O PFL já foi um dos maiores partidos do Brasil, comandava estados, capitais e o Congresso. Chegou a eleger a maior bancada da história da Câmara dos Deputados. Havia desde um exilado político, Cesar Maia, até um dos maiores defensores dos governos militares, Antônio Carlos Magalhães. Bornhausen mandava e desmandava no país, ACM era visto como o criador de Reis, Maia e Roseana Sarney chegaram a ser presidenciáveis.
Nessas mudanças da vida, o partido foi perdendo poder. Quando José Serra se candidatou pelo PSDB, o PFL não apoiou. Encolheu e ficou fora do poder desde a eleição de Lula, até o impeachment de Dilma. Neste meio tempo fez uma mudança ridícula de nome, para Democratas, e assim lembrar o partido americano, e uma árvore que parecia dos Conservadores da Inglaterra. Uma farofa que só é possível no Brasil, mas era para tirar a memória que seria oriundo da Arena, que sustentou os governos militares. Não funcionou, e a Frente Liberal foi a principal responsável pela eleição de Tancredo Neves.
Quando foi criado, o Democratas queria renovar a política, colocaram Rodrigo Maia como presidente do partido. Mas Lula queria sua destruição e fomentou a criação do PSD, que levou a maioria dos fisiologistas, incluindo Kassab, que dizia que seu novo partido não era de direita, nem de esquerda e nem de Centro. Na época o STF decidiu que o fundo partidário pertencia, proporcionalmente a cada deputado federal eleito. Um absurdo jurídico? Sim. Atrasou a política brasileira em mais de uma década? Óbvio.
O rio até parece imóvel, mas a água que corre nele nunca é a mesma – nem as pessoas. Saiu Maia da presidência do partido, entra seu primo, José Agripino, senador pelo Rio Grande do Norte, político experiente, daqueles que o nome DEM queria erroneamente se esquecer. Na mão de Agripino o partido volta a defender o liberalismo, vira a maior força de oposição ao governo PT. Mas quis o destino que na véspera de sua reeleição para a presidência do partido, aparecesse uma denúncia, infundada, que ele teria recebido propina em uma secretaria do governo do RN, do qual seu grupo era oposição. Quis o destino, também, que eu estivesse em seu gabinete, prestando consultoria em marketing político, quando entram na sala Rodrigo Maia, então presidente da Câmara, ACM Neto, prefeito de Salvador e Mendonça Filho, Ministro da Educação. Sabíamos que sairia dali o próximo presidente do DEM, em uma época que o partido colhia os louros de ter sido a cara da oposição ao PT e começando a se recuperar e voltar a ser o antigo PFL. Apostávamos em Mendoncinha. Perdemos.
Na convenção foi eleito ACM Neto, nunca entendi muito bem a razão. Ele era prefeito de uma capital, sem tempo de cuidar de um partido. Sempre foi um político mimado e sem visão, enxerga dois anos, o da próxima eleição e não vai além disso. Era um dos maiores entusiastas de uma fusão com o PTB, aquele clássico caso de perde/perde. Não saiu por causa da ala da direita do partido que segurou. Hoje o PTB está mais a direita que Bolsonaro, coisas da farofa ideológica brasileira e da sanha de Roberto Jefferson em estar no poder.
Mas no comando de Neto o partido continuava seguindo as águas do rio de Agripino. Rodrigo Maia foi reeleito presidente da Câmara, quase foi candidato a Presidente da República, mas no meio do caminho tinha um capitão da reserva, o inesperado, um sobrenatural de Almeida, Jair Messias Bolsonaro. E isso atrapalhou qualquer análise: como antever que um dos políticos mais toscos, broncos e oligofrênicos que o país já viu, e a concorrência é forte, ia ser um incrível puxador de votos? Impossível. O DEM começa a terminar ali e quem era de extrema direita tinha um lugar onde podia gritar suas besteiras. Outros foram enganados pela música liberal que Jair tocou, mas era só para esconder o barulho de seus flatos corporativistas. No partido havia quem quisesse até apoiar Ciro Gomes para presidente, teria sido melhor.
Quando Bolsonaro estava em seu começo de governo, Rodrigo foi novamente reeleito para presidente da Câmara. E, realmente, tentou trabalhar nas agendas liberais de Guedes, mas os erros políticos do grupo Bolsonaro eram tantos, e os ataques a qualquer coisa que não agradasse ao clã vinham de tal forma, que ele foi caminhando para oposição, apesar de nunca ter aceitado um processo de impeachment. No Senado, um Senador que era de baixo clero, David Alcolumbre, se torna presidente da Casa Alta. Os demistas vão ao delírio.
No meio do caminho a maior pandemia desde o fim dos anos 1910, o mundo inteiro puxa o freio de mão, o presidente joga contra e ninguém sabe muito bem o que fazer. E Rodrigo, 3 vezes eleito presidente da Câmara, e Alcolumbre queriam ser reeleitos, uma iniciativa inconstitucional. A reeleição só é possível quando se muda a legislatura, não no meio do mandato.
E foi esse o início do fim do DEM, os príncipes do PFL ACM Neto e Rodrigo Maia entram em uma briga pública por causa do apoio dos aliados de Neto a candidatura de Lira, do PP, e não a Baleia Rossi, do MDB, apoiado por Maia. Se de um lado a culpa é de Maia por não ter preparado seu sucessor, Neto talaricou. Foi ele que decidiu pelo nome de Rossi, para não atrapalhar a candidatura de Rodrigo Pacheco a Presidente do Senado. Até hoje o presidente do DEM diz que ele não poderia controlar o voto dos deputados, mas a dissidência começou entre os baianos, onde ele controla a bancada.
Pacheco é eleito, Lira é eleito, Maia fica furioso, e nada ajudou o fato de um dos maiores aliados de Neto, João Roma, se tornasse Ministro da Cidadania de Bolsonaro. O então Prefeito de Salvador dizia que não tinha se envolvido no caso – claro que tinha. Mas agora pode sofrer o castigo de ser traído e João Roma pode ser candidato contra Neto ao Governo da Bahia.
Com a briga entre duas de suas principais lideranças e o encolhimento de algumas como Mendonça, Ronaldo Caiado e os Maias do Rio Grande Norte, não restou outra saída, o partido começou a perder força. E a temer que em 2022 não elegesse nomes suficientes, já que mesmo se assumindo como Centro, o leitor os lê como direita. E na direita há Bolsonaro, que ganhando ou perdendo para presidente, vai eleger muitos deputados.
Já com Rodrigo Maia fora da jogada, foi expulso do partido e está no colo de João Doria. O DEM foi caminhando demais para a direita e, não assumindo isso, procurou o amorfo PSL, que elegeu Bolsonaro, fez a maior bancada da Câmara e tem direito a um belo naco do fundo partidário e do tempo de TV. Mas sabem que sem o capitão, e mesmo com todo dinheiro, não elegem 1/5 de 2018.
A fusão mudará o nome dos partidos e os números. O PFL desaparecerá e entrará para a história. Será um melancólico fim, causado pela briga de dois políticos mimados que só pensaram em si próprios nos momentos cruciais para o país. O Brasil perde muito, neste momento de um ou outro, o DEM poderia ser o peso na Centro-direita, não será. Não será mais nada.