração e revitalização geram resultados permanentes, que podem beneficiar a cidade por décadas. A preservação de um bem tombado, uma vez concluída, continua a impactar positivamente o território, fortalecendo a identidade local, estimulando o turismo cultural, e servindo de referência educativa para várias gerações. Trata-se, portanto, de um investimento com retorno cultural e social contínuo e cumulativo.

*Diego Lacerda, produtor Cultural

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1 COMENTÁRIO

  1. Bom dia.
    Muito interessante a abordagem do Diogo Lacerda. Pesquiso sobre moradia popular e gostaria muito de ter o contato dele.
    Gratidão,
    Karla Belfort

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