Roberto Anderson: Meio ambiente, quem se mobiliza?

'Justiça social é inalcançável sem atenção ao meio ambiente e ao controle do clima. É hora de acordar'

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Foto: Roberto Anderson

Sábado, 6 de novembro de 2021, dia de Ação Global pela Justiça Climática. Debaixo da chuva fria, milhares de pessoas vibrantes, a maioria de jovens, marcham em Glasgow, onde se desenrola a COP26. O mesmo acontece em centenas de outras cidades do mundo. É noticiado que também no Brasil, em cidades como Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Fortaleza teriam ocorrido manifestações. Alguém viu?

Eleições recentes em nações europeias mostram o crescimento dos partidos ambientalistas. Eles parecem mobilizar as melhores esperanças da juventude daqueles países. Na Alemanha a representante dos verdes chegou a estar à frente nas pesquisas. De qualquer maneira, o futuro gabinete alemão deverá contar com uma importante participação dos verdes.

Mas no Brasil o movimento político ambientalista não consegue avançar muito. Os dois partidos mais ligados às questões ambientais lutam para superar as cláusulas de desempenho. A maior parte da juventude, quando se mobiliza, deposita suas esperanças de mudanças nos partidos de esquerda. Estes, apesar de assumirem algumas bandeiras ambientais, nem sempre compreendem muito bem a falência do desenvolvimentismo a qualquer custo, do século XX. 

No passado, a natureza brasileira serviu de material simbólico para a construção de uma nacionalidade romantizada. Do indianismo no segundo Império, passando pelos abacaxis e palmeiras de Carmen Miranda, ao tropicalismo, a natureza brasileira foi um forte componente da construção da identidade e da cultura nacional. Enquanto isso, os verdadeiros indígenas eram sistematicamente assassinados e a natureza real destruída. Hoje ela parece mais importante para quem vive no exterior do que para nós mesmos.

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É preciso se perguntar por que razão, no país da maior diversidade ambiental, no país onde a destruição do meio ambiente é um fato presente, avassalador e criminoso, não há mobilização a contento por tais questões. Até já houve, mas não mais. O sacrifício de Chico Mendes, de Paulino Guajajara, e de tantos outros que lutaram pela preservação das florestas foi imenso. Muitos que ousaram lutar pagaram com a própria vida.

É verdade que mobilização tem sido artigo em falta no Brasil atual. Muita energia se dissipa nas redes sociais, mas não parece conseguir chegar às ruas. E motivos não faltam. Mais de 610 mil mortes, em grande parte evitáveis, conluio descarado entre parlamentares fisiológicos para inviabilizar o país, destruição de mecanismos de controle social do governo, retrocesso em questões comportamentais, desemprego, aumento da pobreza, a volta da fome, etc., etc.

Num país com tantos problemas sociais, talvez seja compreensível a primazia das questões sociais na mobilização dos que se dispõem a tentar mudar algo. Por isso, é fundamental que se alie a questão ambiental às questões sociais. Se partidos de esquerda souberam se apropriar de algumas bandeiras ambientais, o caminho inverso também deve ser trilhado. Partidos e movimentos ambientalistas precisam falar a língua da justiça ambiental, da percepção de que as questões ambientais atingem a todos, mas atingem mais fortemente àqueles socialmente mais vulneráveis.

É preciso renovação, caras novas, falando para os jovens, com credibilidade. É preciso quem se disponha a estar nas ruas com cartazes mambembes, dialogando com Greta Thunberg, Txai Suruí, Adenike Oladosu e Vanessa Nakate, porque o ambientalismo é internacionalista. A crise climática é real, bate às nossas portas, inunda bairros, provoca deslizamentos em encostas habitadas, produz incêndios intermináveis, destruidores, e sufoca com tempestades de poeira. Justiça social é inalcançável sem atenção ao meio ambiente e ao controle do clima. É hora de acordar.    

Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.

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Roberto Anderson é professor da PUC-Rio, tendo também ministrado aulas na UFRJ e na Universidade Santa Úrsula. Formou-se em arquitetura e urbanismo pela UFRJ, onde também se doutorou em urbanismo. Trabalhou no setor público boa parte de sua carreira. Atuou na Fundrem, na Secretaria de Estado de Planejamento, na Subprefeitura do Centro, no PDBG, e no Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Inepac, onde chegou à sua direção-geral.
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