”O Amanhã Não Está à Venda” é um ensaio que reúne as ideias do ambientalista e líder indígena Ailton Krenak sobre a nossa realidade nesta época de pandemia. É um ensaio curto, mas rico em reflexões e está disponível gratuitamente em e-book publicado pela Companhia das Letras.
Em isolamento com a família na aldeia Krenak, em Minas Gerais, Ailton reflete sobre a relação entre o ser humano e a natureza. Ainda em luto pelo que aconteceu ao Rio Doce (que foi contaminado quando ocorreu o rompimento da barragem de Mariana), o líder indígena pensaem como o nosso modo de vida afeta o meio ambiente:
”Quando engenheiros me disseram que iriam usar a tecnologia para recuperar o Rio Doce, perguntaram a minha opinião. Eu respondi: ‘A minha sugestão é muito difícil de colocar em prática. Pois teríamos de parar todas as atividades humanas que incidem sobre o corpo do rio, a cem quilômetros nas margens direita e esquerda, até que ele voltasse a ter vida’. Então um deles me disse: ‘Mas isso é impossível’. O mundo não pode parar. E o mundo parou.”
Krenak reflete ainda sobre a ideia de humanidade. Será que ainda pensamos no ”verdadeiro sentido do que é ser humano” ou é apenas uma ideia que já está naturalizada para nós? Ele critica a postura do Presidente da República diante da pandemia, afirmando que ela faz parte de ”uma mentalidade doente que está dominando o mundo”. Critica também a ideia de que a economia não pode parar, já que quem move a economia são os seres humanos e, enquanto estivermos em risco, ”qualquer atividade humana deixa de ter importância”.
Para o líder indígena, a humanidade chegou a esta situação em função do nosso antropocentrismo, ou seja, da crença de que o ser humano é o que há de mais importante. Por isso, seguimos com a destruição da natureza, como se ela e o homem fossem coisas distintas. Segundo ele, tudo é natureza, sem distinção. E o vírus seria uma resposta do planeta ao modo de vida insustentável que escolhemos ter:
”O que estamos vivendo pode ser a obra de uma mãe amorosa que decidiu fazer o filho calar a boca pelo menos por um instante. Não porque não goste dele, mas por querer lhe ensinar alguma coisa. ‘Filho, silêncio.’ A Terra está falando isso para a humanidade. E ela é tão maravilhosa que não dá uma ordem. Ela simplesmente está pedindo: ‘Silêncio’. Esse é também o significado do recolhimento.”
Ailton Krenak é uma das mais importantes vozes da atualidade em defesa do meio ambiente. O título do livro remete a sua reflexão de que devemos parar de deixar as coisas para depois, já que não sabemos se estaremos aqui. Seus pensamentos sobre este momento são importantes e nos fazem também refletir sobre a vida que teremos pós-pandemia, pois, se depois de tudo isso voltarmos a viver como antes, é sinal de que não aprendemos nada.
- Livro: O Amanhã Não Está à Venda
- Autor: Ailton Krenak
- Editora: Companhia das Letras
- Nota: 5 (de 5)