A Cidade das Artes, no Rio de Janeiro, entre os dias 11 e 16 de abril, torno-se palco para o Rio2C, o maior evento de criatividade da América Latina, com a presença de mais de mil palestrantes abordando temáticas atuais e urgentes da Indústria Criativa. Sem dúvida, um período e um espaço para importantes conexões e desafiadoras reflexões, uma vez que, eventos desse porte tem o potencial de estabelecer – ou ao menos sugerir – o tom de desenvolvimento do mercado nos decisivos próximos meses.
Para o setor do audiovisual, uma oportunidade única de reunir os maiores representantes no Brasil das plataformas de streaming, as produtoras e os criadores de conteúdo: a tríade que hoje compõe um importante pilar do segmento no país. Com o recrudescimento do fomento público observado nos últimos anos, o financiamento privado através desses players acabou por se tornar uma das principais formas de subsistência do mercado audiovisual brasileiro.
Se por um lado o aumento dessa oferta de recursos privados “aqueceu” o mercado e proporcionou uma verdadeira explosão de produção de conteúdo brasileiro e, consequentemente, geração de trabalho e renda para a cadeia criativa que clamava por alternativas, o seu crescimento desenfreado e sem regulação pode acabar por transformar em “prática de mercado” a condição de vulnerabilidade de nossos criadores e artistas.
Como em toda dinâmica de financiamento, a menos que haja orientações claras e diretrizes setoriais, quem financia acaba por ditar as regras. E, se pensarmos no contexto da criação e da prestação de serviços artísticos, transferir tamanho poder para grandes corporações internacionais sem qualquer tipo de gestão pode representar um potencial risco para o desenvolvimento e a exploração da nossa propriedade intelectual.
A intenção da presente reflexão não é desestimular tais investimentos, mas certificar-se que o seu crescimento seja sustentável a partir da inexorável constatação de que sem as garantias mínimas de direitos para os criadores, morre lentamente a criação. Sem o fortalecimento da espinha dorsal composta pelos indivíduos que criam, dirigem, atuam e produzem, o corpo da produção não se sustenta, por mais robusto que pareça ser.
A fragilidade dos criadores é evidenciada, por exemplo, em aspectos práticos revelados ainda na fase de negociação e que acabam por se cristalizar em contratos com pouquíssimas ou quase nulas possibilidades de alteração, com cláusula formuladas, muitas vezes, sob a dinâmica do copyright, que, em sua essência, acabam por contrariar a mens legis da própria legislação autoral brasileira.
A partir do entendimento de que a produção cultural audiovisual não só representa um setor de mercado que gera renda e emprego, mas também uma importante fonte da cultura nacional e fruto da propriedade intelectual brasileira, é razoável concluir pela importância da atuação do Estado na regulação desse mercado.
Tal desempenho pode ser feito através da implementação de políticas públicas razoáveis que garantam o crescimento sustentável desse modelo de negócios com um contorno protetivo ao criador sem inviabilizar a produção e garantindo a manutenção de retornos positivos para todos os envolvidos, inclusive os próprios financiadores!
Se queremos nos nutrir dos melhores frutos, é essencial diferenciar na prática a colheita consciente da extração exploratória. Praticar a reflexão e abrir um caminho de negociação e composição de caminhos equitativos de negócios sob o manto de políticas públicas sólidas é um excelente primeiro passo.
* Carol Bassin, Advogada especializada em propriedade intelectual, legislação de incentivo e proteção autoral, com experiência de atuação no suporte jurídico e estratégico ao mercado de produção cultural, mídias digitais e negociações envolvendo licenciamento de direitos. Atualmente atua como Consultora Jurídica e Business Affair da agência Condé+. Membro Efetivo da Comissão de Direitos Autorais, Direitos Imateriais e Entretenimento da OAB/RJ