William Siri: A cegueira seletiva e a proliferação dos lixões informais

Mapeamento de pontos de descarte irregular evidencia problema crônico da cidade

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Lixão na porta de escola municipal da Zona Oeste (Foto: Felipe Ouverney

Segundo a Prefeitura do Rio de Janeiro, todo o lixo da cidade é coletado regularmente pela Comlurb, empresa responsável pela limpeza urbana. Mas ao rodar pela Zona Oeste vemos que a realidade não é bem esta. Não são poucos os pontos em que é possível encontrar destinação irregular de resíduos. Simplesmente não há cuidado com a área mais populosa do município. 

Essa é a conclusão que chegamos a nos deparar com tantos lixões informais. Um descaso que também se aplica na quantidade de vias esburacadas e no sistema ineficiente de transporte, saúde e educação. Falta zelo e respeito com a nossa região. Quando as políticas públicas finalmente chegam, possuem pesos e medidas diferentes do que é posto em prática nos “bairros nobres” da cidade. Enquanto que a Zona Oeste recebe asfalto de menor qualidade, como nós descobrimos e denunciamos, a Zona Sul é recapeada com material superior. Olhando para os lixões a céu aberto, percebemos a mesma desigualdade em relação à coleta. 

No país, todo dia cada um de nós produz cerca de um quilo de lixo, em média (tendendo para um pouco mais). Nesse cálculo entram a casca da fruta favorita, o pacote do biscoito, o saco de arroz e do feijão do almoço, o papel higiênico usado e demais resíduos sólidos que descartamos. Por ano, isso representa cerca de 400 quilos “por cabeça”. Assim, o Brasil gera mais de 79 milhões de toneladas anualmente. 

Olhando para o município do Rio de Janeiro vemos que ele apresenta números diários superiores à média nacional. Aqui, cada habitante produz cerca de 1,6 quilo. Somando os resíduos sólidos domésticos, os públicos, os da construção civil e dos grandes geradores são cerca de 10 toneladas por dia. Não é preciso ser um expert no assunto para saber que, potencialmente, a área mais populosa da cidade tende a produzir mais lixo. 

Em janeiro deste ano, com mais de 10 anos de atraso, foi regulamentada a Política Nacional de Resíduos Sólidos, determinando que nenhuma cidade tenha lixões abertos em 2024. Mas o que poderia ser uma luz no fim do túnel dificilmente será um prazo factível para a Zona Oeste. Tudo o que é recolhido pela Comlurb é encaminhado para o aterro sanitário, mas o problema maior é o que não chega até ela – e que o Poder Público finge que não vê. 

Por isso é tão importante o trabalho de fiscalização por todos os cantos da ZO. No ano passado, coletamos denúncias e conseguimos mapear 51 lixões na nossa região. São pontos que, muitas vezes, começam com o descarte irregular de entulho e, dia após dia, tornam-se um grande problema, virando vetores de doenças e focos de queimadas e de poluição ambiental. Algo que pode ser evitado, conforme o nosso dossiê “Os lixões na Zona Oeste” procura demonstrar. Nele, a partir do diagnóstico do cenário atual, levantamos o papel positivo dos catadores de materiais recicláveis e a necessidade urgente da Prefeitura em desenvolver políticas direcionadas ao tema. Dentre as soluções sugeridas, está a criação de pontos de coleta e mini usinas de reciclagem de entulho. As saídas existem e cabe a nós apontar.

Depois de alguns meses retornamos aos pontos mapeados. Vimos que alguns dos locais chegaram a ser limpos, mas em pouco tempo voltaram a sofrer com o lixo. Essa é a realidade verificada na Estrada do Pedregoso, na Avenida Manuel Caldeira de Alvarenga, na Avenida Cesário de Melo (perto da estação do BRT Ana Gonzaga) e na Avenida Mergulhão, entre outros exemplos que podemos citar. Sem uma mudança na forma como a questão é gerida, esses pontos nunca deixarão de ser locais de descarte irregular. 

Precisamos de uma política de gestão integrada de resíduos, que não se trata apenas de implementar um sistema de coleta domiciliar, como o trabalho realizado pela Comlurb. Ela passa também pela discussão de redução da produção de lixo, políticas de economia circular e fortalecimento da cadeia de reciclagem e dos catadores. Se faz urgente a geração de renda, a melhoria da tecnologia utilizada, a educação ambiental e a fiscalização de pontos clandestinos de descarte visando a sustentabilidade. 

Foi sabendo disso e com a esperança de dias melhores que o nosso mandato entregou o relatório para o subprefeito da Zona Oeste, Diogo Borba, tentando ajudar no enfrentamento do problema. Somente a construção de políticas públicas a respeito trará as soluções definitivas que tanto queremos.

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