Antônio Mariano: Crise Fiscal do Rio de Janeiro: de quem é a culpa?

O cientista político Antônio Mariano cita um embate entre os renomados intelectuais Marcos Lisboa e Mauro Osório sobre quem é culpado da crise Fiscal do Rio de Janeiro

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Trecho da Avenida Rio Branco, na região central do Rio de Janeiro - Foto Cleomir Tavares/Diario do Rio

Recentemente, um artigo de Marcos Lisboa[1] renomado economista do INSPER, apontou que a crise do Rio de Janeiro perdura por conta da falta de responsabilidade do Governo do Estado em manter as suas contas. Historicamente, diz Lisboa, foram concedidos benefícios fiscais, aumentou-se o gasto da máquina pública e antecipou-se receita até que a conta chegou.

Após o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), mesmo com seus diversos benefícios, o Governo não quis cumprir com suas obrigações e, por isso, continua em crise. Como exemplo, ele aponta que a ALERJ aprovou Lei permitindo que o Estado não precise cumprir a Lei Complementar 178, sobre limites de despesas com pessoal. Outro ponto elencado, é o não pagamento da dívida com a União relativo ao empréstimo com o banco BNP Paribas, dentre outros.

Pois bem, por outro lado, estimulando um saudável debate sobre este cenário, encontra-se Mauro Osório, outro respeitado economista especialista em economia fluminense, que por anos foi Presidente do Instituto Pereira Passos e atualmente é Chefe da Assessoria Fiscal da ALERJ. Desde o início, Osório diz que a crise pela qual passamos, não é pelo que Lisboa diz, mas, basicamente, por fatores alheios à nossa vontade.

Para ele, a raiz está na mudança da capital para Brasília, sem que o Rio de Janeiro tivesse a devida compensação financeira por isso, após o seu contínuo esvaziamento. Para além, em 2015, com a abrupta queda do preço do barril do petróleo, o estado perde consideravelmente seus royalties, da exploração desta commodity. Portanto, a crise não é por conta dos gastos, mas sim da queda de receita[2].

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Arrisco um julgamento em que ambos estão corretos. E ambos estão equivocados.

Em 2014, a Lei Orçamentária Anual (LOA)[3], apontava uma receita bruta de R$ 77 bilhões e uma despesa de aproximadamente R$ 77 bilhões. Já na LOA de 2021[4], prevê-se uma receita líquida de R$ 69 bilhões e uma despesa de R$ 89,5 bilhões, ou seja, um déficit de aproximadamente R$ 20 bilhões. Há 3 anos, em 2018, apontava-se um déficit de R$ 10 bilhões para 2019[5]. Para 2022, a LDO já aponta um déficit de R$ 21 bilhões[6]. No meio de todos estes números, é possível ver claramente um descalabro das contas públicas.

Enquanto Lisboa diz que o Estado do Rio de Janeiro continua concedendo aumentos salariais – vide os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado – além de também benefícios fiscais, o que significa renunciar a receita, Osório aponta que em junho de 2014 o barril do petróleo custava US$ 108,37 e em janeiro de 2016, apenas US$ 29,78. Uma diferença de US$ 78,59, em apenas um ano e meio, para o maior produtor de petróleo do país. Hoje, o preço do barril está em US$ 75,81, possibilitando um aumento considerável de receita, mas ainda aquém do necessário e do visto anteriormente.[7]

De fato, o Estado do Rio de Janeiro sofreu um dos maiores – se não o maior – baque na história de seu orçamento, em meio a preparativos para as Olimpíadas de 2016 e após um pleno período de desenvolvimento econômico, pouco antes visto. A queda de receita, volta e meia, é responsável por distintas crises econômicas que assolam as mais variadas economias ao largo dos países, estados e municípios.

Todavia, quando é o caso de uma queda de receita, infelizmente, medidas de cortes são necessárias. E neste caso, o Estado do Rio de Janeiro tem aplicado pouco esta receita. Ainda possuímos inúmeras empresas estatais que, no bom português, são inúteis e apenas consomem uma parte considerável do orçamento. Em maio de 2020, o jornal Valor Econômico mostrou que o estado gasta aproximadamente R$ 1,6 bilhão em 14 estatais, dentre elas, por exemplo, a Companhia de Armazéns e Silos do Estado do Rio de Janeiro (CASERJ)[8]. Em paralelo, não se sabe apontar quais gastos são, de fato, eficientes e que retornam para a sociedade. Não há um planejamento adequado e, muito disso, é reflexo da constante troca de gestores, não havendo uma continuidade nas políticas públicas.

Outro ponto de suma importância é a falta de investimentos em nossa região, como apontado por Osório, no caso da Petrobras. Mais de 80% de seus fornecedores, estão fora do Rio de Janeiro. Por quais razões o Governo não investe na reversão deste cenário? Hoje vivemos um cenário de perda de indústrias e sedes de importantes empresas para outros estados, principalmente São Paulo. Quando alguém decide instalar uma nova indústria no Rio de Janeiro, soltam-se fogos, algo que para o estado vizinho, é quase uma cena cotidiana.

A verdade é que a União, desde a transferência da capital para Brasília e o esvaziamento do Rio de Janeiro, não se importa com o nosso desenvolvimento, deixando-nos ao relento. O RRF é quase um favor que nos foi concedido.

Por outro lado, o governo fluminense, historicamente, não sabe cortar gastos, pelo contrário. Para manter a máquina funcionando, seja ela qual for, condessem-se benesses indiscriminadamente. Cortar na carne é algo quase impensável, um pecado capital.

Desse jeito, vamos continuar dependendo da sorte e da boa vontade do mercado externo, sempre apontando culpas e culpados. A coragem para vencer esta barreira é difícil de encontrar, mas é necessária. Caso contrário, seremos sempre o patinho feio da história, seja pelo motivo que for.


[1] https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcos-lisboa/2021/07/pendura-a-conta.shtml (Acessado em 10 de julho de 2021)

[2] https://odia.ig.com.br/colunas/sidney-rezende/2021/02/6084594-as-raizes-da-decadencia-do-estado-do-rio-de-janeiro.html (Acessado em 10 de julho de 2021)

[3] http://www.fazenda.rj.gov.br/sefaz/content/conn/UCMServer/uuid/dDocName%3aWCC191657 (Acessado em 10 de julho de 2021)

[4] http://www.fazenda.rj.gov.br/sefaz/content/conn/UCMServer/uuid/dDocName%3aWCC42000015879 (Acessado em 10 de julho de 2021)

[5] https://oglobo.globo.com/brasil/futuro-governador-do-rio-vai-enfrentar-deficit-de-10-bilhoes-23016821 (Acessado em 10 de julho de 2021)

[6] https://agenciabrasil.ebc.com.br/radioagencia-nacional/politica/audio/2021-06/no-rio-alerj-aprova-ldo-de-2022-com-deficit-de-r-21-bilhoes (Acessado em 10 de julho de 2021)

[7] https://www.indexmundi.com/pt/pre%C3%A7os-de-mercado/?mercadoria=petr%C3%B3leo-bruto&meses=300 (Acessado em 10 de julho de 2021)

[8] https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/05/20/rio-gasta-r-16-bilhao-em-tres-anos-para-manter-grupo-de-14-estatais.ghtml (Acessado em 10 de julho de 2021)

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2 COMENTÁRIOS

  1. Vocês estão errados.

    A decadência da Cidade do Rio de Janeiro foi por causa da fusão.

    A fusão foi uma questão política na época.

    O estado da Guanabara era riquíssimo.

    O Estado do Rio de janeiro (capital Niterói era muito pobre)

    O empobrecimento da cidade do Rio de Janeiro foi causa da fusão.

    Se hoje em dia eles continuassem separados o Estado do Rio de Janeiro (Capital Niterói) seria muito rico.

    Tem gente que fala e comprova que se mantivessem o antigo modelo os Estados mais ricos do Brasil seriam.

    1°) Estado de São Paulo
    2°) Estado do Rio de Janeiro
    3°) Estado de Minas Gerais
    4°) Estado da Guanabara

    Isto porque o Estado do Rio de Janeiro (Capital Niterói) tinha muito petróleo,mas que não era explorado.

    A União do estado do Rio de Janeiro com estado da Guanabara foi ideia do Golbery,Geisel e Figueiredo.

    Isto acabou beneficiando a abertura política,mas acabou prejudicando estes dois Estados.

    O Golbery no fim da vida dele,confirmou isto.

    Foi um modo de enfraquecer a linha dura das forças armadas,que eram contra a abertura.

  2. Sou muito mais Lisboa que esse Osório. Culpar a saída da capital daqui até tem um sentido lá atrás – mas pombas! Já se passaram 50 anos!! Uma vida! Outra, culpar os royalties do petróleo caindo é uma cretinice: quem tem renda variável não pode se comprometer com custos fixos – neste ponto o Sr. Osório pode ser especialista em economia fluminense, mas uma dona de casa das mais humildes dá-lhe um banho, porque ela sabe disso muito bem e não gasta mais do que ganha. O Governo do Estado entupiu a máquina com servidores públicos e reservou a renda do petróleo para pagar o déficit dos aposentados – ambas despesas certas e fixas. Quando o petróleo caiu, dinheiro de outras coisas teve de ser remanejado para pagar essa gente toda. É um ralo de dinheiro em troca de um serviço porco que recebemos do funcionalismo.

    Até que possamos DEMITIR funcionário público, o Governo do Estado vai continuar de pires na mão. A grossa parte de seus recursos vira salário, não investimento. Por isso que entra governo e sai governo, nada “novo” vemos acontecer: o governo virou uma máquina que trata dele mesmo.

    Sobre os incentivos fiscais, o Sr. Osório em geral tem razão – só não dou 100% de razão porque tem que separar os casos em que não haveria os empreendimentos caso o incentivo não fosse dado.

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