William Bittar: Breve tributo ao Bar do Oswaldo

William Bittar conta a história do Bar do Oswaldo, fundado em 1946, como começou a fama de suas batidas, a libertação sexual e o incêndio em 2022

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O Bar do Oswaldo foi fundado por Oswaldo Cardozo, em 1946, no final da Estrada do Joá, numa Barra da Tijuca praticamente desabitada, conforme depoimento de seu filho Rommel Cardozo ao Jornal da Barra, em 2017.

O bar está localizado junto à Praça Desembargador Araújo Jorge, tradicionalmente conhecida como Largo da Barra, denominação atualizada para Barrinha. A antiga edificação, muito alterada em suas sete décadas, originalmente apresentava uma fachada neocolonial, com seu frontão curvilíneo que poucos conseguem lembrar. No entanto, é seu uso que merece destaque e atenção, talvez até proteção como patrimônio imaterial.

Naquele modesto botequim, o proprietário criou uma bebida, o “coquinho”, que consistia em misturar água de coco, cachaça de boa qualidade, canela, curtido dentro do próprio coco por uma semana. Em pouco tempo, a aromática bebida fez sucesso entre os homens, porque, naquela época, mulheres não deveriam consumir cachaça e derivados, pois era inadequado para o então “sexo frágil”. Ficavam com os poucos sucos disponíveis, enquanto os acompanhantes se fartavam daquela batida de coco ou de limão, também muito forte.

Para atender ao público feminino, Oswaldo criou outra bebida, composta de vodca, polpa do coco e açúcar, aparentemente mais “leve”, aliás leve demais para os machos de plantão. Encorpando a mistura para atender à turba, foi acrescentado limão. Surgia a “Branquinha de Neve”, premiada num festival de batidas, iniciando a fama do Bar.

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A década de 1960 atraiu um público motorizado para as praias desertas da Barra da Tijuca, cujos acessos principais eram pelo Alto da Boa Vista ou a Estrada do Joá, endereço do Bar, localizado em seu final, no antigo Largo da Barra.

Com a implantação do Plano Piloto de Lucio Costa, o adensamento populacional da região, o aumento significativo de automóveis, a facilitação dos acessos rodoviários, o Bar do Oswaldo chegou ao seu apogeu, tornando-se quase uma parada obrigatória para casais antes da corrida de submarino nas praias ainda escuras e pouco frequentadas ou a caminho dos muitos motéis construídos na vizinhança. Os ventos da revolução sexual, ainda que tratados hipocritamente pela sociedade conservadora, chegavam com a pílula e preservativos,

Ao final da década de 1970, Oswaldo foi homenageado por um fabricante de bebidas, denominado “O Rei das Batidas”, título que vinha consolidar sua justa fama.

São muitos os depoimentos de antigos usuários. Provavelmente, as gerações que ultrapassam os quarenta anos nas primeiras décadas do século XXI tem muitas histórias, algumas impublicáveis, para rememorar: casais tímidos; senhoras comportadas, enfim, toda uma galeria de personagens das décadas finais do século XX que, muitas vezes, foram estimulados por aquelas batidas saborosas, em doses ou garrafas para viagem, e mudaram o rumo de suas vidas ou conquistas. Casamentos realizados, outros desfeitos, flagrantes, despedidas, reencontros, episódios diante daquelas mesas, garçons, petiscos e batidas.

Há algum tempo o estabelecimento oferece bem mais do que o cardápio do século passado, além de eventos e shows com música ao vivo, mas na madrugada do dia 23 de abril de 2022, muitos antigos frequentadores acordaram com a notícia que um severo incêndio atingiu aquele Bar. Mesmo que “muita coisa da história do bar tenha se perdido como o fogo”, conforme declarou Rommel ao portal G1, o Oswaldo insiste em permanecer na memória de todos que o frequentaram e na imaginação de quem ouviu seus casos, aguardando a breve reconstrução deste patrimônio da Cidade do Rio de Janeiro

Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.

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Carioca, arquiteto graduado pela FAU-UFRJ, professor, incluindo a FAU-UFRJ, no Departamento de História e Teoria. Autor de pesquisas e projetos de restauração e revitalização do patrimônio cultural. . Consultor, palestrante, coautor de vários livros, além de diversos artigos e entrevistas em periódicos e participação regular em congressos e seminários sobre Patrimônio Cultural e Arquitetura no Brasil.
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2 COMENTÁRIOS

  1. Oi boa tarde!
    Aí Mestre como sugerido 😉
    Quem nunca né?
    Quem aqui dessas bandas do Rio nunca se perdeu pelos lados do Oswaldo?
    No Oswaldo íamos adolescentes, calças jeans boca sino ou cigarrete, tamancos Dr. Schöll e bustiê
    Íamos cabelos ao vento, cachos por secar, antes ou depois da praia, quando Pepê ainda estava por lá… (saudade)
    Íamos sedentos do doce de côco líquido servido gelado em copos americanos
    Íamos em grupos, sim, porque não?
    Íamos saias longas depois das formaturas, meninos com os paletós em nossos ombros e sandália nas mãos
    Íamos mini saia antes das baladas noturnas, íamos vestidos de saco de farinha em nossas versões hippies mas nem tanto …
    Íamos buscar garrafas coloridas pêssego, manga, jabuticaba … frutas engarrafadas para as matinês e hi-fi
    Quem nunca?
    Quem apaixonado nunca parou no Oswaldo?
    Casais em pré namoro, ficantes, amantes ou noivos?
    Casais já casados também, ué! Por que não beber uma doce delícia antes durante ou depois?
    Beijos doces de morangos, abraços quentes de amendoim … ah no Oswaldo tem também … a prévia do PlayBoy passava por lá … quem nunca né?
    Íamos em duplas de moto ou em karmann ghia, Opalas e fuscas
    Ah! Em fuscas íamos muito … e muitos … como cabíamos tantos em um único fusca? … Mistérios do Oswaldo ….
    Íamos em família aos domingos, irmãos tios e primos depois do almoço da vó.
    Íamos com o vô que lembrava de casos que o próprio Oswaldo já esquecera
    Íamos com a vó que relembrando bons tempos jurava ter namorado o próprio … ah Oswaldo … quem nunca né?
    Íamos em Scorts e Del Reys, íamos mais recentemente também
    Íamos até de bike, que naqueles tempos chamávamos de bicicletas…
    Alguns, moradores daquelas bandas do Joá, Barrinha ou da Ilha iam a pé também, por que não?
    Ah! O Joá o que aconteceu com as festas do Joá? Batidas do Oswaldo eram cardápio certo por lá… Eram tantas hoje nem ouço falar …
    Íamos pelo Alto … íamos pelo Joá … íamos pela estrada da Gávea… passando pela construção do hotel e pelos primórdios de uma Rocinha ainda tímida escondida entre as árvores.
    Íamos no Oswaldo. Não havia festa em casa, casamento, formatura, aniversário sem pelo menos uma garrafa da batida do Oswaldo … lá em casa tinha até briga para escolher quem seria o encarregado de buscar tão importante iguaria …
    Íamos no Oswaldo namorar, passear, ficar, fazer hora … paquerar também íamos … ah como íamos …
    Faz tempo não passo por lá … última vez levei minha mãe .. ainda forte contando casos dos seus namoros em uma Barra que já não existe mais …
    Hoje soube do seu incêndio, fico pensando na varanda em arcos e na pintura meio verde dos anos 1990… será que restaram?
    Meu querido mestre Bittar escreveu ainda pouco que o “Bar do Oswaldo pode ser patrimônio imaterial da cidade”… pode … deve …
    Mas meu mestre, aqui para nós, tem coisa mais material do que as lembranças que levaremos para sempre do Oswaldo?
    Afinal … quem nunca né?

  2. Gente, é triste ver parte do passado glorioso da cidade, parte da história de vida de muita gente (inclusive da minha) ser consumido pelas chamas como foi o Bar do Oswaldo. Tristeza semelhante senti quando vi as chamas consumindo o Museu da Quinta (guardadas as devidas proporções).

    E, dessa forma, vamos ficando sem história, sem memória, vendo nossa identidade se apagando aos poucos, nossos registros, nossa alma carioca está morrendo!

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