Antônio Sá: Votação da reforma tributária – ação para lamentar e não parlamentar

Colunista do DIÁRIO DO RIO fala sobre a inexistência da Redação Final aprovada e do texto aprovado que deveria ter sido encaminhado pela Câmara Federal ao Senado Federal, da PEC da chamada Reforma Tributária

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Foto: Divulgação

Incrível como a mídia e os juristas ainda não estão reclamando quanto à inexistência, até agora, nos sítios da Câmara Federal e do Senado Federal, respectivamente, da Redação Final aprovada no último dia 7 de julho e do texto aprovado que deveria ter sido encaminhado pela Câmara Federal ao Senado Federal, da PEC da chamada Reforma Tributária.

Na Câmara Federal, não temos disponível o texto daquela Redação Final nas partes de “Documentos Anexos e Referenciados” e de “Tramitação” na página.      

Já, no Senado, quando procuramos a informação sobre a PEC n° 45/2019, da Reforma Tributária,  ficamos sabendo que ainda estamos  “Aguardando Envio ao Senado Federal”. Veja isso clicando aqui.

Ou seja, mais de 10 dias depois da aprovação da Reforma Tributária, não temos ainda o texto oficial final dela que será votado no Senado !!!

Fala sério. A competente assessoria da Câmara Federal não deixaria nunca isso acontecer.

Será que o Parlamento e o Governo Federal estão ainda fazendo acertos no texto “aprovado” ? Pode isso, Arnaldo ?

Para ver o absurdo que foi a votação da Reforma Tributária, lembro que a “última versão” da Reforma Tributária, a Emenda Aglutinativa de Plenário nº 1,  foi apresentada  no dia 6/7, às 21:43: h, teve o início de sua votação às  22:25 h e o encerramento dessa  votação foi às 22:39 h !!!!

Ah, coloquei a expressão “última versão” entre aspas porque até hoje, inacreditavelmente, como comentei, não temos na Câmara e nem no Senado disponível a Redação Final da PEC da Reforma Tributária que teria sido aprovada no dia  7/7.

Ou seja, em menos de uma hora,  os Deputados Federais conheceram e leram  o texto daquela emenda aglutinativa, que tinha 36 páginas, e a votaram….

Incrível a capacidade de leitura e análise daqueles parlamentares em menos de uma hora de um enorme texto de emenda aglutinativa no qual descobriu-se depois que estava com alguns  jabutis que beneficiavam determinados e poderosos setores da sociedade.

“Jabuti” na política é um “contrabando” que os parlamentares fazem ao inserir sorrateiramente em um projeto um assunto sem muita discussão que nada tem a ver ou até é contraditório com o objetivo do projeto.

O termo vem de uma frase atribuída ao ex-presidente da Câmara dos Deputados, Ulysses Guimarães, que dizia que “jabuti não sobe em árvore. Se está lá, ou foi enchente ou foi mão de gente”.

É, infelizmente, esse é o nível de  nosso Parlamento.

Felizmente, no entanto, começam a serem destacadas agora pela mídia as críticas às incongruências do que foi aprovado.

Ressalte-se que essas críticas foram feitas antes, mas não foram consideradas pelos parlamentares e pelo governo federal, nesta época de governantes e parlamentares Tik Tokers, mais interessados em discursos de marketing e não em eficácia para a população de suas decisões,

Dentre aquelas críticas, temos as seguintes:

  1. Falta a definição do mecanismo de alocação da receita do novo imposto IBS dos Estados e municípios exportadores líquidos para os Estados e municípios consumidores, bem como a alíquota necessária do IBS;
  2. Temos uma lista enorme de exceções à tributação uniforme, beneficiando setores segundo critérios políticos e de influência junto ao governo e ao parlamento e não segundo critérios técnicos;
  3. Dentre os setores a serem beneficiados, teremos a nova imunidade para entidades religiosas e não mais somente para templos de qualquer culto como é hoje. Ou seja, vai se criar uma forma de elisão tributária para não se pagar impostos. Bastará criar uma “entidade religiosa” só no papel para se ter direito à imunidade tributária. Para quem não é da área, informo que elisão tributária é uma forma de planejamento que visa a reduzir a carga tributária a ser paga por um contribuinte, valendo-se de meios legais ou de manobras contábeis, mas sem cometer ilícito;
  4. A inclusão da competência para os Estados instituírem nova contribuição sobre produtos primários;
  5. A manutenção de distorções do atual sistema tributário;
  6. A criação de um quarto poder da República, na realidade, um simulacro de Governo Central, o tal Conselho Federativo, composto por 54 conselheiros, que serão técnicos não eleitos pela população, e que, gerirá, arrecadará e distribuirá receita tributária equivalente a 9 % do PIB e quase um terço da carga tributária do País. Será o fim da Federação.
  7. Não foram elaborados e apresentados pelo governo federal os cálculos e as simulações sobre o quanto os estados, os municípios e os contribuintes perderão com a centralização (com a esfarrapada desculpa de simplificação) dessa Reforma Tributária. Sobre o assunto, ficamos sabendo que, com base no texto que teria sido aprovado pela Câmara Federal da Reforma Tributária, a alíquota efetiva do novo tributo brasileiro para taxar o consumo de bens e serviços ficaria em 28,4 %, segundo aponta nota técnica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea. Seria a maior alíquota do mundo para um Imposto sobre Valor Agregado – IVA. Hoje, a maior do gênero é a da Hungria, de 27%.

É… ler e interpretar textos  com mais do que 280 caracteres (veja o Twitter) e fazer contas dá muito trabalho e não é para qualquer um. Esperamos que os Senadores analisem com lupa e com afinco o texto da Reforma Tributária quando ele finalmente for encaminhado para eles.

Menos discurso bonito de  solução mágica para todos os problemas tributários do País e mais análise completa e com cálculos do que será votado !

Caso contrário, será verdadeira, no Brasil, a frase abaixo:

“Leis, como salsichas, deixarão de inspirar respeito na proporção em que sabemos como elas são feitas.” (John Godfrey Saxe, em The Cleveland Daily Herald, em 29 de Março 1869).

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