A maricultura na região dos Lagos do Rio de Janeiro está passando por um momento de revitalização, com esforços direcionados ao cultivo de vieiras em Arraial do Cabo. Este molusco, semelhante à ostra, é característico da costa brasileira e altamente valorizado na gastronomia. Tradicionalmente, a produção de vieiras no estado tem se concentrado em Angra dos Reis, reconhecido como o maior polo de cultivo de vieiras do país, com uma produção anual de cerca de 40 mil dúzias. No entanto, a região enfrenta atualmente uma crise devido à mortalidade inexplicável das vieiras, resultando em uma demanda que supera a oferta e mantém os preços elevados.
Estudos indicam que a produção de vieiras foi maior em águas mais frias e durante picos de clorofila nos últimos 13 anos. Nos últimos cinco anos, os níveis de clorofila e a produção de vieiras diminuíram significativamente, possivelmente devido às mudanças climáticas. A má qualidade da água do mar e o aquecimento global são vistos como causas do colapso da maricultura de vieiras na Baía da Ilha Grande.
Para atender à crescente demanda e estabilizar os preços, foi criado em Arraial do Cabo o projeto Lagos em Ação que conta com a produção de sementes em laboratório, uma etapa crucial para alcançar esse objetivo. A ideia é criar sementes de vieira com qualidade suficiente para serem enviadas para Angra dos Reis e, em paralelo, estabelecer um polo escalonável em Arraial do Cabo. Especialistas sugerem que a transferência de juvenis de vieiras do laboratório para o mar deve ser sincronizada com períodos de maior clorofila e temperaturas mais baixas, e que a mitigação da poluição é necessária para melhorar a qualidade da água e sustentar a produção. O ambiente de Arraial, neste caso, é perfeito com suas águas limpas e temperatura própria.
Fundada em 2008, a ONG Lagos em Ação trabalha em parceria com universidades como a UFRJ e UERJ, desenvolvendo inovações que reduzem custos e aumentam a eficiência. Um exemplo é a substituição de galões por flutuadores, que têm uma durabilidade maior e menor custo a longo prazo. Enquanto um galão custa em média R$ 200, um flutuador custa R$ 350 e pode substituir até 50 galões. Atualmente, todos os flutuadores usados no projeto foram doados e estão sendo usados na nova fazenda marinha, que além da vieira, produz também ostras, mexilhões, algas e peixes como olho de boi e xerelete.
Turismo sustentável
Em 10 dias, a ONG irá inaugurar uma fazenda marinha com capacidade de produção para até 12 famílias. A fazenda será aberta para visitas turísticas e educativas, oferecendo uma experiência de quatro horas ao custo de R$ 180 por pessoa, com grupos de até 15 participantes. “É importante preservar a cultura e testar em nível experimental para replicar em outros lugares. A estruturação da fazenda marinha faz com que a gente consiga atingir os jovens mais facilmente. A vontade deles de participar das atividades da maricultura se ampliou com os equipamentos”, explica Murilo, que reconhece o apoio da Prio – maior empresa independente de óleo e gás do Brasil – como essencial para as iniciativas que estão acontecendo na região. A ONG foi uma das selecionadas por um edital da empresa. A realização do projeto Lagos em Ação é uma medida compensatória estabelecida pelo Termo de Ajustamento de Conduta de responsabilidade da empresa PRIO, conduzido pelo Ministério Público Federal – MPF/RJ.
“Antes da Prio, os recursos chegavam de forma inadequada. Agora, temos apoio significativo, como fábrica de gelo que reduziu o custo do gelo de R$ 20 para R$ 5. O investimento na maricultura está beneficiando toda a cadeia produtiva da região”, relata Paulo Cordeiro, presidente da Ong.
“A maricultura no estado ficou sucateada por falta de política pública e investimento. Hoje, o investimento da Prio está promovendo uma reviravolta na cadeia produtiva”, observa Murilo Marins, maricultor da Lagos em Ação.
Biojóia e Medicina
Até os restos de escamas e cascas são utilizados na criação de biojóias, sustentando famílias artesãs. Além da gastronomia e do artesanato, a vieira também tem importância para pesquisas médicas. As vísceras das vieiras estão sendo usadas em testes para a produção de medicamentos que reduzem células tumorais. Com financiamento do Ministério da Saúde, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), do Instituto Senai de Inovação em Biosintética e Fibras investigam se um composto presente em vieiras pode ser usado no combate a metástases.