Pejotização em xeque: o que a decisão do STF revela e por que você deve prestar atenção

O Supremo Tribunal Federal suspendeu temporariamente todos os processos que discutem a chamada pejotização, prática em que empresas contratam trabalhadores como pessoas jurídicas.

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Plenário do STF - Wikimedia Commons

1. O que é pejotização e por que ela importa?

              A pejotização é um fenômeno trabalhista que tem ganhado cada vez mais espaço nas relações de trabalho no Brasil. O termo se refere à prática de contratar trabalhadores como pessoas jurídicas (as chamadas “PJs”), em vez de assinar a tradicional carteira de trabalho, o que acaba, muitas vezes, mascarando uma relação de emprego.

              Na prática, o profissional cria uma empresa — normalmente uma microempresa individual — e emite notas fiscais pelos seus serviços. Isso, em si, não é ilegal. O problema surge quando essa forma de contratação serve apenas para disfarçar um vínculo empregatício: há subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade, mas sem os direitos da CLT.

              A pejotização afeta tanto o trabalhador, que perde direitos como férias, 13º salário, FGTS e licença-maternidade/paternidade, quanto a sociedade, que assiste à corrosão da proteção social. Ao mesmo tempo, muitas empresas veem nessa prática uma forma de flexibilizar custos e garantir mais agilidade nos negócios — criando um dilema jurídico e ético que vem sendo debatido nos tribunais há anos.

2. A decisão do STF: o que aconteceu?

              No dia 14 de abril de 2025, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão de todos os processos que tramitam no país e que discutem a licitude da contratação por meio de pessoas jurídicas em substituição à contratação formal celetista — ou seja, que discutem a pejotização.

              Essa decisão foi tomada no contexto do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.532.603, tema de repercussão geral nº 1.389, que discute se essa forma de contratação viola ou não princípios constitucionais do direito do trabalho.

              Ao suspender as ações, o STF assume a tarefa de uniformizar o entendimento sobre um tema que afeta milhares de empresas, profissionais liberais e trabalhadores em todo o país. A decisão tem efeito vinculante: todos os tribunais devem aguardar a manifestação definitiva da Corte.

3. Por que o Supremo tomou essa decisão?

            Segundo o ministro Gilmar Mendes, relator do processo, há uma diversidade de formas de organização produtiva no setor privado que exige uma análise cuidadosa e abrangente por parte do Judiciário. O objetivo é evitar decisões conflitantes nos tribunais inferiores enquanto o Supremo Tribunal Federal não estabelece, de forma definitiva, os limites constitucionais para a contratação de trabalhadores por meio de pessoa jurídica.

Na fundamentação da decisão, o ministro destacou que considerar, de forma absoluta, qualquer tipo de terceirização — incluindo a pejotização — como ilícita, pode gerar insegurança jurídica e colocar em risco a liberdade econômica assegurada pela Constituição. Por isso, entendeu ser necessário suspender os processos em curso até o julgamento de mérito pelo STF.

4. O que está em jogo?

              A discussão sobre pejotização no STF envolve, em essência, o equilíbrio entre dois direitos constitucionais fundamentais:

  • O direito social ao trabalho protegido, garantido pela CLT e por normas constitucionais que asseguram condições dignas aos trabalhadores;
  • A liberdade econômica, que permite que empresas e profissionais adotem modelos de organização mais flexíveis.

              Se o STF considerar que a pejotização, mesmo quando disfarça vínculo empregatício, é válida, poderá haver uma profunda reconfiguração do mercado de trabalho brasileiro. Por outro lado, se entender que essa prática fere a Constituição, a Justiça do Trabalho poderá coibir com mais firmeza as contratações irregulares travestidas de prestação de serviço.

5. Como isso afeta os trabalhadores?

              Para os trabalhadores, o reconhecimento ou não da pejotização como irregular afeta diretamente seus direitos. Em um contrato CLT, o trabalhador tem garantias como:

  • 13º salário;
  • Férias remuneradas e com adicional de 1/3;
  • FGTS;
  • Licenças por motivos de saúde;
  • Proteção contra demissão arbitrária;
  • Previdência social com contribuição do empregador.

              Na pejotização, esses direitos desaparecem. Em troca, o profissional passa a arcar com seus próprios encargos e tributos, além de lidar com a instabilidade de contratos comerciais que podem ser encerrados a qualquer momento.

6. E os empresários, o que devem observar?

              Do ponto de vista empresarial, a decisão do STF traz à tona a necessidade de revisar os modelos de contratação adotados. Empresas que contratam via PJ precisam avaliar:

  • Há subordinação direta?
  • O trabalhador presta serviços com habitualidade?
  • Existe exclusividade ou controle de jornada?
  • O contrato de prestação de serviço oculta um vínculo empregatício?

              Se a resposta for sim, há alto risco jurídico. Além de ações trabalhistas com possível condenação ao pagamento de verbas retroativas, a empresa pode ser fiscalizada por órgãos como o Ministério do Trabalho e Receita Federal.

7. Impactos econômicos e fiscais

              A pejotização também tem efeitos significativos na arrecadação tributária. Como os encargos são menores na contratação via PJ, há redução na contribuição ao INSS, FGTS e outros tributos que sustentam a seguridade social.

              Esse cenário preocupa o Estado, que vê a prática como uma possível evasão disfarçada de formalização. Ao mesmo tempo, muitos pequenos empresários argumentam que sem esse tipo de contrato, seria impossível manter seus negócios sustentáveis diante da alta carga tributária trabalhista.

8. O que dizem os juristas?

            A decisão do STF gerou reações distintas no meio jurídico. O Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), por exemplo, publicou uma nota pública em que manifesta repúdio à suspensão dos processos. Na visão da entidade, a medida favorece os interesses dos empregadores, desconsidera as garantias fundamentais asseguradas aos trabalhadores e esvazia a competência da Justiça do Trabalho.

              Outros juristas veem a decisão com cautela e destacam que ela não representa ainda um juízo de valor definitivo, mas apenas uma forma de garantir segurança jurídica até o julgamento final da tese de repercussão geral.

9. A insegurança jurídica e o futuro do trabalho

              Enquanto o STF não julga o mérito, empresas e trabalhadores vivem um momento de incerteza. A suspensão dos processos pode ser interpretada como uma pausa necessária para reflexão — ou como um obstáculo à defesa de direitos trabalhistas.

              De todo modo, o julgamento trará uma resposta importante sobre como o direito do trabalho brasileiro deve se adaptar à nova realidade das relações profissionais: mais dinâmicas, tecnológicas e menos hierárquicas.

10. Quais as possíveis consequências jurídicas?

              Entre os desdobramentos jurídicos possíveis após a decisão final do STF, destacam-se:

  • Consolidação de uma jurisprudência que legitime a pejotização em determinadas condições, com critérios objetivos para sua validade;
  • Reafirmação da jurisprudência trabalhista que reconhece vínculo de emprego mesmo diante da formalização como PJ;
  • Estabelecimento de diretrizes para a atuação do Ministério do Trabalho e do Judiciário em ações desse tipo;
  • Redefinição de modelos contratuais em áreas como tecnologia, saúde, educação e comunicação — setores onde a pejotização é mais comum.

11. Cidadãos e cidadãs: por que isso importa para você?

              Ainda que muitos não estejam diretamente envolvidos com contratos PJ, todos são afetados. A pejotização reduz a contribuição ao sistema de seguridade social, aumenta a informalidade disfarçada e pode gerar mais precarização.

              Para quem é ou pensa em se tornar MEI, autônomo ou prestador de serviços via PJ, é essencial saber que nem sempre a liberdade contratual se sobrepõe aos direitos sociais. A formalização pode parecer vantajosa no início, mas sem garantias legais, o custo da liberdade pode ser alto.

12. Como se proteger?

              Tanto empresas quanto trabalhadores devem adotar uma postura preventiva:

  • Empresários: revejam contratos, busquem assessoria jurídica e documentem a autonomia real do prestador de serviço;
  • Profissionais: guardem registros de atividades, e-mails, mensagens e contratos que possam comprovar subordinação ou pessoalidade, se necessário;
  • Ambos os lados: dialoguem com transparência e respeito às normas legais, construindo relações baseadas na confiança e no equilíbrio contratual.

Conclusão

              A decisão do STF de suspender os processos sobre pejotização acendeu um alerta importante sobre o rumo das relações de trabalho no país. O momento exige atenção redobrada de cidadãos e empresários, não só para evitar litígios, mas para compreender o que está em jogo: o equilíbrio entre liberdade econômica e justiça social.

              A decisão definitiva ainda virá — e o impacto será grande, independentemente do resultado. Por isso, é hora de se informar, se preparar e participar desse debate que afeta diretamente o presente e o futuro do trabalho no Brasil.

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