Bia Willcox: Rio, o Melhor Namorado

Bia Willcox repete o que um dia disse Tom Jobim: “Eu não moro no Rio, eu namoro o Rio.”

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Praia de Ipanema - Foto: Ricardo M R Pereira

Eu não conheço todos os cantos do Rio de Janeiro. Muitos lugares eu já conheço e outros tantos pretendo um dia conhecer. Mesmo os lugares que não visitei, somente por fotos e vídeos, já são íntimos pra mim. Porque o Rio é assim, “de casa” pros que moram e pros que não moram nele.

Mesmo não sendo uma profunda conhecedora dessa cidade e de todos os seus cantos, eu tenho aquela sensação boa toda a vez que pouso no Galeão (Galeão, sim. Essa sensação começou quando ainda era Galeão e pronto!)  ou no Santos Dumont. Ou mesmo quando chego na Avenida Brasil, na Linha Vermelha, na altura do Gasômetro, ou ainda quando entro no túnel Rebouças – a sensação terna de que aterrizei no meu ninho. De que “tô em casa”.

Ah, o Rio! Quantos sentimentos (às vezes conflitantes) provoca na gente!

Sua beleza está também em nos acolher em seus diferentes pontos, a despeito de seus perigos, da violência, das inundações e confusões, o Rio sempre dá um jeito de abrir seus braços para nós. E se falo de uma cidade inteira com esse espírito maternal, que dirá o lugar onde vivo. Aqui, tenho colo, abraço e sorriso todo o dia, toda a hora.

Falo da sorridente Ipanema. Como não falar mais de onde resido, respiro, transpiro e amo? Sei que poderia escrever sobre qualquer ou sobre todos os bairros dessa cidade literalmente maravilhosa, mas seria uma escrita não vivida. Por isso falo do que vivencio, mesmo sabendo que seria mais eclética, popular e justa se enaltecesse diferentes vizinhanças de nossa cidade.

Mas agora é sobre Ipanema. E também do que o dinheiro não compra.

É sobre sair a pé por esse bairro e cumprimentar porteiros, sorrir para os camelôs, ser conhecida no pet shop, na Nema, na loja do Açaí, no Polis, no salão de beleza, e até mesmo por alguns caixas do Supermercado Zona Sul.

Ipanema consegue abrir um sorrisão em plena segunda à noite com seus bares e restaurantes cheios, com sua multiplicidade de línguas e etnias e com sua vocação para a festa. Basta caminhar pelas ruas do bairro sem pretensão de sentar-se em lugar algum, para voltar para casa tocado por sua energia.

Conhecemos cachorros pelas ruas e paramos para brincar e conversar. Pessoas estranhas se cumprimentam e, se precisar, se ajudam.

Quando eu estava de muletas pelas ruas de Ipanema, fui ajudada várias vezes por moradores das redondezas. Quando enrolada com muletas e saco de padaria, um homem simplesmente largou sua pasta de trabalho na mesa da Nema para chamar um táxi para mim e ter a certeza de que entrei bem. Nunca soube o nome dele. Não precisa. Aqui a boa vontade e a presteza são anônimas.

Mesmo quando o bairro fica transformado no Carnaval, ainda assim nos sentimos em casa. Nas praças, no calçadão, no Arpoador cheio, nos quiosques, nas calçadas… Ipanema é sempre mãe – mãe jovem e afetuosa. Mãe descolada e aberta ao novo.

Seja um café no Talho ou no Empório, ou frutas e temperos da feira da Nossa Senhora da Paz – ponto de encontro de crianças e adultos de todas as idades também, Ipanema exala aromas e simpatia.

Eu poderia ficar aqui horas e horas citando todos os pontos e todos os rostos que encontro pelo bairro, desde o sapateiro da Farme e a lojinha que tem tudo que você precisa na Teixeira de Melo, até o Alalaô Kiosk no Arpoador, ah! ou o Pedro da água de coco na Lagoa. Andamos por aqui como se estivéssemos numa província onde todos se conhecem e recebem quem não é daqui com vontade de agradar. Ipanema é só amor.

Tenho certeza de que cada canto dessa cidade, cada mini-Copacabana, cada sub-Barra, tenha encantos para serem vividos e compartilhados, assim como eu vivo cotidianamente os pequenos encantos da minha vizinhança.

A terra vanguardista do Tropicalismo, da Bossa-Nova, do Pasquim, do Teatro Ipanema, da tanga, do topless, do Tom e do Vinicius e das Dunas da Gal, é a mesma que gargalha docemente a cada vez que te vê passar por suas ruas.

Suas belezas naturais fazem com que pessoas como eu, de pouca fé, agradeçam, num ato quase involuntário, a oportunidade de ver mais uma vez, todos os dias, o Cristo na Lagoa, a pedra do Arpoador, os dois irmãos, o pôr-do-sol.

Falo de onde vivo dias tristes e alegres, dias de chuva e de sol. Falo do lugar que cuida de mim e que, todos os dias, sorri para mim (isso quando não me estende a mão).

E assim é todo o Rio – cheio de encantos em cada canto. Cada encanto do seu jeito ou forma, mas todos juntos, fazendo do Rio de Janeiro essa nuvem mágica de energias que magnetiza e apaixona.

Sabemos do que não devia existir. Sabemos do que é frio e desigual. Mas, com isso tudo, o Rio continua lindo (e quente, em todos os sentidos).

Dito isso, preciso repetir o que um dia o nosso Tom disse: “Eu não moro no Rio, eu namoro o Rio.”

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