Já há algum tempo o controle da gestão do Patrimônio se tornou alvo de cobiça. Cobiça de maus políticos querendo agradar empresários. Cobiça de empresários mais preocupados com seus lucros do que com o bem comum. E cobiça de ideólogos da guerra cultural da extrema-direita, querendo impor a narrativa de um país elitista e excludente.
A tentativa, em 2016, de intervenção em decisão do Iphan por parte do ex-deputado Geddel Vieira talvez não tenha sido a primeira ação desse tipo, mas, sem dúvida, foi um evento de grande magnitude. A resistência do então ministro da Cultura, Marcelo Calero, barrou esse absurdo, que beneficiaria a construção de uma torre de apartamentos de luxo em Salvador. Os vinte e quatro pavimentos do edifício La Vue produziriam terríveis efeitos, danosos à ambiência de bens tombados nas suas proximidades (conjuntos arquitetônicos e paisagísticos situados entre a ladeira da Barra, seguindo da Igreja da Vitória pela orla até a região do Morro do Cristo).
Toda a atenção trazida por este caso não foi suficiente para impedir nova instrumentalização do Iphan. No nefasto governo que acaba de se encerrar, aquele órgão, assim como a gestão da Cultura, foi tomado por pessoas despreparadas, que tinham por intuito desmoralizar o trabalho de várias gerações dedicadas à construção de um ideário e de normas de procedimento para o reconhecimento e a proteção do Patrimônio Cultural brasileiro.
Em maio de 2020, o presidente que se evadiu nomeou Larissa Peixoto Dutra para a presidência do Iphan. Sua nomeação foi contestada na justiça por duas vezes. A primeira por não possuir os requisitos técnicos para o exercício do cargo. E a segunda por ter ficado claro que sua nomeação atendia o interesse de beneficiar uma obra da empresa Havan no Rio Grande do Sul, que havia sido paralisada ao topar com achados arqueológicos.
A nomeação de Larissa provocou mudanças também nas superintendências regionais do Iphan, com a entrada de pessoas igualmente em desacordo com as diretrizes de atuação do órgão. Esse tipo de intervenção é desastroso, pois afasta alguns funcionários mais ativos e desestimula os que permanecem. Não é fácil trabalhar sob chefias que não se guiam por normas técnicas, especialmente na área de Patrimônio.
Não só o Iphan e seus funcionários sofreram. Também nos Estados, onde políticos ligados ao extremismo chegaram ao poder, os órgãos de Patrimônio locais foram vítimas de políticas de terra arrasada. Este foi o caso do Rio de Janeiro após a eleição do ex-governador Witzel. O Inepac foi fortemente afetado, com o afastamento de técnicos com décadas de experiência e respeito granjeado entre seus pares. Também o Conselho Estadual de Tombamento foi alterado, com a dispensa da contribuição de conselheiros de notório saber.
Hoje vivemos um novo momento, em que o Ministério da Cultura foi restabelecido e os ministérios do Meio Ambiente e Direitos Humanos, entre outros, voltam a ter políticas respeitáveis. Esse momento nos faz sonhar com o restabelecimento do respeito à atividade técnica do Iphan e à sua independência frente a interesses empresariais e políticos escusos. Que retornemos aos grandes ideais que levaram à criação do Sphan em 1937, atualizados por tantos debates e pela incorporação de novos conceitos em sua rica existência!
Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.
os interesses vão continuar os mesmos, já q foram nomeados os puxa sacos tb…nada de novo in Brazill