O Carnaval, tradicionalmente conhecido como um espaço de liberdade e transgressão, volta a ser palco de discussões sobre os limites da folia. Em 2017, o movimento “Não é Não!”, criado por mulheres para combater casos de assédio e abuso sexual durante a festa, marcou história ao reforçar a importância do respeito e do consentimento. Agora, em 2025, um novo episódio reacendeu o debate, mas sob um ângulo diferente: o flagrante de um casal transando em um camarote trouxe à tona questões sobre a normalização da superexposição e os comportamentos extremos — mesmo quando consentidos.
A cena, registrada e viralizada nas redes sociais, vai além da discussão legal sobre atos obscenos em público, que são crime segundo o artigo 233 do Código Penal Brasileiro, com pena de detenção de três meses a um ano ou multa. O episódio expõe um fenômeno social mais amplo: a compulsão pela exposição e a obsessão pelo flagrante em uma era dominada pela busca de likes e engajamento.
Para o psicólogo Adriano Lourenço, professor da Universidade Iguaçu (Unig), o Carnaval, por si só, já é um ambiente que reduz inibições e flexibiliza comportamentos. No entanto, ele ressalta que isso não significa que tudo seja permitido. “A sociedade está imersa em um modelo de exposição, em que dar notícias de si e do outro virou uma moeda social valiosa. A atitude de filmar e compartilhar está diretamente ligada à percepção de que tudo pode — e deve — ser publicizado”, explica.
Lourenço alerta, porém, para os efeitos imprevisíveis da superexposição. “Algumas pessoas lidam bem com a viralização, mas outras podem enfrentar danos emocionais, profissionais e sociais. Quem se coloca nessa posição precisa entender que, uma vez na internet, não há controle sobre o que acontece depois”, afirma.
O caso também levanta questões sobre os acordos tácitos de convivência. A atmosfera do Carnaval, muitas vezes intensificada pelo álcool e pela sensação de anonimato na multidão, não pode ser usada como justificativa para ignorar normas sociais. “O Carnaval simboliza liberdade, mas essa liberdade precisa ser exercida com responsabilidade. Os movimentos contra abusos na folia mostram que os limites sociais estão sempre sendo renegociados para garantir o respeito coletivo”, observa o psicólogo.
Ele reforça ainda que a falta de limites de uns não pode se tornar o constrangimento de outros. “Um camarote de festa não é um ambiente isolado. Esse tipo de conduta pode causar desconforto a terceiros, além de ter implicações legais”, completa.
Enquanto o Carnaval segue como um espaço de celebração e diversão, o episódio do camarote serve como um alerta sobre os desafios de equilibrar liberdade, responsabilidade e os impactos da era digital. A pergunta que fica é: até que ponto a busca por visibilidade e a normalização da superexposição estão moldando comportamentos que ultrapassam os limites do respeito coletivo?