O Pajé Sombrio e o Carnaval Sangrento

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Imagem gerada por Inteligência Artificial

Aproveitei este Carnaval para fugir da folia e embarcar em uma viagem de barco, buscando um pouco de sossego longe das ruas lotadas do Rio de Janeiro. No balanço das águas, decidi mergulhar na vida e na obra de Robert E. Howard, o mestre do conto pulp e criador de personagens icônicos como Conan, o Bárbaro, Solomon Kane, Kull de Atlântida e Bran Mak Morn. Sua escrita intensa e brutal, carregada de um senso quase palpável de horror ancestral e violência primitiva, sempre me fascinou. Mas revisitar sua curta trajetória – um talento brilhante ceifado cedo demais – apenas reforçou minha admiração pelo seu legado.

Entre leituras de contos sombrios e aventuras selvagens, me ocorreu uma ideia: e se o Rio de Janeiro tivesse sua própria história de terror ao estilo de Howard ? Algo que misturasse a vibração frenética do Carnaval com o horror cósmico e mitológico que ele sabia criar tão bem ?

Assim nasceu “O Pajé Sombrio e o Carnaval Sangrento”, um miniconto ambientado nas ruas cariocas durante a maior festa do mundo. Mas, nesta versão, a cidade não celebra apenas alegria e liberdade – ela desperta algo antigo, faminto e sedento por vingança.

Agora, convido você a entrar nessa história. Mas cuidado: nem todo bloco termina ao amanhecer, e algumas entidades nunca foram feitas para dançar entre os vivos…

“O Pajé Sombrio e o Carnaval Sangrento

O Rio de Janeiro pulsava ao som dos tambores. O cheiro de suor, cerveja e maresia impregnava o ar, enquanto a multidão, um mar de máscaras e brilhos, se entregava à loucura do Carnaval. Mas no meio da folia, algo se movia na escuridão – algo antigo, vingativo e esquecido.

Aline Macedo, uma jornalista cética e experiente, havia recebido uma dica estranha naquela manhã. Um velho mendigo, com olhos gastos pelo tempo e a boca desdentada, lhe agarrou o braço na Lapa e sussurrou com um hálito podre:

— “O Pajé Sombrio caminha esta noite…”

Aline riu da superstição. Estava acostumada a histórias absurdas na cidade dos mil mistérios. Mas o velho insistiu, seu olhar febril transbordando pavor.

— “Os blocos não sabem, mas esta terra já foi sagrada. O Pajé-Guerreiro dos Tupinambás fez um pacto de sangue para proteger sua aldeia, mas foi traído e morto. O chão bebeu sua ira. Hoje, quando os tambores do Carnaval fazem o Rio pulsar como um coração vivo, ele volta… e não quer dançar. Ele quer vingança.”

A jornalista afastou-se, incomodada, e seguiu seu caminho, engolindo a história como mais uma lenda de botequim.

Mas, agora, à meia-noite, enquanto caminhava pelo Centro tomado pela folia, algo na atmosfera parecia errado. O samba prosseguia, mas havia um cheiro no ar que não era só de suor e cerveja – era algo mais antigo, rançoso, como carne apodrecida ao sol.

Aline sentiu um arrepio. Do alto dos Arcos da Lapa, um vulto imóvel observava a multidão. Não era um homem comum – sua silhueta era imponente, envolta em peles de onça e penas negras. O rosto, pintado de vermelho e branco, exibia marcas de guerra, e os olhos eram dois poços de escuridão.

E então o terror começou.

O chão sob os foliões tremeu, e um rugido profundo ecoou, abafando os tambores. Das pedras do centro antigo, mãos enegrecidas emergiram, agarrando tornozelos e arrastando corpos para baixo. Gritos se misturaram aos sons de trompetes e tamborins, e o sangue jorrou como serpentinas vermelhas.

Aline viu o Pajé descer dos Arcos com um passo sobre-humano. Onde ele caminhava, a terra apodrecia, e os corpos despencavam como bonecos de pano. Sua boca se abriu, entoando um cântico gutural de outro tempo, e espíritos esquecidos tomaram as ruas.

A multidão fugia, mas era tarde. O Pajé reclamava sua festa.

Desesperada, Aline correu. O velho mendigo estava lá, sorrindo tristemente.

— “Eu avisei…” — murmurou. — “O Carnaval não é para os vivos esta noite.”

E então as luzes piscaram. O Pajé ergueu os braços, e um brado de pesadelo se espalhou pela cidade. O céu se abriu em um clarão vermelho.

Depois… silêncio.

Na manhã seguinte, o centro da cidade estava vazio.. Nenhum vestígio dos foliões. Apenas máscaras quebradas, confetes sujos de sangue e um eco distante de um samba que ninguém mais lembrava.

O Carnaval terminara.

E o Pajé dormia outra vez, esperando o próximo chamado.”

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