Em meio aos badalos sobre a inauguração da suporta linha 4, faz se necessário uma análise menos acalorada e mais realista da atual situação do metrô. Inaugurado em 1979, o metrô já passou por muitos altos e baixos. Desde 1985 ele acumula mais baixos do que altos e a partir de 2007 a situação tem se agravado. Desde 1985 o metrô tem enfrentado lapsos de investimento, mas pior do que não ter investimento é receber obras de forma equivocada.
O governo do estado, desde 2009, vem promovendo ações que prejudicam a operação do sistema metroviário do Rio de Janeiro. Em 2009 foi inaugurada a Linha 1-A, que é uma alteração ao projeto e uso original do metrô. Tal ligação 1-A, além de reduzir a capacidade do sistema em 70% em relação ao projeto original, deixa o sistema vulnerável. Caso um incidente ocorra em qualquer trecho da linha, todo o sistema para. Essa ligação que coloca os trens da Linha 2 para seguirem até Botafogo, por dentro da Linha 1, cria no sistema metroviário um cruzamento tipo Y, onde o tronco do Y é o trecho Central Botafogo e os braços são os trechos Uruguai – Praça Onze e Pavuna – Cidade Nova. Nos braços do Y a capacidade do metrô é de apenas 30% de seu potencial. No mapa abaixo, podemos ver a configuração atual do sistema de metrô.
No projeto original, a Linha 1 deveria operar com trens de 6 carros (vagões) com intervalos de 90 segundos, o que faria a Linha ser capaz de transportar cerca de 80 mil passageiros/hora/sentido. Já a Linha 2, operaria com trens de 8 carros passando a cada 100 segundos, com capacidade teórica superior a 90 mil passageiros/hora/sentido. Mas, devido a uma série de recentes erros, dentre eles a Linha 1-A, o metrô opera com intervalos altos, na faixa dos 5 minutos, sendo assim oferta capacidade para transportar apenas 24 mil passageiros/hora/sentido, os intervalos além de altos estão irregulares. Mas por que o sistema está com intervalos tão irregulares?
O piloto automático é um item que está presente nos sistemas de metrô mundo afora (São Paulo, Budapest, Nova York, Madrid,Cidade do México, Paris etc…), para dar segurança, regularidade e reduzir os intervalos operacionais, aumentando assim a capacidade da Linha. Porém estamos em 2016 e até hoje não foi implementado o sistema de piloto automático na Linha 2. Essa Linha opera no modo de condução CML (Controle Manual Livre), onde o piloto realiza manualmente as funções de aceleração e frenagem do trem, sem a intervenção de um computador. Isso aumenta a irregularidade da Linha, provocando aquelas paradas incomodas para “ aguardar o trafego a frente”, consequentemente aumentando os intervalos e reduzindo a oferta de lugares para a população.
O recente trecho que foi inaugurado, chamado de “linha 4” não possui o piloto automático, mas o governo do estado afirma que irá instala-lo em breve, porém não deu prazos. Ora, se em décadas de concessão e operação comercial da Linha 2, não instalaram o piloto automático, qual a garantia que teremos piloto automático no trecho entre Ipanema e Jd. Oceânico? Desde 2009 quando foi inaugurado o trecho Cantagalo- General Osório, o governo e a concessionária se eximem da responsabilidade de instalar o piloto automático nesse curto trecho de cerca de 900m. Como passar credibilidade para um trecho de mais de 14 mil metros? Em 2009, com a Linha 1-A ainda fizeram o erro grosseiro de unir as Linhas 1 e 2 no cruzamento em Y da Central. A união da linha 1 (piloto automático) com a Linha 2 (condução manual) aumenta a irregularidade no sistema e a concessionária não consegue cumprir os intervalos de 4 minutos que o governo prometeu em 2009.
O projeto original da linha 4, licitado em 1998 previa uma ligação entre Jardim Oceânico e Botafogo. Posteriormente a isso, a Companhia do Metropolitano (hoje sob o nome de Rio Trilhos) fez um estudo de ligar o terminal Alvorada até a estação Carioca, passando por Gávea- Jd. Botânico- Humaitá – Botafogo e Laranjeiras Vide imagem abaixo:
Em 2010 o governo decidiu alterar o projeto da Linha 4 transformando – o em uma mera extensão da Linha 1. Esse projeto de extensão da Linha 1, que vem sendo chamado de “linha 4” representa mais um erro que vem a se somar com a ligação 1-A. Teremos portando um aumento na demanda, mas não um aumento na capacidade do metrô em receber essa nova demanda. Se hoje as linhas 1 e 2 já operam com uma série de problemas operacionais e superlotação a tendência é piorar. É como se tivéssemos uma sala que já está lotada com 8 pessoas e recebêssemos mais 3 pessoas sem fazer nenhum ajuste para acomodar esse aumento. Em todo lugar do mundo o metrô é feito em rede para distribuir a demanda. Aqui no Rio o governo altera os projetos originais e transforma o metrô num conceito de tripa superlotando todos na mesma linha, vide imagem abaixo com a Linha 1 em Laranja, a Linha 2 em verde e o novo trecho desenhado em amarelo.
Uma das alegações do governo é que estudaram cerca de 36 outros traçados para a ligação com a Barra e esse foi o “mais apropriado”.
Caso realmente o governo tivesse comparado 36 outros traçados, com certeza o traçado atual da “linha 4” não seria adotado. O traçado da Linha 4 proposto em 2002 pelo PDTU e pela própria Rio Trilhos, ligando Alvorada a estação Carioca, passaria por uma série de bairros entre Gávea e Centro, totalizam muito mais passageiros do que o trecho entre Gávea e Leblon. A ligação entre Jd. Oceânico e Carioca seria feita em menos de 20 minutos, o traçado atual o tempo será de 35 minutos. Mesmo o traçado de 1998 entre Gávea e Botafogo, teria mais demanda do que no traçado atual, visto o grande fluxo de passageiros que adentram a estação Botafogo, uma das mais lotadas do sistema metroviário.
Se o governo realmente queria atender a maior parcela possível da população, em áreas densamente povoadas, esse traçado atual da linha 4 jamais teria saído do papel, papel esse que ele nunca esteve, basta ver os mapas de planejamento do metrô do Rio desde 1979.
O trecho de melhor custo benefício seria os 3,7 Km de extensão da Linha 2, conhecido de Lote 29 entre Estácio e Praça XV, via Catumbi, Cruz Vermelha, Carioca (cuja estação da Linha 2 já está pronta e abandonada há mais de 30 anos) e Barcas. Essa finalização da Linha 2 traria ao sistema o acréscimo de mais 400 mil passageiros/dia, possibilitaria a Linha 2 ser desmembrada da Linha 1 e ambas passarem a ofertar 100% de suas capacidades. A Linha 2 poderia utilizar os trens de 8 carros e se integraria com as Barcas na Praça XV. Essa extensão custaria aproximadamente 2 bilhões de reais e já possui as estações Estácio e Carioca prontas.
O segundo trecho de melhor custo benefício seria a Linha 3, ligação Carioca- Guaxindiba. Em 2005 os estudos apontavam demanda de 400 mil passageiros/dia apenas no primeiro ano de operação. Essa Linha passaria por Niterói e São Gonçalo, que juntas possuem mais de 1,5 milhão de habitantes, bem mais do que a população entre Ipanema e Jardim Oceânico, estimada em apenas 335 mil moradores em dados de 2014. O governo sempre vem com a desculpa de que está “estudando a Linha 3”, já disseram que seria BRT, depois monotrilho, até que retornaram para o metrô. A Linha 3 está a 40 anos no papel sendo “estudada”, obviamente a atual gestão soma se a outras passadas e não demonstra interesse em retirar essa linha do papel.
O argumento de que o metrô estaria atendendo as Olimpíadas também não faz sentido. O atual traçado da “linha 4” adotado pelo governo, equivocadamente chamado de “ trecho olímpico”, apenas leva a Linha 1 de Ipanema até o Jardim Oceânico, estação que fica a mais de 10 quilômetros do Parque Olímpico. Se fosse verdadeiro o argumento de que o metrô estaria atendendo as Olimpíadas, teria sido muito mais logico realizar o projeto da Linha 6 (Alvorada- Galeão) do papel, visto que teria uma estação a menos de 3 Km do Parque Olímpico (estação Via Parque) e ainda ligaria o Parque Olímpico ao Aeroporto Internacional.
Vale ainda lembrar que o trecho entre Ipanema e Gávea, faz parte da Linha 1 do metrô, seria, pois, recomendado que a transferência entre as Linhas 1 e 4 fosse dada na estação Gávea (cujas obras estão abandonadas), conforme todos os estudos desde os anos 1980. Colocar os passageiros para baldear na estação General Osório é estar fazendo algo inédito no mundo. Os passageiros terão que baldear para continuar na mesma linha de metrô. Tornando se assim o cumulo do absurdo metroviário. Veja abaixo o mapa com as 6 linhas de metrô projetadas para o Rio e presente no Plano diretor de transportes de 2003:
O metrô é um transporte muito caro para ofertar menos da metade da capacidade no qual ele foi projetado. Se as linhas 1 e 2 operassem conforme o projeto original, o sistema transportaria cerca de 1,5 milhão de passageiros por dia, hoje apenas transporta 800 mil passageiros/dia. O Rio de Janeiro tem a grande vantagem de ser uma cidade não radial e sua configuração geográfica, ao contrário do que muitos pensam, é privilegiada para a instalação do metrô. Com grandes maciços e áreas densamente povoadas, o metrô carioca não precisa de muitas linhas, com apenas 6, grande parte das áreas urbanizadas seria atendidas por um modal de alta capacidade. Infelizmente com a farra dos ônibus BRT´s, tem se instalado na cidade um modal poluidor, de baixa capacidade e baixa velocidade média, agravando assim os problemas de meio ambiente. A quem interessa a redução de capacidade do metrô? Com certeza a população é a grande prejudicada com essas mazelas no transporte público.