Alberto Gallo: Festa da democracia

Neste domingo o Brasil foi as urnas, para eleger seu presidente, governadores e representantes no senado, câmara dos deputados e assembleia legislativa. É uma forma do cidadão indicar que tipo de país deseja para o futuro

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Neste domingo o Brasil foi as urnas, para eleger seu presidente, governadores e representantes no senado, câmara dos deputados e assembleia legislativa. É uma forma do cidadão indicar que tipo de país deseja para o futuro.

No último domingo, 02 de outubro vivemos a festa da democracia. É assim chamada, pois há uma igualdade neste dia em que todo cidadão eleitor possui exatamente o mesmo valor, caracterizado por seu voto. Assim o jovem estudante, a mulher idosa, o pobre e o milionário, e todos os demais eleitores possuem exatamente o mesmo poder de escolher seus representantes.

Foi uma eleição bastante disputada à nível de presidente, com uma divisão entre os projetos de esquerda e direita. E é importante que com a possibilidade de segundo turno, abre-se um tempo para uma discussão mais aprofundada das proposições de cada candidato e que esse debate possa acontecer em alto nível. Que a visão de futuro, os planos e propostas reais possam ser discutidos com a sociedade e que evitemos o caminho populista que transforma tudo em narrativas, acusações sensacionalistas e xingamentos que desqualificam as pessoas ao se chamarem de burros vermelhos da mortadela ou minions fundamentalistas.

O primeiro fundamento da democracia é respeitar quem pensa diferente, e entender que o exercício do poder deve ser cíclico, com diferentes grupos se alternando dentro de uma regra que permite e incentiva esse movimento. A perpetuidade do poder de um mesmo grupo, como acontece em alguns países vizinhos, como Cuba, Venezuela e Nicarágua é o primeiro sinal de ausência de democracia é prova do desvirtuamento dos chamados “governos populares”.

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O ambiente democrático, proporciona garantias individuais, mas exige participação e alternância do poder. E o voto direto é uma das formas com a qual o cidadão, de forma igualitária, pode se manifestar democraticamente. Essa igualdade, pelo menos em tese é consagrada na Constituição brasileira, onde está explicito que o voto de uma pessoa não pode ter valor superior ao de outra, conforme no Capitulo IV, Título II quando fala dos Direitos e das Garantias Individuais. No Art. 14 temos: “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e nos termos da lei” . Mas na prática o modelo político brasileiro é um Frankstein, construído por uma elite, com objetivo de perpetuação no poder das mesmas famílias e oligarquias regionais.

A democracia brasileira, que emergiu da constituição de 1988 é uma jovem senhora, que vai se embelezando com o passar dos anos e eleições. É um aprendizado da sociedade, que não deve temer alguns cortes. A reforma política é urgente, para corrigir alguns desvios e vícios do sistema eleitoral, e como já vimos, essa reforma não pode ser conduzida pela classe política apenas. É preciso uma reforma constitucional à partir de uma comissão de notáveis, escolhida e indicada pela sociedade civil e com membros eleitos. Uma mini constituinte, para propor melhorias na carta magna e que posteriormente seriam aprovadas pelos congressistas. São muitos temas que devem ser discutidos, por exemplo:

A proliferação de partidos e siglas, alguns que tem por objetivo receber o fundo eleitoral e participar de coligações e alianças que rendam acesso à cargos na administração pública. A legislação é muito permissiva, é como colocar as raposas para tomar conta do galinheiro, permitir que os políticos determinem as regras do fundo eleitoral e da regulação dos partidos, que resulta na manutenção dos caciques regionais, alianças espúrias de partidos sem cunho ideológico ou doutrinário. O mandato deveria ser vinculado a um contrato onde a população e seu candidato mantém um compromisso com cláusulas e princípios. E ao contrário, o que vemos é que após eleitos, muitos parlamentares ou governantes alternam suas posturas e bandeiras, fazendo alianças justamente com as correntes contrárias às de seus eleitores e base de apoio.


A real equivalência dos votos, já que no sistema proporcional vigente o voto na legenda ou no partido arrasta um coeficiente que garante um número de cadeiras para cada estado. Dessa forma muitos candidatos bem votados acabam não conseguindo a vaga e para outros com votações menores, porém em legendas mais expressivas. Nesse modelo há o vício de se atrair pessoas famosas com alta popularidade e puxadores de votos. Também surge uma diferença do poder de voto entre estados da federação. Então em unidades mais populosas como São Paulo ou Minas Gerais, o número de votos para eleição de um deputado é muito maior do que em estados Menores como Acre e Amapá.


Do sistema majoritário, utilizado para eleição de governadores, prefeitos e senadores, quando as alianças permitem um diferente acesso ao tempo de TV ou de verbas, do modelo de eleição em dois turnos e do risco de polarização e voto útil, que acabam por reduzir o debate ao mecanismo messiânico populista e da escolha do “menos pior”.


Da evolução do congresso nacional, como mecanismo bicameral. De um lado os deputados que são representantes do povo e que devem ter um vínculo direto de confiança, como dissemos, de serem representantes de um conjunto de princípios e compromissos com a sua base. A partir do momento que determinado deputado deixa de defender aqueles compromissos, deveria então entregar sua cadeira para sua comarca e ser substituído. Ou seja, uma vinculação partidária e ideológica. Esse instituto merece ser discutido e evoluir, dentro do modelo de voto distrital, pois na atual legislatura que ora termina é possível identificar centenas de congressistas que orienta sua atuação conforme as conveniências momentâneas. Inclusive com a mudança radical de cores e discursos.


Dos mecanismos de defesa da democracia e equilíbrio dos poderes, já que nos tempos recentes vimos tantos abusos do judiciário e a covardia dos senadores que deveriam em tese ser o freio das interferências do judiciário.


Da criação de distritos eleitorais e administrativos que vinculem os parlamentares através de mecanismos de governança, prestação de contas e comprometimento com as pautas pactuadas com eleitores. Inclusive com a vacância da cadeira em caso de um voto de desconfiança dos eleitores.


O sistema de governo, que inclusive foi objeto de plebiscito, se parlamentar ou presidencialista e que inclusive em palestras no exterior, algumas autoridades supremas declaram, de forma meio golpista, que já vivemos um semi-presidencialismo. Essa discussão é importante como parte do amadurecimento democrático e sem medo de revisitar o sistema de governo se republicano ou monarquia. Pode parecer retrógrado falar em monarquia, mas no último mês, todo o mundo voltou sua atenção para Reino Unido, quando da morte da Rainha Elizabeth. E a sucessão da coroa, demonstra como a monarquia naquele país convive com uma moderna democracia participativa.


De mecanismos que possam proteger os eleitores e sem retirar as liberdades dos candidatos quanto aos formatos de campanha e das fake news. Também da governança dos institutos de pesquisa, que seguidamente divulgam pesquisas manipuladas e com forte viés de influenciar o eleitorado. Tradicionais institutos como Data Folha, IPEC (Ibobe) entre demonstraram no dia de ontem ou uma grande incompetência ou uma desonestidade conceitual.

Finalmente é sempre importante festejar o voto e a possibilidade de evoluirmos nesse processo. O Brasil não pertence à tribo verde-amarela ou ao clã estrela-vermelha. O país é de todos os brasileiros e só vamos avançar na marcha para desenvolvimento e no combate às desigualdades se tivermos unidade e tolerância. Não podemos deixar que a radicalização e debates desqualificados que “rache” o país. Que esse tempo de segundo turno possa ser aproveitado para que todos entendam e identifiquem o que diferencia as duas propostas apresentadas na mesa. E que a escolha se construa com serenidade e que prevaleça o bem comum, o estado de direito e não a ilusão do populismo e da impunidade.

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