Quarteirão inteiro na Praia do Flamengo vai a leilão, totalizando 174 apartamentos

Todos os moradores serão despejados dos 3 grandes edifícios projetados pelo renomado arquiteto Robert Prentice. Os imóveis são da Santa Casa de Misericórdia e serão leiloados por dívidas. Um deles já foi arrematado.

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O belíssimo edifício Anchieta é um projeto do premiado arquiteto escocês Robert Prentice, um dos ícones do art déco mundial. Será leiloado por dívidas da Santa Casa de Misericórdia, junto com os dois edifícios irmãos, Barth e Nóbrega.

A crise numa das instituições mais antigas do país, a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, atinge cada vez mais contornos dramáticos. A instituição filantrópica católica foi fundada em 1582 pelo Padre José de Anchieta. Nos últimos 40 anos, porém, mergulhou numa crise que, passando pela perda da administração dos Cemitérios da Cidade, chega a seu auge. Proprietária de centenas de imóveis em toda a cidade – dentre eles o lindíssimo e quase arruinado Palacete São Cornélio, na rua do Catete, a entidade deve fortunas, e seu patrimônio cada vez mais é atacado por credores, que miram em seus imóveis mais nobres.

Dentre os imóveis de propriedade da Santa Casa, estão três imensos edifícios no Flamengo, que ocupam um quarteirão inteiro localizado entre a Praia do Flamengo e as ruas Machado de Assis e Almirante Tamandaré. Ali, a instituição tem belíssimos edifícios, o Anchieta, o Nóbrega e o Barth; todos os três são grandes e marcantes, construídos no estilo art déco, e projetados pelo premiado arquiteto escocês Robert Prentice, um verdadeiro ícone da arquitetura no estilo moderno, e autor de projetos famosos como o Galeria Sulamérica, a Estação Central do Brasil, o premiado Edifício Itaoca, em Copacabana, e outros.

Os três prédios têm uma característica marcante, suas lindas varandas arredondadas, além do imenso e valioso terreno na região mais valorizada do bairro do Flamengo. Foram visitados pelo especialista em imóveis históricos Rafael Bokor, anos atrás. Ele contou a história e deu informações valiosas: “Na Praia do Flamengo, 186, está a entrada principal de um conjunto de três edifícios erguidos no início da década de 1940 pelo Dr. Ary de Almeida e Silva, Provedor da Santa Casa de Misericórdia na época. O Anchieta e o Nóbrega contam com 11 andares e 66 apartamentos cada. Já o Barth (em homenagem ao doador do terreno Sr. Alberto Barth) possui 7 andares e 42 imóveis. Ao todo são 174 unidades pertencentes a Santa Casa do Rio, ou seja, todos os moradores são inquilinos. Os pontos fortes, além da vista da Praia do Flamengo, é o amplo terreno dos prédios e o tamanho dos apartamentos.

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O imenso quarteirão formado pelos três edifícios que totalizam 174 apartamentos de 2, 3 e 4 quartos está em vias de ser perdido definitivamente pela Santa Casa, colocando inquilinos de anos sob o risco de perder suas moradias, para que a instituição possa saldar seus compromissos. Os prédios estão em estado precário de conservação.

Ocorre que as dívidas da Santa Casa de Misericórdia chegaram a um nível insustentável e os imóveis são alvo de um processo trabalhista “cabeludo” que corre no Tribunal Regional do Trabalho, a cargo do juiz Fernando Reis de Abreu. Nos autos deste processo, de 2014, o DIÁRIO DO RIO verificou que o edifício inteiro na Praia do Flamengo 186, deve ser leiloado pelo martelo da leiloeira Tassiana Menezes no próximo dia 14 de Fevereiro. No processo, a Associação de Moradores dos três Edifícios tenta, a todo o custo, atrasar o leilão.

O DIÁRIO verificou que há muitas reclamações de moradores dos edifícios na internet, inclusive no site Reclame Aqui. Os moradores dão conta do estado de petição de miséria em que se encontram os prédios de 1941, reclamando inclusive que há momentos em que nenhum dos elevadores funciona. “A administradora Zirtaeb, que administra os imóveis, tenta empurrar a culpa para a empresa de elevadores Atlas Schindler“, disse ao DIÁRIO uma moradora que preferiu não se identificar, e complementa: “a Zirtaeb não resolve nada, até porque a Santa Casa é insolvente. Fica inventando história pra justificar o injustificável“, disse.

O edital de leilão do edifício da Praia do Flamengo (cuja foto ilustra a reportagem) corrobora a nossa pesquisa: “EDIFÍCIO NECESSITA DE REFORMA GERAL URGENTE, EM ESTADO MUITO RUIM DE CONSERVAÇÃO, ÁREA EXTERNA, ESCADAS, PISO, FACHADA, ALÉM DE DIVERSAS PAREDES COM MUITAS INFILTRAÇÕES.” O Anchieta será leiloado pelo valor inicial de R$ 47.360.000,00, e o leilão online do edifício já está aberto para lances, no site Hasta Vip. Ele está sendo leiloado com os inquilinos dentro. E tem uma observação bem curiosa: não inclui os apartamentos 1001 e 1002. Para o corretor de imóveis Nelson Borges, da Sergio Castro Imóveis, isso pode ser um calcanhar de aquiles para investidores interessados: “Se os apartamentos forem de terceiros, e os outros todos forem vendidos a um investidor, os donos destes 2 apartamentos podem querer valores estratosféricos pelas unidades“.

O mercado imobiliário está em polvorosa, após o sucesso retumbante do empreendimento Ícono Parque, do Opportunity, na própria rua Machado de Assis: “Com o sucesso do Ícono, que foi vendido a preços de metro quadrado expressivos sem ter vista para o mar, os apartamentos no Anchieta poderiam ser vendidos pelo dobro“, diz Borges. Mas se o Anchieta vai a leilão em Fevereiro, a questão dos outros dois prédios está mais avançada.

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Placa comemorativa da homenagem feita ao Padre José de Anchieta pela Santa Casa, na época da construção do edifício Anchieta, na Praia do Flamengo. Foto: Rio – Casas e Prédios Antigos

O prédio da Machado de Assis 17 já foi até arrematado. Tanto que a sua Associação de Moradores tenta, desesperadamente, anular a arrematação do edifício Barth, que foi vendido a R$ 23.940.000,00. Para os moradores, o prédio foi vendido barato demais. Mas o juiz acabou por entender que “a impugnação simplesmente negligencia o estado ruim geral de conservação do prédio, atribuindo valor como se lindo e reformado estivesse, tais como os anúncios juntados de outros edifícios na redondeza“. O magistrado ainda evidencia erro grave dos moradores (ou seus advogados), que sequer teriam juntado um laudo de avaliação de corretor de imóveis para provar o que alegam. E pra piorar, afirma o magistrado que a Associação – apesar de repetidamente dizer no processo que queria comprar o bem – sequer fez uma “proposta concreta viável”. E o juiz termina mandando que seja expedido o mandado de imissão de posse, despejando todos os moradores.

No edifício Nóbrega, na Almirante Tamandaré, aproxima-se semelhante desfecho. O prédio, também já foi a leilão, e foi bem disputado. As empresas RT 120 e MC Consultoria vinham se engalfinhando pela compra do prédio art déco; enquanto a RT 120 afirmava ter proposto R$ 13.700.000,00 à vista e que isso seria melhor do que os R$ 13.605.000,00 parcelados oferecidos pela MC, esta dizia que o lance da RT 120 foi feito tarde demais. A querela, porém, fez com que o juiz Fernando Reis de Abreu, dia 17 de dezembro último, declarasse o leilão nulo, dando um pouco mais de sobrevida à permanência dos moradores, até a realização do próximo leilão. O lance inicial do leilão, realizado a 9 de dezembro, era de R$ 27.000.000,00.

Para Márcio Roiter, presidente do Instituto Art Déco Brasil e especialista renomado neste estilo e época, tratam-se os prédios do “mais expressivo conjunto de edifícios residenciais Art Déco do Rio! Em área de construção apenas igualado ou suplantado por ícones do Art Déco brasileiro como a Central do Brasil e o Edifício Standard (hj IBMEC) no Castelo. Não por coincidência, ambos assinados por Prentice.” Roiter está finalizando a obra da nova sede do Instituto, na rua Pacheco Leão, no Jardim Botânico, e lembra que o Palácio da Cidade também é de autoria do arquiteto escocês.

Os imóveis estão localizados numa das áreas mais nobres do Flamengo, e o desfecho deste imbróglio é muito esperado por todos, ainda mais num momento e que a região mais central da Zona Sul aguarda um grande lançamento, o do Hotel Glória, a ser promovido também pelo Fundo Imobiliário do Opportunity. O projeto Reviver Centro, da prefeitura, tem atraído muitas construtoras e incorporadoras não só para o Centro, como também para seus bairros mais próximos. Deles, o Flamengo é o mais nobre, segundo especialistas.

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5 COMENTÁRIOS

  1. Laudo de avaliação e segurança estrutural dos prédios deve ser feito por engenheiro ou arquiteto com experiência, e não corretor de imóveis como citou o juiz.

  2. Os comentários sobre o empreendimento Icono Parque Flamengo, entregue pelo Opportunity neste segundo semestre, foram feitos por quem não conhece o projeto, pois vários andares tem vista da Baía de Guanabara, Aterro do Flamengo, Pão de Açúcar e Corcovado.
    Além de tudo tem a mais completa infraestrutura de lazer, tecnologia, segurança, sustentabilidade e acessibilidade da região!
    Comprei lá porque sou engenheiro e sei que o bairro não tem outro terreno que permita um projeto desse porte!

  3. Temo ter havido um lapso ao se atribuir a Prentice o projeto da Gare da Central do Brasil, quando, provavelmente, queriam referir-se à Gare Barão de Mauá, da E.F. Leopolfina.
    A da Central do Brasil, que leva o nome de Pedro II, é do Arquiteto brasileiro Magno de Carvalho.

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