Devido ao aumento de impostos cobrados aos fabricantes de aguardente, houve uma grande rebelião no Rio de Janeiro. A Revolta da Cachaça marcou nossa história.
A Coroa Portuguesa proibia a produção e comércio de manufaturas na colônia. E isso incluía os destilados, tão consumidos em terras brasileiras. Contudo, no dia 31 de janeiro de 1660, na Capitania do Rio de Janeiro, a Câmara dos Vereadores propôs a liberação da produção de cachaça. A ideia foi executada pelo então Governador da Capitania Salvador Correia de Sá e Benevides.
“O Governador, no entanto, estipula uma gama de taxas (fintas) a serem cobradas, sem terem sido em muitos casos, aprovadas pela Câmara”, destaca o site Impressões Rebeldes, composto por artigos sobre revoltas sociais.
E aí começou o porre. Produtores de cachaça da região norte da Baía da Guanabara, então Freguesia de São Gonçalo do Amarante (atuais municípios de São Gonçalo e Niterói), sobretudo Jerônimo e Agostinho Barbalho, se rebelaram contra a taxa.
Por seis meses, reuniões aconteceram na fazenda de Jerônimo Barbalho, na Ponta do Bravo (atual bairro do Barreto, em Niterói). Ali, a revolta começava a ganhar corpo. Não à toa, a Revolta da Cachaça também foi chamada de Revolta do Barbalho.
Até que, no dia 8 de novembro de 1660, liderados pelo fazendeiro Jerônimo Barbalho, os revoltosos atravessaram a Baía da Guanabara, convocando o povo da cidade pelo toque de sinos a se encontrar em frente ao prédio da Câmara dos Vereadores.
Foram 112 senhores de engenho, que exigiam o fim da cobrança das taxas, além da devolução do que já havia sido arrecadado pelo governo. Tomé de Sousa Alvarenga, governador em exercício durante a ausência de Salvador Correia de Sá e Benevides, foi feito de prisioneiro.
As casas da família Correia e de Salvador de Sá foram saqueadas em meio aos protestos nas ruas do Rio de Janeiro. Alvarenga, o governador em exercício, foi enviado para Portugal. Agostinho Barbalho foi nomeado novo governador, mas recusou o cargo e se escondeu no Convento de Santo Antônio, de onde foi retirado à força e forçado a assumir o cargo.
Agostinho, após assumir o cargo bastante contrariado, buscou servir doses de tranquilidade. Ele promoveu nomeações e procurou agradar à família Correia, a família do governador. As posturas conciliadoras bateram bem para Salvador de Sá que, em São Paulo sabendo de tudo o que acontecia no Rio, deixou o cargo no governo para os revoltosos.
“Essa boa relação com o antigo governador gerou insatisfação entre os que protestavam e o governo de Agostinho Barbalho teve fim em 6 de fevereiro de 1661. Seu irmão, Jerônimo Barbalho, se tornou governador com aval da Câmara”, conta o pesquisador Bruno Vieira.
No poder Jerônimo Barbalho provocou grande ressaca. Agiu autoritariamente, perseguindo jesuítas, aliados de Salvador de Sá e militares. Com isso, a oposição se fortaleceu. De São Paulo, Salvador de Sá organizou uma tropa de paulistas (na maioria índios e mestiços) com o apoio de dois navios enviados da Bahia e foi com tudo em direção ao Rio de Janeiro para tomar o poder de volta.
No dia 06 de abril de 1661, uma grande força-tarefa liderada por Salvador de Sá chegou ao Rio de Janeiro. A frota da Companhia de Comércio já estava de prontidão no litoral, enquanto Sá invadiu pelo interior. Os revoltosos, surpreendidos pelo tamanho da ação, não resistiram.
Os líderes da Revolta da Cachaça foram aprisionados. Diogo Lobo Pereira, Jorge Ferreira de Bulhão e Lucas da Silva condenados à prisão. Jerônimo Barbalho pegou pena de morte e foi decapitado. A justificativa de Salvador de Sá, em carta ao Rei D. Afonso VI, disse que a morte do revoltoso era “lapidar à população para que não cometesse atos semelhantes“.
No entanto, o Conselho Ultramarino deu razão aos rebelados. Salvador de Sá foi afastado de suas funções e precisou responder em Portugal por seus excessos. A família Sá, descendente do ex-governador-geral Mem de Sá e do fundador da cidade do Rio de Janeiro, Estácio de Sá, perdeu prestígio e a grande influência que até então conseguira manter. Os rebeldes condenados foram libertados.
A regente Luísa de Gusmão, esposa do Rei João IV de Portugal, em 1661, liberou a produção da cachaça no Brasil. O comércio local, porém, continuava limitado, mas a repressão era mínima, contando até com a participação das autoridades, como João da Silva e Sousa, que governou o Rio de 1670 a 1675 e era o principal contrabandista de cachaça da época.
Décadas mais tarde, em 1695, a proibição foi revogada de vez. A cachaça, que à época também chamada de “aguardente da terra” e “jeritiba”, teve sua produção elevada e se tornou produto nacional. Como é até hoje em dia.