Um avistamento surpreendente na Baía de Guanabara trouxe esperança para a recuperação de um dos ecossistemas mais degradados do Brasil. Em novembro, o polvo-pigmeu foi registrado na área pelo biólogo Ricardo Gomes, diretor do Instituto Mar Urbano (IMU). A descoberta reforça a ideia de que ações de despoluição estão começando a trazer vida de volta ao bioma. A informação é do Estadão.
“A maior surpresa foi mergulhar na Praia do Flamengo, filmar e encontrar um paraíso de tartarugas e dezenas de espécies de peixes e crustáceos”, relembra Gomes. A cena contrasta com o cenário histórico de poluição extrema na Baía. O registro do polvo-pigmeu aconteceu enquanto Gomes documentava um filme sobre economia azul e avistou o pequeno animal sendo retirado por pescadores em uma rede.
Uma espécie bandeira para o ecossistema
Segundo Gomes, o polvo-pigmeu pode ser classificado como uma “espécie bandeira”, usada para representar causas ambientais e incentivar a conservação de um ecossistema inteiro. “Protegê-lo pode proteger todo o ecossistema ao redor”, destaca o biólogo.
Essa não foi a primeira vez que o polvo-pigmeu chamou atenção no Rio de Janeiro. Em 2019, um exemplar foi encontrado dentro de uma lata de cerveja na Praia da Urca, ilustrando como a espécie se adapta ao ambiente poluído. “Ele tem grande habilidade de se esconder em tocas e conchas, mas, devido ao aumento de resíduos sólidos, tem utilizado materiais como garrafas e latas de alumínio como abrigo”, explica Gomes.
Indicativos de melhora na Baía
Embora a presença do polvo-pigmeu esteja associada a melhorias locais, Gomes alerta que isso não significa que a fauna marinha já tenha retornado plenamente. “A água da Baía ainda está longe de um cenário ideal”, ressalta. No entanto, avanços pontuais foram registrados, como a melhoria na balneabilidade da Praia do Flamengo, que, segundo o boletim anual do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), esteve própria para banho durante grande parte de 2024. A Enseada de Botafogo, por outro lado, ainda enfrenta má qualidade da água.
A importância das ações humanas
Entre os fatores que contribuíram para a melhora gradual, Gomes destaca a recuperação de interceptores oceânicos pela concessionária Águas do Rio, que coleta e trata parte dos resíduos antes de serem enviados ao mar. “O interceptor foi construído na década de 70 e nunca havia sido limpo. Sua recuperação impactou diretamente na qualidade da água”, afirma. Com isso, correntes e processos naturais ajudam a renovar metade da água da Baía a cada 12 dias, especialmente nas áreas próximas ao oceano.
Apesar desses avanços, o biólogo enfatiza que o controle do esgoto sem tratamento, resíduos industriais e lixo é fundamental para uma recuperação efetiva. Além disso, fatores como chuvas intensas e queimadas podem influenciar negativamente as condições da água.
Conscientização como pilar da recuperação
Para Gomes, o trabalho de despoluição precisa ir além das ações técnicas e incluir a conscientização da população. “Nosso maior mérito é tocar o coração do carioca”, diz ele. Segundo o biólogo, é essencial que os moradores e frequentadores da Baía desenvolvam um senso de pertencimento ao ecossistema para que iniciativas de conservação sejam sustentáveis.
Além do polvo-pigmeu, outras espécies típicas do bioma, como tartarugas, cavalos-marinhos, raias e peixes, estão sendo avistadas com mais frequência. Esses sinais trazem otimismo, mas também reforçam a necessidade de continuidade e ampliação das ações de preservação.