Roberto Anderson: O pequeno ipê roxo de Laranjeiras

Numa calçada da rua das Laranjeiras, ali quase em frente à rua Alice, havia uma muda de ipê roxo

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Foto: Roberto Anderson

Numa calçada da rua das Laranjeiras, ali quase em frente à rua Alice, havia uma muda de ipê roxo. Não era muito crescida, uns dois metros talvez. Não sei dizer quem plantou, mas isso não importa para nossa história. 

Estava plantada num canteiro defronte a uma loja, cujo proprietário se preparava para abrir um novo negócio. Por alguma razão, ele achou por bem dar um trato nesse canteiro, plantando espécies que ele julgava ornamentais, mas suprimindo o pobre do pequeno ipê. 

Sua ação foi filmada, ele sacudindo a muda, puxando para deslocar as raízes, que teimavam em se agarrar ao solo onde já tinham feito a sua morada. Transeuntes questionaram sua atitude, mas ele nada, seguiu em frente e sumiu com a nossa mudinha.

Talvez ele não soubesse que isso é um crime ambiental. Ou talvez, não se importasse. O fato foi denunciado. A Prefeitura foi ao local, plantou novo ipê e emitiu uma multa. E o dono da loja foi cancelado nas redes sociais, castigo dos mais temidos atualmente. Resta saber se aprendeu a lição. 

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Árvores e mudas nas calçadas e praças são vítimas constantes de vandalismo. Como essa de Laranjeiras, centenas de outras são arrancadas, partidas, derrubadas pelo infame prazer de destruir. Muitas outras são envenenadas por obstruírem a vista de algum morador, ou por abrigarem morcegos e pássaros. E não podemos nos esquecer de que a própria Prefeitura realiza algumas podas muito questionáveis, deformando árvores ou cortando-as radicalmente. A empresa concessionária de energia é outra destruidora de árvores que impactam sua fiação, fiação essa que deveria ser subterrânea. Por sua ação, as árvores debaixo dos fios ficam abertas em taça ou pendendo para um único lado. 

Algo que talvez explique em parte essa relação abusiva de alguns moradores com as árvores urbanas é o fato de que os proprietários dos imóveis são responsáveis pela manutenção das calçadas defronte a seus imóveis. A Prefeitura se responsabiliza pela manutenção das pistas dos automóveis, mas não pelas calçadas dos pedestres! É um contrassenso que vai contra o movimento mundial de valorização dos espaços dos pedestres e da facilitação do hábito de caminhar, com redução dos espaços destinados aos automóveis. Na situação atual, é como se somente os automóveis fossem importantes para o poder público.

Em geral, é a Prefeitura quem planta as mudas de árvores nas calçadas. Mas é o morador quem deve arcar com o conserto da pavimentação. E ele o faz como pode, ou como acredita ser satisfatório, estando os controles da municipalidade um pouco frouxos. Aí, ele se acha dono da calçada, podendo expulsar moradores de rua, gerenciar o que é plantado defronte, tapar os espaços destinados a futuras árvores, ou cimentá-las até o tronco.

O pequeno ipê de Laranjeiras foi substituído. A pronta reação dos vizinhos foi fundamental para que esse fato não passasse em branco. Agora nos resta torcer para que a nova muda, ainda frágil, encontre o caminho do sol, cresça e floresça. Laranjeiras agradece.  

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Roberto Anderson é professor da PUC-Rio, tendo também ministrado aulas na UFRJ e na Universidade Santa Úrsula. Formou-se em arquitetura e urbanismo pela UFRJ, onde também se doutorou em urbanismo. Trabalhou no setor público boa parte de sua carreira. Atuou na Fundrem, na Secretaria de Estado de Planejamento, na Subprefeitura do Centro, no PDBG, e no Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Inepac, onde chegou à sua direção-geral.
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