
Na quinta feira passada, 30 de janeiro, foi realizada a cerimônia de lançamento do novo Banco de Bens Culturais Procurados – BCP do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, na sede da autarquia federal, em Brasília.
Criado nos anos 90 e disponível para consulta na internet a partir do final da década de 2000, a nova versão desse banco de dados foi desenvolvida no âmbito do Departamento de Patrimônio Material do órgão, dirigido pelo Prof. Andrey Schlee, na Coordenação Geral de Autorização e Fiscalização (chefiada pela arquiteta Elisa Taveira) e sob os cuidados diretos da coordenadora de circulação – a também arquiteta Talita Sá. O produto visa atender aos anseios de um mundo digital no qual a circulação de obras de arte alcançou uma escala hiperbólica, inédita até então.
Tal cenário é objeto de preocupação das autoridades e até da imprensa – que tem pautado o assunto – uma vez que o tráfico de bens culturais é uma realidade antiga a ser combatida com maior eficácia. O incremento tecnológico e as possibilidades de uso da Inteligência Artificial ajudarão nessa tarefa. Cálculos mais criteriosos, por exemplo, já situam a quantidade de bens protegidos nacionalmente na ordem de grandeza das centenas de milhares, podendo passar de um milhão.
Mas, voltando ao que interessa:
1) o que é o BCP?
Disponível em bcp.iphan.gov.br, o banco é um canal de diálogo do Iphan – órgão responsável pelo patrimônio cultural brasileiro – que, entre tantas atribuições, deve fiscalizar o comércio e circulação de acervos e coleções. Entre as principais restrições legais existentes, podemos destacar: a) nenhum objeto sacro proveniente de monumento religioso tombado pode ser retirado do seu local de guarda original; b) bens culturais produzidos ou trazidos ao Brasil antes do fim do período monárquico não podem ser retirados do país; c) bens arqueológicos e paleontológicos tem comercialização proibida; d) objetos com tombamento estadual ou municipal também não devem ser retirados do local de jurisdição da proteção legal.

2) Pra que serve o BCP?
Diante do exposto, qualquer item arrolado no Banco de Bens Culturais Procurados – BCP do Iphan é considerado publicamente um objeto subtraído de seu contexto primordial e, caso seja localizado, deverá ser restituído ao local de guarda original.
3) Quem pode usar o BCP?
A ferramenta se configura, portanto, num subsídio para comerciantes, antiquários, colecionadores, leiloeiros, policiais, proprietários, autoridades do patrimônio, pesquisadores… Isto é, todas as partes direta ou indiretamente envolvidas no campo da preservação de acervos e coleções podem usar o portal para denúncias e consultas – inclusive no caso de extravios de bens com tombamento municipal, estadual ou com outra proteção pertinente.
Reparem que citei primeiramente os colecionadores, comerciantes e seus pares. Foi de propósito. Devemos estabelecer pontes entre o mercado da arte e os órgãos de tombamento, sempre em defesa da preservação. Não custa lembrar, por exemplo, que figuras eminentes como Mário de Andrade e Dom Clemente Silva Nigra, que tanto defenderam o patrimônio cultural, também colecionavam. O primeiro foi idealizador do IPHAN; o segundo foi perito de arte do órgão e organizou diversas exposições.

Cremos, portanto, que somente convergindo os interesses entre o mercado e a preservação – com seus órgãos institucionais de proteção – há a real possibilidade de êxito na restituição em massa dos bens subtraídos. Hoje, o BCP do IPHAN tem 1702 bens procurados, mas sabemos que tal número é subestimado. Ainda assim, a cada dia – com o esforço auspicioso de “players” como Claudio André de Castro (comissário administrativo da irmandade de N. Sra. da Lapa dos Mercadores); Pe. Silmar Fernandes, Daisy Ketzer e a Comissão de Bens Culturais da ArqRio; Pe. Luciano Silva (assessor para Bens Culturais da CNBB), D. Mauro Fragoso (Mosteiro de S. Bento) e a Dra. Paula Mary (delegada da Polícia Federal), entre outros, os resultados de identificação e devolução de bens tem sido amplificados, dia após dia. E isso é bom para todos os envolvidos. Tratarei com mais profundidade do tema semana que vem, na segunda parte deste artigo.