A fome voltou a ser uma realidade gritante no Brasil e no Rio de Janeiro. O DIÁRIO DO RIO, recentemente, publicou uma série de matérias sobre o problema. Uma das soluções para atenuar a grave questão nas grandes cidades são os restaurantes populares. Os estabelecimentos que servem comida feita com base em estudos de nutrição e de preço baixo são muito utilizados pelo mundo. Aqui, no Rio, o serviço que já foi bem maior encontra-se com grandes dificuldades para operar em meio a um cardápio de promessas.
Até o ano de 2016, no município do Rio de Janeiro havia 8 restaurantes populares em funcionamento. Contudo, o Governo do Estado parou de pagar os fornecedores, o que provocou o fechamento de unidades. No ano seguinte, com o início do processo de municipalização dos restaurantes, a Prefeitura garantiu o funcionamento dos de Bangu, Bonsucesso e Campo Grande – os três que estão abertos atualmente. Os restaurantes da Central do Brasil, Cidade de Deus, Irajá, Madureira e Méier continuam fechados.
Em 2018, a Prefeitura do Rio anunciou a abertura de uma licitação para a reforma da unidade de Madureira, mas o processo não foi concluído. O orçamento de 2021, aprovado na Câmara no final do ano passado, destina R$ 4,2 milhões para a reforma da unidade, porém, até o momento nenhum valor foi empenhado para dar início da obra.
Além disso, em janeiro desse ano, por meio de um decreto, o prefeito Eduardo Paes (PSD) cortou R$ 2,2 milhões dos recursos que estavam aprovados no orçamento para a manutenção dos 3 restaurantes que estão em funcionamento. Isso significa que 495.668 refeições deixarão de ser servidas em todo o ano de 2021.
O Restaurante Popular de Campo Grande, um dos únicos três que continuam em funcionamento na capital fluminense, não abre mais nos fins de semana, nem mesmo para servir o café da manhã. E as 4 mil refeições diárias foram reduzidas para apenas 1.5 mil, mesmo diante do agravamento da fome e do desemprego no município.
Além da redução no número de refeições, os vereadores Dr. Marcos Paulo, William Siri e a deputada estadual Renata Souza, todos do PSOL, se depararam com problemas estruturais. Banheiros alagados, sem portas nos reservados e falta de papel higiênico. E valas com esgoto correndo dentro da cozinha. Segundo os próprios funcionários, a unidade precisaria de ampliação no quadro de colaboradores para oferecer um serviço de mais qualidade, inclusive com mais atenção aos banheiros.
“Eu sempre comi no restaurante de Campo Grande. As coisas já foram bem melhores lá. Está tudo largado”, conta o ambulante Paulo Costa, morador da região.
Outro dos três únicos restaurantes populares que ainda funcionam na cidade do Rio de Janeiro, o de Bonsucesso, por sua vez, está com muita sujeira, goteiras e infiltrações expostas. A cozinha sofre com a proximidade de caixas de esgoto entupidas.
Na entrada do restaurante não há medição de temperatura, nem qualquer controle quanto à imunização dos frequentadores. Por conta disso, muitos ambulantes que trabalham na área externa do restaurante deixaram de frequentar a unidade. E ao contrário do que anuncia o site Carioca Digital, o restaurante não está servindo o jantar.
As pessoas que procuram o restaurante popular de Bonsucesso para almoçar, pagando R$ 2 por um prato de comida, reclamam que a qualidade das refeições já foi muito melhor. Além disso, quem frequenta o local não tem acesso a sabonete ou papel toalha, nem nas únicas duas pias da área comum e nem nos banheiros, todos bastante sujos e sem tábuas nos vasos sanitários. Os banheiros também não tinham portas nos reservados e nem puxadores para as válvulas de descargas.
“A prefeitura cortou R$ 2,2 milhões do orçamento destinado aos três restaurantes populares que sobraram na cidade, o equivalente a menos 495 mil refeições. Em vez de promover cortes a prefeitura tem que reformar os restaurantes que ainda estão de pé e investir forte para reabrir os outros cinco que estão fechados. Diante da crise de fome e insegurança alimentar que estamos vivendo é urgente que a prefeitura destine investimentos para essa área”, ressalta o presidente da Frente contra a Fome, vereador Dr. Marcos Paulo.
Uma força-tarefa montada pelo Governo do Estado e pela Prefeitura do Rio vistoriaram o Restaurante Popular de Bonsucesso. De acordo com os poderes executivos, a unidade passará por reformas.
Na última quarta-feira, 10/11, o Restaurante Popular do Betinho, localizado na Central do Brasil, completaria 21 anos, mas está de portas fechadas desde 2016. A Frente Parlamentar contra a Fome da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro promoveu um ato público pela reabertura dos cinco restaurantes populares que ainda estão desativados na cidade. A mobilização aconteceu com o apoio da Ação da Cidadania.
O presidente da Ação da Cidadania Daniel Souza, filho de Hebert de Souza, o Betinho, sociólogo que foi o idealizador do projeto de combate à fome e quem dá nome ao restaurante popular da Central, esteve no ato e falou sobre a importância da reabertura das unidades.
“A ação de hoje foi feita em caráter emergencial para atender aqueles que estão passando fome neste momento, mas sabemos que a reabertura deste e dos outros restaurantes é fundamental, especialmente durante o agravamento da miséria e da insegurança alimentar”, disse Daniel.
Uma das principais defensoras da pauta dos restaurantes populares no Rio de Janeiro, a deputada federal Clarissa Garotinho (PROS) destinou R$ 5 milhões em emendas parlamentares para a unidade de Madureira voltar a funcionar. O dinheiro ainda espera para ser utilizado.
Durante a gestão de Clarissa à frente da Secretaria de Trabalho e Renda de Marcelo Crivella (Republicanos), em 2018, o projeto inicial foi lançado. Os três restaurantes populares que funcionam hoje em dia na cidade do Rio de Janeiro foram reabertos neste período.
“Quando fui secretária de Desenvolvimento, Emprego e Inovação da cidade do Rio, reabri três restaurantes populares (Bangu, Campo Grande e Bonsucesso) e deixei reservados R$ 5 milhões para a reabertura do restaurante de Madureira, que, até agora, não foi posto em funcionamento. É triste ver em situação precária um programa tão importante para a população, sobretudo num momento como este, em que as pessoas estão passando fome por causa dos efeitos econômicos da pandemia. E o que é pior: houve uma redução de investimentos este ano no programa, por parte da Prefeitura do Rio. Uma lástima constatar que as pessoas continuam não sendo a prioridade das gestões municipais, nem por aqueles que prometeram cuidar delas, nem por aqueles que vieram depois e prometeram tirar o Rio do buraco onde se meteu”, afirma Clarissa.
Em nota, a Prefeitura do Rio disse que o prédio que serviria como sede do restaurante popular de Madureira pertence ao governo do Estado do Rio de Janeiro.
“Para isso, foram captados recursos federais, no montante de R $4,2 milhões, por meio da Caixa Econômica, condicionados à cessão do espaço para a Prefeitura do Rio, pelo prazo de 20 anos. O governo estadual quis realizar a cessão pelo período de quatro anos, o que foi recusado pelo banco federal. Neste sentido, esclarecemos que esses recursos não foram liberados para a Prefeitura. É importante lembrar que se trata de recurso com destinação específica (carimbado) para obra de recuperação daquele imóvel em Madureira, que pertence ao governo do Estado. Informamos ainda que o orçamento previsto na gestão anterior, e que está em execução, levou em conta a baixa demanda no período da pandemia. Em 2020 o consumo foi 24,31% menor que em 2019. Em 2021 a procura caiu ainda mais. De janeiro a agosto foram servidas 649.410 refeições, 22,35% a menos que no mesmo período de 2020. Reforçamos que o total do orçamento disponível para os restaurantes em 2021 será suficiente para custear toda a despesa, mesmo que a demanda volte aos patamares de 2019, ano de maior consumo na série histórica dos Restaurantes Populares”, informa a nota.
Há um mês, o Governo do Rio informou que, até dezembro de 2022, a cidade do Rio de Janeiro terá dez de um total de 26 restaurantes que serão criados ou reconstruídos no estado. A promessa foi feita pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos (SEDSODH) durante debate público promovido pela Frente Parlamentar contra a Fome da Câmara de Vereadores do Rio.
De acordo com o Governo do Estado, além da reabertura dos cinco restaurantes fechados na cidade do RJ (Irajá, Méier, Madureira, Central e Cidade de Deus), outras cinco unidades serão criadas: Rocinha, Complexo da Maré, Complexo do Alemão, Manguinhos (Jacarezinho) e Santa Cruz.