Vila Isabel, tradicional reduto da boemia e do samba carioca, vive uma contradição entre sua história rica e seu presente marcado pela insegurança. Considerado um dos mais tradicionais bairros da Zona Norte do Rio, a Vila já foi sinônimo de tranquilidade e qualidade de vida, mas nos últimos anos, tem se tornado manchete por motivos preocupantes.
Conhecido como o “bairro de Noel”, em homenagem ao sambista Noel Rosa, Vila Isabel sempre foi um lugar onde a cultura carioca floresceu. Com suas ruas arborizadas, casas históricas e comércio antigo, o bairro é um dos mais históricos do Rio, fundado oficialmente em 1872 pelo empreendedor João Batista Viana Drummond, o Barão de Drummond. Inspirado pela arquitetura parisiense, o Barão projetou a Vila com ruas largas e praças arborizadas, além de homenagear a Princesa Isabel e o movimento abolicionista, ao qual ele estava fortemente ligado.
Mas a Vila, que já foi retratada em letras de sambas de Noel Rosa, Martinho da Vila e outros poetas da música carioca, hoje enfrenta uma realidade que pouco se assemelha ao seu passado glorioso. O bairro, que foi planejado para ser um modelo de urbanização e civilidade, agora é frequentemente associado a notícias de violência e criminalidade.
Nesta segunda-feira (19/08), o bairro foi palco de mais um triste episódio. Um tiroteio na Praça Barão de Drummond, uma das principais do bairro, resultou na morte de cinco pessoas, assustando moradores e comerciantes. Esse é apenas o mais recente em uma série de eventos violentos que têm se tornado cada vez mais comuns na região. Roubo de fios, assaltos, furtos e confrontos armados são agora parte da rotina de um bairro que, por décadas, foi considerado um dos melhores para se viver na Zona Norte.
A deterioração da segurança em Vila Isabel começou a se intensificar na década de 90, com a expansão de comunidades vizinhas, como o Morro dos Macacos, localizado no próprio bairro, além da Mangueira, Complexo do Lins e Andaraí. Essa proximidade trouxe consigo um aumento da criminalidade, obrigando os moradores a mudarem seus hábitos. As belas fachadas das casas históricas do início do século 20 foram gradualmente substituídas por muros altos e sistemas de segurança. Condomínios investiram pesado em segurança interna, tentando se proteger em meio ao crescente clima de insegurança. O aumento no roubo de fios, câmeras de segurança, grades e qualquer outro objeto feito de cobre tem causado grande preocupação entre os moradores.
Por ser um bairro majoritariamente residencial, o maior movimento de Vila Isabel concentra-se na Boulevard 28 de Setembro, a principal via comercial da região. Em contraste, as ruas paralelas, compostas por casas e pequenos prédios, costumam ser mais desertas, especialmente à noite, o que aumenta o risco de assaltos. A área mais crítica do bairro é a que se estende nas proximidades da Rua Barão do Bom Retiro e do Túnel Noel Rosa, uma região próxima ao Engenho Novo. A insegurança nessa área é agravada pela proximidade com vias que dão acesso a comunidades, o que contribui para a ocorrência de crimes.
Além dos desafios de segurança, Vila Isabel ainda carrega um legado histórico impressionante. O bairro abriga nove prédios tombados pelo Patrimônio Histórico e já foi o endereço da Companhia de Fiação e Tecidos Confiança Industrial, uma das mais importantes fábricas de tecidos do Brasil no final do século 19. No antigo Jardim Zoológico, o primeiro do Brasil, hoje chamado de Recanto do Trovador, o Barão de Drummond criou o jogo do bicho, que até hoje faz parte da cultura popular. O espaço, que é pouco frequentado pela população, virou reduto de usuários de drogas e assaltantes.
O bairro, que no início do século 20 se tornou o ponto de encontro de músicos e boêmios, permanece um símbolo da cultura carioca. Mas, à medida que a violência e a insegurança continuam crescendo, a pergunta que muitos se fazem é: como o bairro pode reencontrar o caminho da paz e recuperar seu status como um dos mais acolhedores do Rio?