O programa Reviver Centro, cujo projeto foi sancionado em 14 de julho de 2021, foi elaborado com o objetivo de promover a revitalização urbana e ambiental do Centro do Rio de Janeiro, através de iniciativas de retrofit, além da construção de novas edificações. Em seus dois anos de existência 2.400 unidades foram licenciadas. Para atrair empreendedores, a Prefeitura ofereceu diversos benefícios fiscais aos interessados, entre os quais: suspensão da dívida ativa do IPTU e liberação de taxas de licenciamento de obras.
Mas o projeto, que em seu planejamento inicial atendia os bairros de Santo Cristo, Gamboa, Saúde, Centro e Lapa, enfrenta problemas quanto à conservação e ordenamento do espaço público. Falhas que podem comprometer ainda mais o programa, já que Projeto de Lei Complementar Nº 229 da Prefeitura, ampliou os bairros atendidos pelo Reviver, que incorporou a Praça XV, o Castelo e a Cinelândia.
A rádio CBN realizou uma pesquisa junta à Prefeitura e verificou que das 35 metas de requalificação do Centro, 20 ainda não foram concluídas. Outras oito, cujos prazos de concretização expiraram, sequer foram iniciadas. Segundo o veículo, a maior parte das medidas dizem respeito à manutenção da região. Entre elas estão a extinção de pontos de alagamento, a recuperação da iluminação histórica, a requalificação do entorno da Central do Brasil e a adoção de medidas de acessibilidade.
Em entrevista à rádio, o arquiteto e urbanista, Washington Fajardo, que comandou a elaboração do Reviver Centro, explicou que a ampliação da oferta das unidades habitacionais é apenas uma das etapas do programa. Para Fajardo, a falta de ações de conservação e ordenamento público tornam o êxito do programa incerto.
“Uma das frentes é a repovoação do Centro, com o aumento da oferta de moradia. Ao mesmo tempo é necessário aumentar a atratividade. Tem que haver mais pessoas querendo morar no Centro. Por isso, o espaço público é fundamental. Não é um trabalho acessório ou pequeno. Infelizmente, ele está sendo deixado de lado”, lamentou o arquiteto, que foi secretário de Planejamento Urbano da Prefeitura.
Pelo levantamento da CBN, o Reviver Centro conta com 37 pedidos de licença para construção; 26 já foram concedidos pelo poder público municipal – somando mais de 2.400 unidades residenciais a serem edificadas. Em caso de autorização das outras 11 licenças, serão mais 3.100 novas unidades disponíveis para a população. A primeira etapa do Reviver Centro, de acordo com Washington Fajardo, já teria sido cumprida, com o licenciamento de 2.400 unidades – a meta era atingir essa marca até 2024.
Mesmo com os problemas apontados, a população está sensível à ideia de morar na região, como apontam os dados do Sindicato da Habitação (Secovi Rio). Segundo o Sindicato, houve um acréscimo dos números de imóveis transacionados no Centro do Rio, nos primeiros cinco meses de 2023, com 816 unidades vendidas – quase quatro vezes mais que no mesmo período de 2021 – antes do Reviver -, quando foram vendidos apenas 206 imóveis.
Para Gisele Oliveira, representante de moradores e síndicos de bairros do Centro junto à Prefeitura, a região registrou um aumentou de circulação de pessoas. Mas, segundo ela, ainda há problemas de infraestrutura e ordenamento a serem enfrentados.
“Nota-se que houve uma melhora na circulação de pessoas pelo Centro. É lógico que há espaços e ruas que não contam com uma vida noturna movimentada. Esses locais ficam mais desertos e mereceriam uma atenção maior e uma iluminação melhor. Acho, principalmente, que poderia haver uma melhor comunicação por parte da Prefeitura junto às pessoas que fazem a representação dos síndicos e dos moradores”, disse Gisele à CBN.
Tal necessidade também foi apontada pelos vereadores do Rio de Janeiro, durante discussões sobre o Reviver na Câmara Municipal, especialmente as relacionadas aos estudos de impacto de vizinhança para a adequação do projeto às necessidades da população que já vive na região.
Para a vereadora Mônica Benício (PSOL), que é arquiteta e urbanista, o formato adotado no programa levará à expulsão das famílias mais pobres que residem na região central da cidade.
“O que o Reviver Centro faz, na verdade, é entregar o Centro da cidade à especulação imobiliária. Possivelmente entregando a região à lógica do Airbnb. Então, você vai trazer ao Centro da cidade, os grandes empresários e os grandes investidores, que não estão morando e nem vão morar na região. E não vão fazer o que o projeto promete no seu conceito de repovoar o Centro da cidade. Você vai produzir uma lógica de gentrificação. Tirando os pobres, que hoje conseguem morar no local. Tirando deles o acesso a serviços, ao lazer e à cultura”, disse a vereadora.
A ampliação de imóveis para a população mais pobre, que ganha até salários-mínimos, foi apontada pela arquiteta Rose Compans, do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio (CAU), como um dos dilemas do Reviver Centro. Segundo Rose, há mecanismos voltados para este fim, mas eles não teriam sido regulamentados pela Prefeitura.
“Uma série de programas e instrumentos que estavam previstos na Lei Complementar 229 até agora não saíram do papel. Programas como locação social, moradia assistida, assistência técnica e melhorias habitacionais e autogestão. Nada disso foi regulamentado pelo poder público. São programas fundamentais para uma política habitacional focada na população que ganha até três salários-mínimos, que representa 90% do déficit carioca e brasileiro”, comentou a arquiteta.
A CBN procurou a Prefeitura para falar sobre os entraves apontados. Sobre a gentrificação, representantes do poder público municipal afirmaram as inciativas de regulamentação do déficit e da inadequação habitacional previstas no Reviver Centro já foram regulamentadas. Sobre as 28 medidas de melhoria do espaço público expiradas, a Prefeitura não explicou o motivo dos atrasos.
As informações são a rádio CBN.