Antonio Sá – Críticas a PL do poder executivo sobre o Programa Gerando o Futuro

Colunista do DIÁRIO DO RIO opina sobre o Projeto de Lei que prevê apoio às gestantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica

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Sede da Prefeitura do Rio de Janeiro - Foto Cleomir Tavares/Diário do Rio

Tenho criticado alguns Projetos de Lei – PLs do Poder Executivo do Município do Rio de Janeiro, no atual governo, que desrespeitam a Constituição Federal e/ou que são escritos com erros. Parece que entregam esses PLs para o senhor Prefeito os assinar sem que se faça uma análise e revisão de seus textos, infelizmente.

Desta feita, vou criticar o PL nº 2126/2023, que “INSTITUI O PROGRAMA GERANDO O FUTURO, DE APOIO ÀS GESTANTES EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIOECONÔMICA”, e que está na Ordem do Dia de votação da Câmara Municipal do Rio de Janeiro – CMRJ desta semana.

As críticas não serão quanto a seu mérito, que é relevante, mas sim quanto a sua forma.

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Inicialmente, é bom destaca que não é necessário o Poder Executivo fazer um PL sobre o assunto, pois o escopo desse PL envolve atividades que já são ou que podem ser realizadas pela Prefeitura dentro de seus já existentes programas de trabalho. Vide abaixo as premissas desse programa, segundo seu artigo 2º:

I – promover a cidadania de gestantes em situação de vulnerabilidade;

II – prover conhecimento e fomentar o acesso a direitos;

III – fornecer apoio às gestantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica, por meio de um acompanhamento direto e multidisciplinar;

IV – fortalecimento das famílias, com orientações voltadas para a prevenção das diversas formas de violência doméstica e familiar;

V – incentivar o planejamento de vida da gestante; e

VI – fomentar a inserção ou reinserção da gestante no mercado de trabalho.

Podemos perceber que um simples decreto realocando aquelas atividades acima poderia, salvo melhor juízo, implementar rapidamente este programa.

É inacreditável, considerando a importância da assistência às gestantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica, que a Prefeitura, em vez de já colocar em prática esse programa, fique esperando mais de 4 meses para o implementar.

Na CMRJ, comenta-se que essa “espera” é para se ter uma Lei sobre o assunto para que algum(a) dirigente municipal a possa usar na sua propaganda eleitoral nas próximas eleições. Será ? Espero que não seja esse o motivo para a não implantação já do importante programa em apreço, pois seria muita maldade com nossas gestantes.

No artigo 3° do PL sob análise, temos que, para fazer jus aos benefícios oriundos do programa sob análise, a beneficiária deverá, cumulativamente, se enquadrar nos seguintes critérios:

I – estar gestante;

II – comprovar residência na Cidade do Rio de Janeiro;

III – possuir faixa etária igual ou maior a quinze anos;

IV – estar em situação de vulnerabilidade socioeconômica, de acordo com critérios estabelecidos em ato normativo editado pelo Poder Executivo;

V – estar assistida no âmbito do Projeto Cegonha Carioca, instituído no âmbito do Município do Rio de Janeiro;

VI – ter disponibilidade para comparecimento às aulas do programa.

Lendo o inciso III acima, podemos perceber que quem redigiu esse PL não entende muito da matéria.

Limitar o atendimento a gestantes na faixa etária igual ou maior a quinze anos, demonstra uma insensibilidade total para com as gestantes de dez a quatorze anos, 11 meses e 29 dias.

Segundo dados publicados pelo Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos do Sistema Único de Saúde, em 2019, foram quase 420 mil nascimentos de filhos de mães adolescentes (14,7% do total dos partos). Em 2020, foram 380.780 (14% dos partos), e quase 18 mil deles em garotas de 10 a 14 anos !!!!!!

Ainda de acordo com o Sinasc, 1043 adolescentes se tornam mães no Brasil a cada dia, sendo 44 delas a cada hora e sendo que, destas 44, duas delas têm menos de 15 anos.

É uma desumanidade o senhor Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro se recusar a atender, no programa sob apreço, as meninas mais novas, de 10 a 14 anos, que respondem a quase 5% dos partos em adolescentes, embora elas talvez sejam as que mais necessitem de suporte do município para lidar com suas gravidezes.

Limitar o atendimento nesse programa, a quem comprovar residência na Cidade do Rio de Janeiro, segundo o inciso II acima, é desnecessário, pois já existe a exigência do inciso V de estar a gestante assistida no âmbito do Projeto Cegonha Carioca. Logo, bastaria fazer esta exigência do inciso V e excluir a exigência do inciso II.

A exclusão do inciso II se torna relevante porque sabemos que algumas grávidas têm seus pré-natais e partos realizados em nosso município e usufruem do Cegonha Carioca, porque aqui trabalham, porque têm família aqui ou porque moram na realidade na fronteira de nosso município.

Assim sendo, o que é importante mesmo para usufruir do programa sob análise deveria ser que as gestantes estejam sendo assistidas no âmbito do Projeto Cegonha Carioca, instituído no âmbito do Município do Rio de Janeiro.

Por fim, considerando que estamos tratando também de gestantes de adolescentes, é inacreditável ver que o Prefeito “esqueceu” de colocar como premissa do programa, no art. 3°do PL sob análise, o seguinte:

“VII –  assegurar à aluna gestante ou lactante acesso à educação básica, profissional, superior e especial.”

Quem efetivamente defende as adolescentes grávidas deveria conhecer os dados da Síntese de Indicadores Sociais 2020, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, segundo os quais cerca de metade dos jovens de 15 a 29 anos de idade não estudam e não concluíram o ensino superior.
Entre as mulheres, 11,8 % apontam a gravidez como o principal motivo que as levou a parar de frequentar a escola. Já entre as mulheres pretas ou pardas, esse número chega a 13,1 %. Adicionalmente, 6,5 % das mulheres afirmam que o principal motivo para deixar a escola foi a necessidade de realizar afazeres domésticos ou cuidar de criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência.
Antônio Sá

Fiscal de Rendas aposentado do Município do Rio de Janeiro, Ex- Subsecretário de Assuntos Legislativos e Parlamentares do Município do Rio de Janeiro Bacharel em Direito e Economia.

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