Alvaro Tallarico: Tempestade, falta de luz e poesia em Paraty

Chuva, vento e as histórias da FLIP 2023

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Sarau Corujão da Poesia na Casa da Utopia
Sarau Corujão da Poesia na Casa da Utopia (foto: Alvaro Tallarico)

A Festa Literária Internacional de Paraty, a famosa FLIP, acontece de 22 a 26 de novembro de 2023. Cheguei na quarta, dia 22, e ainda arrumavam as coisas as tantas casas de editoras e afins. Peguei algumas programações e anotei o que gostaria de ver. São muitas rodas de conversa sobre literatura, artes, música e tudo mais onde a palavra é a heroína. É viciante esse evento. Tem uma efervescência cultural única. Já foi mais elitista, mas não conheci nessa época. Hoje em dia há toda uma alternatividade, muito simbolizada pela FLIPEI, a área dos independentes, e locais especiais e mágicos como a Casa Poéticas Negras.

Na quarta, o sol era quente e o suor escorria pelo meu corpo enquanto caminhava nas difíceis ruas de pedras. Aqueles que arriscam saltos altos sofrem, e correm perigo real de vida. Eu estava com meu chinelo clássico. Porém, a previsão era de chuva, que chegou na quinta-feira com força a partir da tarde. Antes da água descer com vontade, almocei num a quilo e encontrei, sem querer querendo, um local que buscava desde o dia anterior: a Casa Poéticas Negras. Fui recebido por um ambiente cheio e pulsante, com crianças, artes africanas, vestimentas étnicas e a descoberta de uma feijoada vegana que provaria horas depois. Acontecia a conversa “Infância e vivências afroreferenciadas” com Sidnei Nogueira (lançamento do livro “Menina dos cabelos d’água”), Luciana Itanifè (ilustradora) e Priscila Obaci (lançamento “Xirezinho – brincando com a natureza”). As falas de Sidnei e seu livro que bebe direto na tradição da oralidade emocionaram.

Em seguida, tive uma aula incrível através do escritor Amauri Queiroz em um bate-papo cujo tema era “Educação, literatura e cultura para uma sociedade mais inclusiva”. Ele explicou como Tiradentes foi algo inventado e como nos falta uma educação de História mais apurada, em especial sobre a escravidão, a independência e o legado que nos restou. Ao seu lado, o poeta baiano Nelson Maca invocava orixás com rimas precisas, enquanto Iya Marta Sales trazia uma aura pacífica. Contudo, a chuva ainda iria piorar e traria problemas para a cidade.

Oyá

Conversei com Amauri e Nelson e saí com seus respectivos livros autografados. Com o passar do tempo, e o não passar da chuva, resolvi experimentar a feijoada vegana. 35 reais bem gastos. Veio muita comida, caprichada e saborosa. Foi então que finalmente, rolou uma trégua do céu e voltei para a minha caminhada. Encontrei a Casa Urutau e troquei algumas palavras em inglês com uma indiana, que, assim como eu, buscava opções vegetarianas e veganas para comer. E acabei esbarrando com João Luis de Souza, o responsável pelo famoso Corujão da Poesia, sarau presencial e online que divulga poetas, liberta livros e salva vidas. Ele procurava a Casa Utopia. Peguei o celular, achei, e fomos juntos. Ele me disse que faria um sarau às 19h30.

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Foi nesse momento que tudo ficou escuro. A cidade se apagou. A chuva apertava e a luz se acabava. Começaram a reclamar da ENEL, empresa que fornece luz para Paraty e outras localidades. Pouco tempo depois deram a previsão que voltaria somente em três horas. Melhor cancelar, né? Toda a programação da noite fora afetada. Mas João disse que o Sarau tinha que acontecer. O jovem Bernard arrumou duas velas, todos se reuniram, tendo João sentado no centro como um rei, um mestre de cerimônias, um griô.

Ali conheci Ana Chagas, que lançará o livro “Passeio no Méier”; Marques e Marina, que estão a frente da Casa Utopia em Niterói, realizando vários eventos culturais; Sady Bianchin, o qual fez declamações impressionantes; os poetas das ruas André Luiz Bentes e Sérgio Rica Poeta; Thássio Ferreira, da Casa Queer. Ah, a atriz Marcela também deu seu show, assim como outros que não lembro o nome agora.

Declamei a letra da canção “Preto de Azul” e ouvi poemas diversos e intensos. Conheci vidas e vivências, ouvi sabedorias. A graça da FLIP é exatamente esse tipo de confluência que acontece através do destino e dos corajosos poetas do cotidiano, os amantes da arte, detentores das palavras, adoradores da literatura.

Ao redor das velas, perto de um beco, com cara de viela, foi uma noite feliz e utópica, como um sonho bem vivido, potentemente dito. Literariamente bendito.

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