Fábio tirou uns dias pra ficar com a mãe. Teve o cuidado de fazer o teste nele e nela antes, além de ter feito um isolamento severo pra não arriscar a saúde de sua mãe, coisa que seu irmão não fez, segundo ele.
Jaime, pai do Fábio, continuava no CTI mas com um prognóstico positivo, já desentubado. A esperança da família Weiss estava grande.
Fábio sentia um mal estar, um aperto forte no peito que nenhum ansiolítico daria jeito.
Medo do coronavírus levar seu pai, medo de sua mãe se contaminar, preocupação com as crianças, com a empresa, mas, mais que tudo, medo de perder Joana.
Fábio estava adorando o flerte picante com a Luiza, mas é a Joana que ele quer ao lado.
Sentir-se dividido – algo tão inédito assim? Não, absolutamente humano, apesar de nunca aceito como uma possibilidade plausível. Gostar de duas pessoas, querer duas coisas diferentes, namorar duas pessoas – não deveria chocar jamais, mas ofende e choca o tempo todo.
De repente, até a gostosa Luiza perdeu a graça – Joana iria se experimentar livre e solta em
algum desses aplicativos de paquera. E se ela resolver se vingar (sim, porque é de vingança que se trata) com algum colega de trabalho? Não, ela não iria expor seu marido assim. Ou iria?
Fábio sofria – dor de estômago e pescoço travado. Mas ele não tinha forças pra brigar contra isso e nem queria se sentir um troglodita machista. Fábio era um cara legal.
O pacto dos dois era de que ela vivenciasse um nano affair digital, tal qual ele viveu, e assim, conseguissem zerar mágoas e desconfianças pra seguir a vida a dois.
Nada de carne e osso pra nenhum dos dois.
Aparentemente, é esse o combinado.
E assim selaram o acordo sofrido pros dois (não se engane, Joana está muito infeliz).
É domingo e as crianças perguntam pelo pai.
-Seu pai foi fazer companhia à vovó Clarisse. Em breve ele volta.
– Queria ir também! , disse Antonio.
– Filho, em breve estaremos todos juntos. Vamos aguentar só um pouquinho. J
Domingo sem Fábio: Joana também se sentia angustiada. Afinal, a família estava capenga. Cadê ele pra ver desenho com as crianças? Pra ajudar a preparar o almoço? Pra montar legos e jogar video game?
Cadê a companhia da Joana?
Nesse domingo diferente, Joana choramingou várias vezes, algumas, trancada no banheiro pras crianças não verem.
Ela lembrava de forma recorrente as imagens da loura de lingerie no celular do Fábio, acredito que para não esmorecer e seguir em dente com a ideia de empatar o jogo.
A noite chegou e com ela o sono das crianças. Olga dormiu na sala vendo TV. Antonio, já ansioso mesmo tão novo, organizava materiais para as aulas do dia seguinte.
– Vamos dormir. amores meus!
– Mãe, você vai ter que pegar Oga no colo já que papai não tá aqui! Posso ligar pra ele?
-Claro, filho. Liga, sim. Vou levar Olguita pra cama.
– Mãe, posso dormir com
– Você na sua cama?
– Por que, filho? Tá preocupado?
– Tô sim. Mas não consigo explicar com o quê.
Joana era uma mãe sensível, por mais que tivesse planos aquela noite, abriria mão de todos para deixar Antônio seguro e aninhado.
-Claro meu amor, vai botar seu pijama, escovar seus dentes e mergulha na cama comigo.
-E Olga? Ela vai ficar furiosa se vir que não dormiu com a gente!
-Vou quer que ela durma na minha cama também? -Quero!
-Tá bem! Vou colocar ela no meio da gente, tá bem?
Ah, se todos os pais tivessem essa capacidade de entender um dia de medo e insegurança de seus filhos e pudessem dar esse super colo. Joana ouvia de sua mãe a seguinte frase: “Amor demais prejudica menos que amor de menos.”
E isso norteava a criação das crianças.
Em trinta minutosn os dois já estavam completamente “entregues” na cama de Joana – dormiam profundamente.
Joana se preparou também – creme facial, corporal, camisola e meias.
Deitou-se no canto da esquerda da cama, seu lado original, e pegou seu celular – o portal de novidades e ousadias em sua vida.
No WhatsApp tinham algumas mensagens: mãe, colega de trabalho, Márcia… e nada do Fábio.
Joana só pensa nele, num mix de sentimentos variados: pensa em quando o conheceu, em quando se casaram, no tesão que tinham, no dia do parto em que ele estava ao lado dela segurando sua mão, e pensa também na dor de vê-lo babando por outra mulher de lingerie.
A raiva e o ressentimento lhe tomam e ela resolve voltar ao aplicativo de paquera pra tentar relaxar.
Começou a saga de gostar ou não gostar dos candidatos. Mensagens de diferentes homens chegam até ela. Joana não se sente conforhutável, mas o espírito de empatar o jogo prevalece.
E se algum amigo do Fábio me vir no app?
Imediatamente, Joana cantarola Beth Carvalho:
“Vou festejar o seu sofrer, o seu penar.” Sim, o sentimento de vingança existe e, pra muitos, é legítimo. Afinal, Joana é humana como todos nós.
De repente, sobe uma mensagem menos distanciada:
Voltou ao app? Tá sumida, achei que tinha ficado tudo bem com seu casamento.
Era o Marcos.
– Oi, Marcos. Tá tudo bem ruim e confuso.
– Você falou no WhatsApp sobre o que vem passando mas muito rapidamente. Disse que um dia me contaria melhor. Quer conversar?
– Quero.
– Vou te ligar. Pode falar?
– Me dá uns minutos, as crianças estão na minha cama. Vou pro escritório.
Joana sentou-se na cadeira e esperou Marcos ligar. Em minutos já estavam se falando.
-E aí? Como você tá?
– Bem mal, na verdade. Propus ao meu marido um tempo fisicamente separados e uma janela no relacionamento. Quero viver algo online como ele vem vivendo com uma mulher que ele conheceu na internet. Se ele precisa desse parque de diversões, eu também preciso. Quero experimentar. Se ele diz que não tem nada demais porque não houve encontro físico, não vai haver problema pra mim também.
-Haha. Você é danada! O cara deve estar desesperado!
-Por que? Não é algo superficial e passageiro? Não é só um game? Uma pausa na vida pesada que levamos? Também quero.
-Entendo você. É duro descobrir que não somos o suficiente para a felicidade do outro…Mas como você pode garantir que vai ficar só na brincadeira online? Você pretende brincar com vários?
-Naaão! Quem você pensa que eu sou!??
-Calmaaa, gatinha… eu só perguntei, sem julgamentos! Não sou esse tipo de homem. Acho a sua personalidade um barato!
-Desculpa….
-Posso ser o seu objeto de vingança? Ou o seu game online? Sempre tive tesãyo em você. Acho que mais que isso… você era o meu crush de escola. É.by Eu era invisível para você…
-Então, tenho medo…
-Medo de que?
-De acabar sendo mais que uma brincadeira passageira. Eu não quero desmontar a vida que tenho. Quero acertar meu casamento!
-Mas se tem medo é porque já não tá tão certo assim. Se tem medo é porque eu tenho alguma chance… haha.
-Aff, você está me manipulando…
-Posso te chamar em vídeo?
-Não! Estou horrível!
-Impossivel,
-Você é a brunette mais linda que eu já vi.
-Você não me vê há muito tempo, Marcos.
-Instagram e Facebook não contam? Te vejo todos os dias…Linda!
-Quero me arrumar pra ligar o vídeo pra você. Se não destruo de vez minha autoestima.
-Ok, ok. Mas eu não me importaria. Me conta então do seu dia.
-Isso não é romântico! Meu dia e sempre caótico!
-Mas eu gosto de você e quero saber de você! Posso?
-Pode. Hoje foi um domingo pior do que os demais…
E assim conversaram bastante. Marcos contou sobre as decepções com sua ex. Riram e falaram sério.
Marcaram um vídeo pro dia seguinte, depois das crianças dormirem.
Joana dormiu triste, preocupada, ansiosa, mas com um friozinho na barriga gostoso. No dia seguinte se arrumaria pro vídeo da noite com Marco.