Jackson Vasconcelos: Ministro! O nome dele é Alexandre Ramagem

Colunista do DIÁRIO DO RIO fala sobre uma audiência acalorada sobre operações em comunidades

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Imagem apenas ilustrativa | Foto: Rafa Pereira - Diário do Rio

A Maré não está para peixe. No dia 28, o Senador e Ministro da Justiça, Flávio Dino, governador do Maranhão durante oito anos, compareceu à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, para uma audiência acalorada, como são as audiências entre Ministros e oposição. Os representantes do governo bajulam e os da oposição batem duro. Como o decoro parlamentar é do tempo das cavernas, as agressões são deselegantes, como se viu quando os ministros do Presidente Bolsonaro compareceram lá.

O deputado Ramagem, da oposição, destacou-se pela elegância sem perder a verve. Ele agradeceu a presença do ministro, e o arguiu com um preâmbulo necessário, que passou pelo tempo das Unidades de Polícia Pacificadora, UPPs e pelo aparato policial utilizado pelo governo da época para entrar no Complexo da Maré, um conjunto de 16 favelas. O deputado Ramagem questionou: “Se a sua visita, Ministro, teve um objetivo pacificador, vamos crer, na ordem, no amparo da lei, o senhor conseguiu a extinção do tráfico ali? Quando será? O senhor conseguiu tratar do cumprimento de centenas de mandados de prisão judiciais em aberto na localidade? Lá se concentra o maior poderio bélico ilegal nas mãos dos criminosos. O senhor conseguiu a entrega pacífica desses armamentos?”

O Ministro saiu pela tangente, debochado e deselegante: “Eu vi um deputado. Acho que esse senhor aqui…Amagem…Ramagem”, enquanto atrás dele o ex-deputado Wadih Damous tentava ajudar, mas o Ministro continuou: “Amagem”, olhou para o lado e foi corrigido pelo Presidente da Comissão…”Ramagem…” e completou…”Eu não entendi se o senhor está perguntando ou afirmando. Eu posso afirmar ao senhor que eu fui convidado por algumas entidades…” e seguiu em frente sem responder, passando a ideia de que essa história de tráfico, armamentos ilegais e coisas tais é papo de preconceito.

A gente sabe que não é.

As comunidades no Rio de Janeiro têm leis próprias impostas por criminosos, porque eles possuem armas e as polícias e a Justiça já estão vencidas por antecipação. É uma situação grave a ponto de ter desmoralizado as UPPs, as Forças Armadas e todos os governos do estado e federal. A ponto também de deixarem fora da gestão do Prefeito do Rio, uma parte considerável do território carioca.

A situação só não é pior, porque a “banda boa” das comunidades está em maioria e por si mesma tem se virado como pode. Há trabalhadores, há empreendedores, uma economia pujante…existe gente do bem sacrificada pela presença do crime armado. O nível de organização das pessoas de bem produz dados sobre a vida nas comunidades. No Complexo da Maré existe a “Redes da Maré”, que publica, periodicamente, um boletim sobre segurança pública. Ele está na sétima edição: “Direito à Segurança Pública na Maré 2022”. Eis alguns dados (2022): Vamos lá:

  1. 27 operações policiais ocorreram nas 17 favelas. 
  2. 08 confrontos entre grupos armados.
  3. 39 mortes causadas por armas de fogo
  4. 283 violações de direitos
  5. 15 dias de atividades suspensas nas escolas
  6. 19 dias sem atividades de saúde.
  7. Das 27 mortes em operações policiais ocorridas nas 16 favelas da Maré, 24 tiveram indícios de execução e em nenhuma delas foi identificada perícia dentro dos parâmetros normativos.
  8. O ano de 2022 apresentou o maior número de mortes em operações policiais dos últimos três anos, com aumento de 145% em comparação ao ano anterior.

O Boletim tem 24 páginas de informações e dados e acredite-se ou não nos números, a situação identificada pela própria comunidade mostra que o deputado Alexandre Ramagem sabe o que diz quando se refere ao Complexo da Maré, enquanto o Ministro da Justiça tenta passar a imagem de que nada, rigorosamente nada, nas informações do Boletim é verdade e que as reclamações do deputado são rabugices preconceituosas.  

Deixo o julgamento com vocês. 

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Formado em Ciências Econômicas na Universidade Católica de Brasília e Ciência Política na UNB, fez carreira com dezenas de cases de campanhas eleitorais majoritárias e proporcionais. É autor de, entre outros, “Que raios de eleição é essa”, Bíblia do marketing político.

1 COMENTÁRIO

  1. O Ramagem que antes ocupava o cargo de delegado (agora licenciado) se esquece que armas e drogas não são produzidas nas comunidades.
    Atravessaram fronteiras e estados até chegarem às mãos de traficantes.

    O maior uso de droga é maconha, entre as ilícitas. Já o álcool e o cigarro do tabaco legais (um dia já foram proibidos).
    Sempre que se proibiu uso de drogas surgiu o comércio ilegal delas.

    Se o usuário pudesse adquirir licitamente, até plantar para consumo próprio, o abuso seria da conta dele. Como ocorre com todas as outras.

    Campanhas de conscientização e contra o abuso são mais econômicas do que o investimento em guerra às drogas.

    A questão é que a guerra é lucrativa para políticos e empresas de armas.

    Os poderes paralelos se formam com a ausência do estado e se fortaleceram na exploração do comércio ilegal e mais recente até na atuação em outros ramos aproveitando a organização.

    Seria melhor que a atuação política fosse mais na contenção de danos e saúde pública, oferta de serviços públicos, emprego que ação violenta estatal.

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