Impeachment ou não-impeachment: eis a questão

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Não está fácil ser carioca! Se já não bastassem as inúmeras prisões de governadores e ex-governadores, nosso atual prefeito pode vir a sofrer impeachment dentro de alguns meses. Na última quarta-feira, a minutos do fim do prazo estipulado para defesa, o prefeito Marcelo Crivella apresentou mais de 400 páginas de argumentos no processo de impedimento iniciado pela Câmara no início de abril. Mais um triste capítulo do imbróglio político-administrativo no qual nossos cidade e estado se enfurnaram…

Há quem esteja feliz e esperançoso com a notícia de mais um processo de impeachment. Querem ver o prefeito fora de seu cargo o mais rapidamente possível. Infelizmente, não consigo partilhar do mesmo sentimento. Não sem uma boa dose de ceticismo…

Não se enganem comigo. Não creio que Crivella seja límpido e inocente. Além das inúmeras situações duvidosas que pairam sobre ele, do meu ponto de vista, trata-se do prefeito mais incompetente que tivemos nos últimos anos. Mesmo assim, não consigo deixar de enxergar toda essa pantomima de impeachment como um mero descarte de alguém que, para as forças que operam no legislativo carioca, não é mais conveniente.

Se houvesse alguma moralidade na Câmara, o processo de impedimento já teria sido iniciado nos tempos do escândalo da reserva de vagas para cirurgias oftalmológicas: o famoso caso da “Márcia”. Aquilo, por si só, já era mais que razão para acabar com esse mandato mal-ajambrado. Contudo, à época, Crivella dispunha (ainda) de uma aliança de parlamentares que ainda conseguia sustentá-lo. Hoje, não mais.

É aí que reside o problema. Assim como o impeachment de Dilma, o que ocorre com Crivella decorre, muito mais de falta de apoio político que – necessariamente – de elevados instintos morais por parte da maioria dos legisladores. A lamentável política do Rio de Janeiro tem mostrado, claramente, que políticos corruptos podem permanecer por longos períodos no comando do Executivo, desde que tenham o amparo de uma máfia de legisladores que os sustente. Tornam-se intocáveis. Só são removidos quando, finalmente, uma ordem de prisão é expedida contra os mesmos.

E é por isso que não há o que se comemorar. Na atual conjuntura, governantes só caem porque seus compadres do legislativo assim o querem. Se não o quiserem, permanecem no poder, não importa o quanto são ineficientes ou corruptos. A recente onda de impeachments demonstra que estamos caminhando para um parlamentarismo torto. Quando o Legislativo não quer, o(a) chefe do Executivo cai. Entretanto, não tenho segurança em dizer que, para a maioria dos votantes a favor do impedimento, há uma real perda de confiança no(a) chefe do Executivo. Trata-se mais, digamos, de uma perda de apoio, ou de uma perda de favorecimentos.

A solução, como sempre, passa pela conscientização do povo sobre quem está elegendo para as casas legislativas. As intermináveis discussões na TV Câmara demonstram que boa parte dos nossos legisladores aparenta não ter a mínima noção do que se presta a fazer ali. Fica difícil acreditar numa real mudança de governo caso o prefeito caia quando o nível de seus algozes, em média, é de fraco para ruim.

Sinto que estamos, com ou sem Crivella, à deriva. E essa é uma sensação muito ruim para se ter.

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Luiz Coelho é planejador urbano, sacerdote anglicano e artista visual. Tem formação em Engenharia Cartográfica (IME), mestrado em Informática (UFAM) e é doutorando em Planejamento Urbano e Regional (UFRJ). Também é formado em Teologia pelo SETEK, com doutorado em liturgia por Sewanee: the University of the South. É servidor público municipal, atualmente lotado no Instituto Pereira Passos e serve a Paróquia Anglicana São Lucas, em Copacabana. É membro filiado ao PSOL.

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