Bora curtir um cineminha?
Por Natalia Oliveira
O primeiro conselho que eu daria a quem vai assistir ao Quarto de Jack, Room no original e adaptado do livro homônimo de Emma Donogue, é que não leia essa resenha e tampouco assista ao trailer antes de vê-lo.
Para além da questão do spoiler (até porque no trailer está a história inteira, ainda que de forma artificial), o filme surpreende por outros motivos.
Por indicação de um amigo, me entreguei ao filme sem noção nenhuma do que se tratava.
Nada de sinopse, nada de trailer. Não poderia ter feito melhor.
Logo na primeira cena, somos apresentados ao ‘Quarto’ através do seu interlocutor, o pequeno Jack (Jacob Tremblay) que acaba de completar 5 anos.
“Bom dia pia, bom dia armário, bom dia banheira” vai nos apresentando lentamente o pequeno ao cenário que será o ponto de partida da história.
O que se vê a seguir é uma sequência de atos rotineiros praticados por Jack e sua mãe, Joy, interpretada pela incrível Brie Larson (indicada ao Oscar pela personagem) em um ritmo lento e que causa estranheza no telespectador.
Ele não vai a escola? Cadê os telefones? Com um silêncio sepulcral quebrado pelo som da TV e as brincadeiras de Jack, a angústia vai crescendo à medida que os dias passam iguais.
Ao ficar claro que se trata de um cativeiro, a sensação de claustrofobia aumenta e o estômago parece atingido por um soco.
Contrastando com a vitalidade (embora a palidez pela falta de sol seja visível) da criança, Joy exibe a cada cena expressões cada vez mais angustiadas e melancólicas.
Para suportar o enclausuramento e permitir que Jack tenha uma infância “razoável” (se é que podemos aceitar algo como razoável dentro daquela situação), sua mãe o ensina que aquele pequeno quarto é o mundo.
Até o segundo ato, quando finalmente conta a Jack a real situação deles (e quando as lágrimas começaram a rolar descontroladamente), o que era real para o menino era tudo aquilo que ele podia sentir e ver.
Sem saber da existência de outras pessoas, sem ver nada além do que havia no quarto, o mundo era tudo aquilo que estava ao seu alcance.
Falando no segundo ato, esse se configura como o mais tenso do filme.
Aqui, Jacob eleva seu talento à décima potência e vira um monstro na atuação, nível, aliás, que ele mantém durante todo o filme.
O reencontro com a mãe nocauteou os mais mal humorados dos sujeitos e não havia uma alma dentro do cinema que não tenha no mínimo embargado a garganta.
O que se vê a seguir é uma sequência emocionante de reencontros, esperança, novos olhares e até as cenas se abrem e se iluminam.
Os atores Willian H.Macy e Joan Allen que interpretam o avô e avó respectivamente contribuem para o quadro de belas atuações, embora sejam menos que coadjuvantes quase que a maior parte do tempo.
Para visões mais superficiais, a película acabaria no ‘happy end’ e vida que segue, entretanto, é na volta para casa que reside a questão central do filme: a readaptação dos personagens no ceio da normalidade.
É visível o desconforto e a dificuldade de mãe e filho se reintegrarem, no caso dele nascer de novo, ao que parecia ser toda a solução de seus problemas.
Esse ponto é o mais emblemático e genial da história, apesar de arrastado.
Tremblay e Larson encenam as mais belas cenas já vistas nas telonas e a força que vinha dela desde o início do filme é transmitida para a criança na medida em que ela vai se permitindo desmoronar aos poucos diante dele.
Sua fortaleza é desconstruída fora do quarto ao passo que Jack vai se tornando mais forte fora dele.
Os tons de voz vão se tornando mais ríspidos, o ambiente volta a ser claustrofóbico e é quando o filme parece ir se encaminhando para seu final.
Apesar de possuir menos de duas horas de duração, a sensação que se tem é de já estar acompanhando a saga há muito mais tempo, tamanho o envolvimento que se depara o telespectador com a história que de real não tem nada, mas que diante do mundo que se descortina diante dos nossos olhos, não seria nada impossível.
Mais do que uma história sobre sequestro, O quarto de Jack trata de uma questão pouco vista até então: a necessidade e a retomada da felicidade em seu formato mais simples.
Em uma cena Joy chega a contar para o filho como eram bons os momentos na rede tomando sorvete na casa dos pais (lembrança que o garoto busca assim que chega à casa e pergunta da rede e quando se esbalda no sorvete).
Sua dificuldade de sentir alegria e prazer diante daquilo tudo que sonhou durante os 7 anos em que ficou presa é torturante e agonizante.
Ainda que o Quarto tenha sido traumatizante para ambos, eles carregam consigo milhares de representações do lugar que acabou moldando e definindo muito o que se tornaram (Jack principalmente já que nasceu lá dentro).
Prova disso é o retorno que fazem ao local depois de tudo (“ele parece bem menor agora”, exclama o garoto depois de conhecer o verdadeiro mundo).
Talvez você tenha chegado até aqui e partilhe da mesma emoção que eu quando assistir esse que é um dos filmes mais sensíveis dos últimos tempos, e se isso acontecer tenha a certeza que está diante de mais uma obra prima da sétima arte.
Colaboração Bernardo Salgado Rodrigues
Lindo de mais! Não entendi o que aconteceu com o sequestrador, foi preso será, ou fugiu ?