‘Esse é o pensamento da Bait: fazer uma ideia de casa diferente’, diz Henrique Blecher

CEO da incorporadora, em entrevista ao DIÁRIO DO RIO, fala sobre o sucesso da empresa, mercado imobiliário e Rio de Janeiro

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Henrique Blecher em entrevista ao Diário do Rio | Foto: Rafa Pereira / Diário do Rio

Bait, letra b do alfabeto hebraico, significa casa. É daí que vem o conceito da empresa que tem Henrique Blecher como CEO. E da parceira entre ele, David e Amanda Klabin e Eduardo Tkacz vem o sucesso da incorporadora.

Em pouco tempo de atuação no mercado imobiliário, a Bait conseguiu feitos surpreendentes.  Entre eles, o lançamento Atlântico Bait, no último terreno disponível de frente para a praia de Copacabana. Há mais de 40 anos não se via um lançamento de um prédio residencial na orla mais famosa do Rio de Janeiro. Depois disso, ainda adquiriu o terreno onde antes funcionou o Bingo Arpoador.

Em um escritório moderno na Zona Sul da cidade do Rio, Blecher recebeu a equipe do DIÁRIO DO RIO para uma conversa aberta e informal sobre a empresa, o mercado imobiliário e o Rio de Janeiro como um todo.

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Henrique Blecher fala com o Diário do Rio | Foto: Rafa Pereira / Diário do Rio

DDR: Como foi seu começo na Bait?

Henrique Blecher : Fui chamado pelo David, Amanda (Klabin) e Eduardo (Tkacz) para fazer operação de crédito imobiliário na gestora deles.  Eu estava num momento sabático, indo e vindo da França, fazendo várias coisas lá. Sentei com eles para falarmos desse negócio e pintou o primeiro terreno, pequeno, na Vinícius de Moraes, do lado do Mosca, o que foi simbólico para nós, inclusive. Decidimos comprar. E decidimos fazer direito, montar uma incorporadora. Nosso primeiro lançamento foi 2018. E em 2019 teve o Bossa, que foi super importante, porque a gente comprou o terreno na Barão da Torre, número 107, e havia uma inquilina, com um hostel. Ela tinha uma articulação na mídia e como ela teria que sair, deu um jeito de colocar uma notícia no Jornal do Brasil dizendo que a gente queria acabar com a casa onde  Tom Jobim tinha feito a música “Garota de Ipanema”. Ela tinha dito que ia pensar se ia vender ou não. Depois, veio com essa matéria. Após isso, outra matéria, dessa vez do Joaquim Ferreira dos Santos, e o deputado Carlos Minc (PSB) veio com projeto para tombar a casa. Mas, conseguimos reverter. Não fazia sentido aquela casa ser tombada. Eu considero que esse foi um momento bem importante, porque se tivesse sido mesmo tombada, acho que a gente teria desanimado logo no início. Aí, em 2019, a gente começou a acreditar mais no mercado, os juros estavam caindo, com isso, a gente fez algumas aquisições. Entre elas, a casa que foi do Ivo Pitanguy. Até a pandemia, tínhamos seis pessoas trabalhando. Hoje, temos 111. A gente cresceu muito em 2020 e 2021.

DDR: A que você atribui o sucesso rápido da Bait?

Blecher: Eu credito a alguns fatores. Eu e meu sócio temos uma sinergia grande. A gente entende bem a dinâmica dos negócios. E, segundo, mas não menos importante, eu consegui montar uma equipe maravilhosa. O mercado estava ruim, as pessoas sem emprego, então, eu atrai muita gente boa para a empresa. Deu liga. Se perguntar, ninguém quer sair da Bait. Eu venho do mercado financeiro e temos aqui essa cultura de uma agressividade maior na remuneração, na meritocracia. E também tem o fator da escolha de bons terrenos. A gente não teve medo de brigar de igual para igual com as grandes do mercado, mesmo sendo pequenos naquele momento.  Acreditamos que o Rio estava num momento diferente. O código de obras tinha sido aprovado, o que possibilitou fazermos ‘studios’, além do próprio cenário de juros baixos.

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Henrique Blecher fala com o Diário do Rio | Foto: Rafa Pereira / Diário do Rio

DDR: Sobre essa questão dos terrenos, vocês fizeram grandes aquisições, terrenos que estavam à venda há anos, como a Clínica Ivo Pitanguy. Como foram esses processos de compra que pareciam tão difíceis?

Blecher: Compramos o da casa do Ivo e o Atlântico no apagar das luzes. O Ivo, cheguei na disputa e estava quase fechado, vendido. Quase nem me atenderam, mas fui atendido, entrei no negócio e fechei. O Atlântico foi um leilão que a Cyrela levou e desistiu, aí eu consegui fechar. Foram terrenos muito emblemáticos para nós. Essas compras nos deram muita força no mercado.

DDR: A Bait tem essa atuação forte na Zona Sul. Pretendem ir para outros bairros?

Blecher: A gente começou na Zona Sul, porque a gente entendeu que a Zona Sul, quando começamos, era uma reversa de valor. Ou seja, deu tudo errado, você tem um terreno em Ipanema, Leblon, Copacabana. Investimento na Zona Sul é mais na defensiva. Pensamos como estratégia. Que ativo a gente vai ter para se defender? E deu super certo. Agora, estamos olhando a Barra com bastante atenção, estamos negociando algumas coisas lá. Mas para tentar levar diferencial, levar [fazer] coisas que não têm na Barra. Como fazemos na Zona Sul.

DDR: E o Centro da cidade, a Bait tem interesse?

Blecher: O Centro é um caso à parte. Quando começou o programa Reviver Centro, fomos chamados lá para discutir, conversar com o Eduardo [Paes], [Washington] Fajardo. A tese é muito bonita. Quem é contra revitalizar o Centro? Ninguém é contra. Eu coloquei uma ideia na mesa que acho que deu início na operação interligada, de dar benefício para você construir em outro lugar. Eu falei “o mercado imobiliário hoje não tem interesse de ir ao Centro”. O Centro não tem preço, está abandonado e a vocação do Centro é comercial. É difícil, você virar essa equação. Uma saída é dar benefício para a gente vir. Benefício é bom, que você dá e tira depois. O Centro tende a ganhar valor, sem dúvida. Tem tudo no Centro: infraestrutura maravilhosa, transporte, beleza. Daqui a pouco, o Centro ganha valor e o Poder Público tira o benefício. Benefício para construir em toda a cidade. Depois, o Centro começa a ter valor e as empresas vão para o Centro pelo Centro por si só, não pelo benefício de construir também em outras partes da cidade. Acabou que na discussão toda, o governo achou por bem fazer em um território restrito, onde não incida a Lei Orgânica da Cidade. Hoje, você tem Copacabana, Ipanema, Botafogo e parte da Tijuca para ter esse benefício. Você tem que fazer [o prédio] colado nas divisas. E você fica com poucos terrenos e os donos dos terrenos, sabendo disso, subiram o preço. Por isso, hoje, ainda, o Centro não nos interessa nesse sentido. Eu acho que vai ter, pode ter, mas ainda não tem interesse para nós. Ainda não nos interessa. E se eu colo na divisa, eu só posso construir apenas quatro andares, então não faz sentido. Descolado da divisa, eu subo muito mais. A equação não fecha. Uma pena. Acho que se perdeu uma oportunidade de fazer uma grande operação no Centro.

DDR: Sobre o Reviver Centro, especificamente, qual a sua opinião?

Blecher: Tem coisas boas, coisas reeditadas de outras leis. Tem a coisa muito boa de você discutir, de fato, o Centro como lugar de moradia. Revitalizar bens tombados. Mas, repito, o Centro hoje não é atrativo para o mercado. Não fecha a conta. Eu acho como ideia, muito boa, mas acho de difícil execução. Enquanto você não tiver uma atratividade real, você não vai levar a indústria do mercado imobiliário para lá e, gostem ou não, é a indústria do mercado imobiliário que movimenta tudo, que leva pessoas, infraestrutura, revitaliza.

DDR E o Plano Diretor, a Bait está envolvida nas discussões?

Blecher: Muito envolvidos. Vai ser um debate importante. Estamos participando dos debates bem de perto. A cada 10 anos, o Plano Diretor tem que mudar. As ideias são muito boas, mas às vezes não funcionam muito na prática. Uma delas é ter uma ideia de que a cidade passa a ter o coeficiente [construtivo], toda ela, basicamente, de 1. Ou seja, só pode construir uma vez [o tamanho do terreno]. Então, você tem um terreno que você herdou, de 1000 metros, no Leblon, que poderia valer 50 milhões de reais e que para você passa a valer 10. Por causa desse coeficiente [de aproveitamento máximo]. E os outros coeficientes que eram do terreno passam a ser do município no pagamento da outorga. Essa é uma ideia que dá medo em nós, porque para quem vai comprar o terreno, tanto faz, posso comprar de qualquer um. Mas, para quem vai vender, sabendo que está valendo menos, a pessoa pode não vender. Pode deixar lá, esperando valorizar, pensando no fato de que o Plano Diretor muda a cada 10 anos. Nosso medo é isso dar uma arrefecida grande no mercado. Essa é uma das discussões sérias que vamos ter no Plano Diretor. Precisamos também discutir os espaços. Onde vamos ter essas regras? Que corredores vão ser esses? Enfim, tem muitas coisas para se discutir no Plano Diretor, mas esse é um ponto muito sensível que a gente está muito preocupado.

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Henrique Blecher fala com o Diário do Rio | Foto: Rafa Pereira / Diário do Rio

DDR: O que você pensa da revitalização da região da Zona Norte próxima ao Centro?

Blecher: Eu acho a ideia muito boa. O Rio de Janeiro cresceu muito para a Zona Oeste e quando você cresce muito para a região longe do Centro, você cria alguns problemas de infra, de segurança. O que tem que ser discutido é onde tem estrutura nessas regiões e onde vai ter regulação, também, porque se você não regula nada, entra a milícia. É uma questão muito séria que precisa ser vista no Rio de Janeiro: as milícias. E para a região da Zona Norte, Central, precisa ser discutida uma política para que essas áreas se tornem atrativas e sejam revitalizadas. Até se constrói nessas regiões, mas é tanto entrave legal que desanima as empresas. Na Zona Norte tem muito terreno fechado, que ninguém vende. Fala-se no adensamento da cidade. O Rio é pouco adensado em relação a outras grandes cidades do mundo. Tem que se discutir tudo isso, mas olhando para a vida prática. Se o Plano Diretor for uma iniciativa acadêmica, fazendo exercício de futurologia, a gente pode perder mais uma década. A gente tem que olhar para a questão prática. No Rio, se tomba e preserva para manter o bem, não para reformar. A discussão do patrimônio é sempre a mesma: você não pode transformar, você tem que reusar. No Plano Diretor, isso também tem que ser discutido.

DDR: Mas, com isso, não corre o risco de, pouco a pouco, acabarem os prédios históricos da cidade?

Blecher : Eu morei em Londres muito tempo. Eu vi muitas igrejas históricas lá que foram preservadas, tiveram outro uso e continuaram preservadas. Com intervenções arquitetônicas arrojadas, mas mantendo o bem tombado preservado. Muitos imóveis tombados no Rio estão se destruindo, porque ninguém compra já que não pode fazer nada de grande reforma depois que compra. Isso também tem que ser discutido no novo Plano Diretor.

DDR: Você acha que a arquitetura no Rio de Janeiro está parada, pouco criativa, muitos prédios iguais? Por que isso está acontecendo?

Blecher: Por causa da legislação. Você não tem muito espaço para desenhar. É tudo muito quadrado, mesmo. Você não consegue inovar muito. São Paulo, nesse sentido, tem uma legislação mais contemporânea e você tem uma arquitetura muito bonita, com prédios muito legais. Tem coisa feia também, mas muitas coisas legais. Aqui no Rio de Janeiro já foi diferente, porque a legislação era muito por decreto e você tinha os ‘amigos do rei’, que acabavam tendo mais liberdade, então, temos prédios antigos bem mais criativos, bem menos caixotes, quadrados. Depois de 1988, passamos a ter uma Constituição mais ampla, democrática, mas tem esses entraves que atrapalham certas ideias hoje em dia. São esses prédios antigos que fizeram do Rio a capital mundial da arquitetura. É outra discussão que o Plano Diretor precisa ter. A legislação tem que acompanhar a história.

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Henrique Blecher fala com o Diário do Rio | Foto: Rafa Pereira / Diário do Rio

DDR: Por que parece ser tão difícil discutir urbanismo no Rio de Janeiro?

Blecher: A discussão sobre urbanismo é muito técnica. Tem muita gente no Poder Público, em todas as esferas, que não entende. Eu discuto com outras pessoas da área de fazermos algo para que fique mais acessível esse debate sobre urbanismo. São muitos termos técnicos. Temos que facilitar esse entendimento para a população, Poder Público. Tudo isso vai ser importante no debate do Plano Diretor. O urbanismo afeta muito a vida das pessoas e esse debate tem que ir de forma clara para a imprensa para ajudar a aprofundarmos as conversas e chegarmos em bons resultados para a cidade.

DDR: O que você considera o diferencial da Bait?

Blecher: A gente tem uma visão muito descompromissada com várias verdades do mercado imobiliário que testamos e está dando certo. Por exemplo, a gente acredita muito no produto. A gente inaugurou uma coisa que é abrir mão de aparente rentabilidade, aparentes áreas de venda, para fazer empreendimentos com uma área de lazer, área de escape, área de respiro, muito verde e tudo isso se traduziu em uma diferenciação por preço. É difícil conseguir isso nesse mercado. No Rio, mais difícil ainda. Conseguimos mostrar que temos um produto de valor e ganhamos com isso. Algo que fizemos foi abdicar de construir uma só cobertura e fazer um espaço de cobertura para todo mundo. Não temos um aparamento com cobertura. Temos 50 apartamentos que podem usufruir daquele espaço, daquela vista. Outra coisa é muito cuidado com o produto. O carioca se acostumou a morar mal. Especialmente de uns 20, 30 anos para cá. A gente mostra que é possível viver melhor dentro do seu apartamento, da sua casa. Esse é o pensamento da Bait: fazer uma ideia de casa diferente. A gente tenta ganhar um pouco mais de pé-direito, o que parece uma cosia boba, mas traz mais satisfação, mais qualidade para o imóvel, para a vida das pessoas. São cuidados que fazemos que se tornam diferenciais. Além dos terrenos. A gente escolhe muito bem. A gente não compra o terreno e cria o produto. A gente pensa o produto e compra terreno. E também trazemos arquitetos de outras cidades, que trazem visões diferentes. É um pouco disso, mostrar para o carioca que ele pode viver melhor. Eu não preciso ter uma lavanderia em casa, ela pode estar no empreendimento, em outra área. O mesmo acontece com uma sala gigante de TV. Com menos carros, por exemplo, precisamos de menos vagas de garagem, o que deixa o condomínio mais barato. Muita tecnologia também é algo que temos. São coisas do tipo que servem de diferencial.

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Henrique Blecher fala com o Diário do Rio | Foto: Rafa Pereira / Diário do Rio

DDR: Quais os planos futuros da Bait para esse pós-pandemia?

Blecher: Estamos preocupados com o cenário macroeconômico, o mercado imobiliário anda muito junto com essas questões maiores da economia. Hoje, temos um cenário econômico complicado de inflação alta, juros subindo. As variáveis econômicas preocupam a gente e mais do que nunca vamos apostar em empreendimentos de altíssima renda. Basicamente para o público que não é afetado por essas questões da economia. O pós-pandemia preocupa por esse sentido. Se por um lado, hoje as pessoas entendem que têm que morar melhor, por outro, teremos um cenário complicado ano que vem. Então, vamos investir nesse mercado de alto padrão em 2022. Outros projetos ficam para 2023.

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