Leader muda de dono, não paga dívidas, mas abre loja nova devendo milhões em aluguéis

Apenas na unidade da Uruguaiana, a Lojas Leader acumula débitos que atingem 6 milhões de reais e coleciona acordos não cumpridos. O último, em agosto, foi firmado pela nova administração. A dívida total da varejista ultrapassa 1,2 bilhões de reais

Advertisement
Receba notícias no WhatsApp
Leader volta ao e-commerce e volta a vender em seu site
Leader segue em crise, e não cumpre acordos firmados pelos novos donos

Já é Natal na Leader Magazine, dizia a propaganda que povoava o imaginário popular; hoje, a antiga gigante do varejo agoniza, em meio a pedidos insistentes de falência. A rede de lojas fundada em Miracema entrou no segundo semestre cheia de esperanças; vendida aos empresários Renato Vaz Heringer e seu sócio e CFO Márcio Margreife Lima, alugou uma nova sede no luxuoso e histórico Edifício Sulamérica, na rua da Quitanda 86, e lá se instalou sob os auspícios do controlador da fintech Mauá Bank, prometendo equacionar problemas com os proprietários, fornecedores e empregados, e chegando até a alugar uma nova loja.

O mercado se encheu de esperanças. Ato contínuo à posse dos novos diretores, a empresa celebrou acordos com funcionários, proprietários e até mesmo com condomínios, além de ter se comprometido a pagar milhões de reais em IPTUs atrasados que suas lojas devem ao município do Rio. As lojas, que estavam às moscas, quase sem estoque, voltaram a se encher de mercadorias. As escadas rolantes da loja da Uruguaiana, uma das maiores áreas de venda do Centro – com quase 5.000m2 – voltaram a girar, após meses travadas e com defeito.

Em Setembro, leitores do DIÁRIO festejaram a abertura de uma nova loja da varejista em Bonsucesso. O público tem afeto pela empresa, e quer confiar na habilidade de Heringer – um agradável e bonachão morador de Copacabana – de reerguer uma das mais queridas marcas do estado. Porém, a coisa parece não estar indo bem. Apesar de ter assumido a empresa prometendo solução gradual e reerguimento da marca, Heringer firmou acordos que parou de cumprir, e a empresa voltou a estar inadimplente com um sem número de fornecedores. A empresa alega que não estaria cumprindo os acordos firmados por conta de sucessivos bloqueios nas contas da companhia. Especialistas no mercado empresarial dizem, porém, que Heringer e Lima são escolados investidores em empresas em dificuldades; desde postos de gasolinas falidos até empresas de laticínios, estariam habituados a realizar este tipo de negócio.

Procurada pela reportagem, a Sergio Castro Imóveis, responsável pela loja da Rua Uruguaiana, preferiu não se pronunciar.

Histórico

A Leader ainda é uma das mais queridas marcas do Rio, com uma história que remonta à sua fundação em 1951. Inicialmente, a empresa operava como uma pequena loja de roupas, mas ao longo das décadas, expandiu-se significativamente, tornando-se uma marca reconhecida nacionalmente. A Leader, fundada pela família Gouveia, oferecia uma ampla gama de produtos, incluindo roupas, calçados, acessórios, eletrodomésticos e muito mais. Sua trajetória chegou a ser marcada por um crescimento constante, adaptação às tendências de mercado.

Depois, a empresa foi vendida ao BTG Pactual, e se expandiu mais ainda, com a aquisição da Seller, da família Furlan, de São Paulo. Uma fusão considerada mal calculada, que acabou enterrando a empresa em problemas que vive até hoje. Em 2016, o BTG vendeu a empresa por 1 real e seu comando passou às mãos de Fábio Carvalho, que controlava também a Editora Abril. Em 2020, a companhia mudou de dono de novo, passando para André Peixoto. Na ocasião a loja de departamentos tinha 90 lojas espalhadas por 9 estados do país.

Peixoto resolveu entrar com pedido de recuperação judicial, para tentar equacionar mais de R$ 1,2 bilhões de reais em dívidas que a companhia tinha. Numa recuperação judicial, a empresa equaciona sua dívida antiga mediante a apresentação de um plano para pagamento dos débitos, mas deve passar a pagar suas contas em dia a partir dali. No seu plano de Recuperação, a Leader propunha pagar as dívidas maiores que 60 mil reais só dali a 4 anos, da seguinte forma: 10% de sinal e o resto em 12 parcelas anuais se a empresa faturar mais de 1,3bi por ano; se não, não paga nada. Trocando em miúdos, se a Leader me devesse 60 mil, pagaria 6 mil reais só daqui a 4 anos, e o resto em DOZE ANOS, pagando 4,5 mil POR ANO, mas se seu faturamento for 1,29 bi, não recebo as parcelas.

Em 2020, a Leader negociou um plano de recuperação judicial com seus credores para lidar com sua dívida. Dois anos depois, a Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE-RJ) estabeleceu um acordo para amortizar 810 milhões de reais da dívida ativa da empresa ao longo de 180 meses.

Ocorre que, segundo informações obtidas pela reportagem, a Leader não só nunca pagou seus débitos anteriores à recuperação judicial, como estaria devendo novamente milhões em aluguéis e outros custos de ocupação de diversas de suas lojas; inclusive suas lojas do Centro do Rio de Janeiro, na Rua do Riachuelo e na Uruguaiana, estariam dentre as devedoras. Obtivemos acesso a certidões de pagamento de IPTUs de duas lojas – é um documento público – e a empresa simplesmente deve milhões de reais em IPTU, além de condomínio e – claro – alugueis. Os donos da loja da rua do Riachuelo já ingressaram com ação de despejo por falta de pagamento. Não estariam cumprindo acordos trabalhistas, segundo o G1 e o Relatório Reservado. O DIÁRIO averiguou que a empresa também está descumprindo acordos firmados com Condomínios e Proprietários. Estima-se que a dívida só com um único proprietário já seja da ordem de 6 milhões de reais, sem contar fornecedores e débitos de outros tipos. Foi assim que em 2023 a empresa foi vendida de novo, e depois revendida, agora em 2024, ao grupo proprietário do Mauá Bank, tendo voltado a acumular dívidas, embora mesmo assim tenha inaugurado uma nova loja, em Bonsucesso.

Procurada pelo DIÁRIO, a Leader encaminhou a seguinte nota, que publicamos, na íntegra:

“As Lojas Leader vem informar que, devido ao alto número de ações trabalhistas enfrentadas, tanto individuais quanto coletivas e outros acordos também firmados com fornecedores, a manutenção dos salários e benefícios em dia dos funcionários ativos, o fluxo de caixa da empresa foi afetado nos últimos 60 dias devido a bloqueios judiciais bancários de valores milionários. Bloqueios estes, que atrasaram alguns cumprimentos de acordos já firmados. Estamos trabalhando árdua e continuamente para solucionarmos essas pendências ainda durante a primeira quinzena do mês de novembro. Sobre a abertura da loja em Bonsucesso, essa em questão, já existia em um ponto ao lado e foi remanejada justamente por custos menores. Entendemos também que trabalhando em conjunto a manutenção e a expansão, conseguiremos um maior fluxo de receitas para sanar as questões acima citadas”

Advertisement
Receba notícias no WhatsApp
entrar grupo whatsapp Leader muda de dono, não paga dívidas, mas abre loja nova devendo milhões em aluguéis