Márcia Silveira: o fascínio da irracionalidade

Crítica literária comenta sobre o livro A História Secreta, de Donna Tartt

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Foto: capa do livro

A História Secreta é o primeiro livro da premiada escritora norte-americana Donna Tartt. Foi lançado em 1992 e publicado no Brasil pela Companhia das Letras em 1995, com tradução de Celso Nogueira.

O romance é narrado pelo personagem Richard Papen, de 28 anos. Richard nasceu na Califórnia e, aos 19 anos, foi admitido na Universidade de Hampden, em Vermont, onde se passa a narrativa. Lá, ele observa um grupo de cinco alunos que andam sempre juntos e têm aulas apenas com um professor de grego meio misterioso chamado Julian. Após algumas tentativas, Richard consegue ser admitido nas aulas de grego e passa a fazer parte do grupo junto com os personagens Henry, Bunny, Francis, Charles e Camilla.

Logo na primeira página do livro ficamos sabendo que o personagem Bunny está morto e que os culpados são os componentes do grupo – inclusive Richard. E que ele resolveu contar essa história porque, apesar de todo o tempo passado, ela ainda estava viva dentro dele.

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“Suponho que, em algum momento de minha vida, eu teria um sem-número de histórias, mas agora não há nenhuma outra. Esta é a única história que posso e poderei contar.”

A partir daí, começamos a ler a narrativa dos acontecimentos que levaram à morte de Bunny, desde antes da chegada de Richard em Hampden, até as consequências do acontecimento na vida de cada um dos componentes do grupo.

A história é um misto de romance policial, thriller psicológico e tragédia grega – com direito a rituais dionisíacos no meio da floresta. São muitas as discussões e referências filosóficas, como as tragédias gregas As Bacantes, de Eurípides e Agamemnon, de Ésquilo, além de outras obras clássicas. Os personagens estão sempre citando termos em latim e grego e falando sobre as culturas grega e romana. Numa aula sobre a loucura induzida pelos deuses, o professor Julian fala aos alunos sobre o fascínio e o terror que a irracionalidade (perda do controle) provoca nas pessoas:

“Lembram-se do que falamos há pouco, das cenas terríveis, sanguinárias, que por vezes são as mais sedutoras? Trata-se de um conceito bem grego, e muito profundo. Beleza é terror. O que chamamos de belo provoca arrepios. E o que poderia ser mais aterrorizante e belo, para mentes como a dos gregos e a nossa, do que a perda total do controle? Soltar as amarras do ser por um instante, estraçalhar a estrutura de nossos egos mortais?”

Os personagens de A História Secreta são intrigantes e a narrativa prende o leitor, não apenas pelo mistério, mas também pelas discussões filosóficas colocadas pelo professor e pelos alunos. Na edição que li, percebi alguns probleminhas de tradução e revisão, mas nada que prejudique muito a leitura. Sobre a escrita de Donna Tartt, o que me chamou a atenção foram as muitas descrições detalhadas de cenários externos, o que em alguns momentos deixa a leitura mais lenta. Tive a impressão de que o livro poderia ser um pouco menor, que, ainda assim, o leitor não perderia em ambientação. De qualquer forma, o livro é muito bom. Uma ótima leitura para quem gosta de suspense e de filosofia.

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Livro: A História Secreta

Autora: Donna Tartt

Editora: Companhia das Letras

Tradutor: Celso Nogueira

Páginas: 520

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Nota: 4 (de 5)

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1 COMENTÁRIO

  1. Não à toa, o ser humano sempre buscou no álcool, no fumo e nas drogas psicotrópicas esta fuga (ou será busca?) daquilo que mesmo revestido da realidade terrena, incita a curiosidade, pois o homem sabe que além muro não é o vazio, mas uma boa parte de sua essência.
    Como se os pudores da realidade nunca a deixassem se despir totalmente, a ponto de a apreciarmos nua e crua, em pelo, mas sim, um paredão que nos envolvesse cada um de per si e todos ao mesmo tempo, um evidente anteparo do ego e superego a ser ultrapassado, em busca do Id, de onde viemos, o grande mistério que rivaliza com a angústia da morte.
    Alguns buscam este aprofundamento na busca incessante do conhecimento, mais e mais, na ânsia de que esta busca rasgue a tela da realidade. No entanto, em um dado momento, a razão pura e simples já não é suficiente para responder a muitas questões.
    Afinal, será que a busca é sempre por respostas, ou o objetivo maior é a descoberta?
    Neste momento, os copos tilintam, a fumaça envolve aquele ambiente aconchegante e se vê além dos tetos, a figura de Lucy in the Sky with Diamonds

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