Jorge Jaber: Estudo global revela o que nos faz viver melhor

Estudo promovido por instituições como as universidades de Harvard e Baylor que procurou, em entrevistas com cerca de 200 mil pessoas de 22 países, respostas para uma questão complexa: o que é, nas diversas regiões, culturas e condições socioeconômicas do planeta, viver bem?

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Pessoas andam pelo centro do Rio de Janeiro | Foto: Rafa Pereira - Diário do Rio

Dinheiro não traz felicidade, a fé move montanhas e um bom casamento é um ótimo remédio para o coração. Esses e outros ditados, manifestações da sabedoria popular, ganharam confirmação científica com a divulgação dos resultados iniciais do Global Flourishing, estudo promovido por instituições como as universidades de Harvard e Baylor que procurou, em entrevistas com cerca de 200 mil pessoas de 22 países, respostas para uma questão complexa: o que é, nas diversas regiões, culturas e condições socioeconômicas do planeta, viver bem? O que nos leva ao estado de “florescimento” individual e coletivo citado no nome da pesquisa?

Antes de apresentar alguns pontos do documento, vale esclarecer que ele se baseia em seis interrogações: estou feliz e satisfeito com minha vida? Ela tem significado e propósito, e caminha numa direção clara? Tenho saúde física e mental? Sou uma pessoa de caráter e virtude, disposta a agir para promover o bem, mesmo em situações difíceis? Minhas relações sociais com amigos e parentes são firmes e recompensadoras? Estou financeira e materialmente seguro em relação a minhas necessidades básicas, como alimentação e moradia? Um enfoque, portanto, multidimensional do bem-estar, não reduzido a dados tradicionais como PIB, renda per capita ou IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).

Algumas das conclusões do trabalho contrariam uma lógica, digamos, convencional. Por exemplo: países como Indonésia, Filipinas e México, com PIB per capita baixo ou médio, ostentam índices de florescimento mais elevados que o do Japão – o último do ranking –, Reino Unido e até mesmo Estados Unidos, maior economia do mundo. Outro ponto fora da curva, pelo menos para os que encaram a velhice quase como um castigo, é ver mais pessoas acima dos 50 anos do que jovens adultos entre os “florescentes” em nações como o Brasil, Argentina e Austrália. Este, porém, não é um padrão universal: em outras, como Índia e Egito, os jovens ocupam o topo da lista.

Embora o tema não tenha sido abordado no estudo, é curioso constatar que os países com índices mais altos de florescimento sofrem menos com outra questão delicada: o suicídio. Na Indonésia, por exemplo, a taxa de pessoas que abreviam a própria vida é de menos de três a cada 100 mil habitantes, quase seis vezes mais baixa que a japonesa, segundo estatísticas da Organização Mundial da Saúde. Isso indica que os mesmos fatores que elevam o bem-estar – conexões sociais fortes, envolvimento comunitário intenso e práticas religiosas ou espirituais, entre outros – podem servir de barreiras protetoras contra a ideação suicida, independente da região ou condição financeira.

A religiosidade, por sinal – especialmente a vivida comunitariamente –, é uma alavanca poderosa para o florescimento humano: segundo a pesquisa, a sensação de bem-estar é maior naqueles que participam mais de uma vez por semana de serviços religiosos. Isso ocorre porque a religião ajuda a desenvolver um senso de propósito e redes de apoio coletivo, além de estimular sentimentos de gratidão e esperança e promover hábitos de vida saudáveis. O mesmo vale para pessoas casadas ou em relações afetivas estáveis e para os empregados ou profissionais autônomos, não somente pela questão financeira, mas também pelas conexões sociais que o casamento e o trabalho proporcionam.

O estudo é extenso, e novas informações – inclusive sobre o Brasil – ainda serão divulgadas, mas as disponíveis já nos permitem pensar no ser humano sob uma perspectiva mais abrangente. Para as autoridades, é uma ferramenta valiosa na elaboração de políticas públicas voltadas a esse bem-estar amplo. Para nós, a nível individual, um convite à reflexão e a uma nova postura, mais tranquila e otimista, diante dos desafios da vida. Num país conturbado como o nosso, seria uma bela notícia.

*Jorge Jaber é psiquiatra

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