Irmandade de Santo António dos Pobres: 200 anos de história e impacto social

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Fundada em 1807 no Rio de Janeiro, a Irmandade do Santíssimo Sacramento Santo Antônio dos Pobres presta assistência a pessoas humildes, doando roupas, calçados e alimentos. Localizada na bela igreja da Rua dos Inválidos, uma via histórica conhecida por seus serviços e apoio desde as guerras, a irmandade continua a oferecer significativa ajuda. Atualmente, a organização é promovida pelo português José Queiroga, nascido em Botica e residente no Brasil há 53 anos, responsável pela administração da igreja bicentenária.

O local foi criado devido ao expressivo número de devotos de Santo Antônio na cidade, liderados pelo capitalista Antônio José de Souza Oliveira, que fundaram a Irmandade do Santíssimo Sacramento Santo Antônio. Ao longo de dois séculos, a aliança mantém a tradição de distribuir cestas básicas e cafés da manhã aos mais vulneráveis na última terça-feira de cada mês, além de oferecer o “Pão de Santo Antônio” todas as terças-feiras para aqueles que mais necessitam.

Nesta terça-feira (29/07), por exemplo, a irmandade distribuiu 153 cestas básicas com 13 kg de alimentos, um saco de pão com 8 unidades e café da manhã, devido à colaboração da DGACCP e outros. Segundo José Queiroga, espera-se que na primeira terça-feira do próximo mês (06)  ocorra a distribuição de roupas e calçados.

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A irmandade nasceu como um local para os mais vulneráveis também poderem frequentar, por isso o nome Irmandade do Santíssimo Sacramento Santo Antônio dos Pobres. Tudo foi criado para que esses devotos pudessem participar. O Brasil é um país tão rico, mas ainda sofre com pobreza e segregação social. Na irmandade, todos são bem-vindos, independentemente da classe social. Ajudamos e acolhemos a todos“, afirma.

Senhoras com doações de cestas básicas. Reprodução: Divulgação.

A história de um local sagrado

A iniciativa, que já possui 200 anos, começou com a chegada da Família Real Portuguesa ao Rio de Janeiro em 1808. O negociante Antônio de Oliveira, grande devoto de Santo Antônio de Lisboa, adquiriu um terreno na esquina da Rua dos Inválidos com a Rua do Senado, que doou à irmandade recém-fundada. A motivação veio da chegada de uma bela imagem do Taumaturgo de Portugal.

Santo Antônio sempre foi devoto da pobreza e das almas puras e simples. Como já havia uma igreja dedicada ao mesmo santo no Largo da Carioca, a irmandade levantou esta nova igreja, intitulada Santo Antônio dos Pobres. Três anos após o início da construção, a igreja foi concluída e entregue ao povo com grande solenidade, contando com a presença da Família Real e altos dignitários da Corte. O compromisso da irmandade, enviado à Mesa de Consciência e Ordens, obteve aprovação em 25 de fevereiro de 1817.

Pessoas esperando para receber doações nos dias atuais. Reprodução: Divulgação

De acordo com José Queiroga, mesmo concorrida pelo povo simples, houve épocas que assistir à missa no local era  considerado um sinal de alta elegância. Ali, oraram pessoas de destaque durante o reinado e o Império, incluindo D. João VI e Dona Carlota Joaquina. Posteriormente, todos os Imperadores do Brasil curvaram os joelhos em veneração ao santo português. Além disso, Dom João VI atribuiu à especial intercessão de Santo Antônio a vitória de seus exércitos sobre os de Napoleão, expulsando-os do solo português e condecorando o santo com a Comenda do Exército de Portugal.

O local recebeu diversas visitas ilustres, incluindo D. João VI e todos os imperadores do Brasil. Em 15 de agosto de 1807, a igreja foi fundada, e em 1811 foi reconhecida como a primeira Igreja de Santo Antônio dos Pobres. Este local é sagrado para todos nós. Tenho profundo amor por este lugar e sempre acolhemos todos de braços abertos”, ressalta o provedor. 

Em 1831, o paroquiano Manuel Machado Oliveira trouxe para a igreja a famosa a imagem de Nossa Senhora dos Prazeres, que ficava exposta num nicho no Arco do Telles, que na época estava muito degradado. A imagem ganhou um altar na igreja e a irmandade passou a se chamar Venerável Irmandade do Santíssimo Sacramento, Santo Antônio dos Pobres e Nossa Senhora dos Prazeres. Um movimento de comerciantes da regiào do Arco do Teles, liderado pelo Diretor Executivo do Diário do Rio, sonha em fazer uma peregrinação da bela imagem da Senhora dos Prazeres entre a Igreja de Santo Antônio e a Igreja da Lapa dos Mercadores, atravessando a travessinha que corta o Arco, para que a Santa possa ser fotografada novamente no seu local de origem. A famosa “bruxa” do Arco do Telles – Bárbara dos Prazeres – ocupou o espaço após a retirada da Santa.

No entanto, em 1828, os Frades Capuchinhos, desalojados de seu abrigo provisório na Rua Evaristo da Veiga, mudaram-se para o Templo de Santo Antônio dos Pobres. Esse deslocamento gerou descontentamento, especialmente quando a imagem de Santo Antônio foi substituída pela de São Félix de Cantalice no Altar-Mor. Esse ato causou protestos que chegaram ao Imperador. Em 1832, os Capuchinhos deixaram o local, extinguindo sua comunidade no Rio de Janeiro, mas retornaram em 1834 a pedido do Governo Imperial.

Para demonstrar as dificuldades enfrentadas pela Irmandade em 1836, citamos um fato registrado em seus arquivos. Naquele ano, a irmandade passava por problemas financeiros. Um sacristão, que também atuava como cobrador, solicitou um aumento salarial. Apesar de seu trabalho ser reconhecido, a administração teve de justificar a medida devido à situação financeira. O aumento concedido foi de apenas 20.000 réis mensais”, conta o resumo histórico exposto no quadro da igreja.

O tempo não poupou a Igreja de Santo Antônio. Após 129 anos de sua construção, as paredes começaram a apresentar grandes fissuras. Em 1936, o administrador Hermenegildo Mesquita, com o apoio do povo e dos fiéis do bairro, concretizou o sonho de preservar a fé em Santo Antônio na Rua dos Inválidos. O Monsenhor Felicio Magaldi, Vigário da Matriz, liderou os esforços para restaurar a local.

Igreja de Santo Antônio dos Pobres, antes das obras da década de 1940.
Reprodução: Biblioteca Nacional.

O Provedor da Irmandade, Antonio Parente Ribeiro, trabalhou incansavelmente, e em 1940, após a demolição parcial do antigo templo, a Pedra Fundamental do novo edifício em estilo neo-românico foi lançada em 23 de abril, com a bênção do Núncio Apostólico Dom Bento Aloisi Masela, representando o Cardeal Dom Sebastião Leme.

Em 13 de junho de 1942, dia de Santo Antônio, a Capela-Mor estava concluída. O delegado por Dom Sebastião Leme, Monsenhor Magaldi, realizou a cerimônia de inauguração e bênção da parte pronta do templo. As obras foram finalizadas em 1949, sem interrupção dos cultos. A nova igreja, construída 1,20 m acima do nível da rua para evitar inundações, possui belíssimos vitrais que retratam passagens da vida de do santo.

Igreja de Santo Antônio dos Pobres, após as reformas de 1950.
Reprodução: Acervo Particular/ Diário do Rio.

A história atual

Em 2010, a construção de quatro torres de escritório no terreno adjacente provocou danos estruturais na Igreja, resultando em rachaduras no piso e nas paredes. Após três anos de restauração, foi revelado o piso original da Igreja de 1811, que agora está exposto ao público sob um revestimento de vidro.

Foto do piso da Irmandade. Reprodução: Rio de Janeiro Aqui.

A igreja foi tombada pelo Patrimônio Histórico do Rio de Janeiro em 6 de setembro de 1987, conforme o Decreto nº 6932. Em 26 de maio de 2013, a igreja foi reinaugurada com uma missa celebrada pelo Arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Dom Orani João Tempesta, na presença do Prefeito Eduardo Paes e do Cônsul Geral de Portugal no Rio de Janeiro, Embaixador Nuno Belo, representando o Governo de Portugal.

A tradicional Irmandade Santo Antônio dos Pobres realiza há muitos anos atividades caritativas e sociais para apoiar os necessitados que buscam ajuda. Todas as terças-feiras, são distribuídos pães e outros alimentos, além de roupas, calçados e cobertores durante o inverno, atendendo a mais de 200 famílias com cestas básicas ao longo de todo o ano. Esse trabalho conta com o apoio constante dos Irmãos e Irmãs, bem como dos devotos de Santo Antônio. Todo o trabalho realizado pela Diretoria e por trabalhos voluntários.

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Gabriella Lourenço

Carioca da gema, entusiasta por contar histórias e eterna aprendiz. Apaixonada pelo Rio de Janeiro e por suas nuances, desde as belezas das praias da Zona Sul até a força vibrante do subúrbio.