Ela andava de ônibus, cansada, tentando ler qualquer livro sem conseguir, perambulando pela cidade, rodando-a, fazendo um enorme círculo: saía de Jacarepaguá, passeava pela orla da Barra, admirava a vista do Elevado, se distraía com as formas geométricas da cidade e retornava pelo centro cortando o subúrbio pela Linha Amarela. O trajeto parecia infindável, e os pensamentos corriam como a paisagem pela janela.
Às vezes algumas coisas simples enchiam-na de felicidade, como no dia em que o homem vendia no ônibus um livro mágico, daqueles que tem uma página de plástico listrada com algumas figuras de animais, e ele os fazia mover rapidamente: um panda corria desesperado, o pinguim executava uma dança exótica, enquanto ele cantava, e todos sorriam sem querer com a brilhante apresentação que o homem fazia do livro. Aparentemente um evento cotidiano, mas cheio de luz, de graça, em um dia de sol atravessando os rostos, aumentando a sensação de encantamento.
A vida tem seus coloridos, mas é tão difícil percebe-lo quando se está imerso em tantas coisas. Andar de ônibus era algo que a fazia esquecer do tempo, dos compromissos, eu a observava de vez em quando, sentada em um café, imersa em qualquer nuvem que cruza o céu antes de criar um temporal inesperado, daqueles que só quem mora no Rio conhece. Fico pensando, talvez assim como a menina que se perdia entre os túneis, vias expressas e praias, que quando o clima muda assim a cidade ficou de mau humor e não avisou a ninguém, já o declarando em suas lágrimas repentinas, para logo depois nos dizer que está tudo bem, com um sol escancarado.
Ela voltou pra casa em um engarrafamento gigantesco, esperando uma surpresa qualquer, como o vendedor inspirado, mas não houve encantamento. Foi mais uma das voltas pra casa.