Crônicas cariocas. Não, não falo aqui especificamente sobre aquele gênero textual presente em jornais, revistas, portais de internet e afins que geralmente aborda situações cotidianas. Aliás, é um gênero bem tradicional na literatura brasileira, do qual sou um aprendiz. Mas a ideia aqui é falar sobre a exposição que leva esse nome e que vi no MAR, o Museu de Arte do Rio: Crônicas Cariocas.
Num dia desses qualquer de aspecto londrino, ou seja, tempo nublado e chuvoso, fui ver a exposição supracitada. Inclusive, devo dizer que nunca estive em Londres, mas assim me sentia naquelas semanas sem ver o sol usual do Rio de Janeiro. Então, sob aquela garoa, fui até o MAR e mergulhei em obras diversas, entre fotografias, pinturas e artes plásticas. E eram a cara da minha cidade.
Confluências
O Rio de Janeiro é uma mistura louca de bagunça e religiões, onde fés e malandragens convivem nas esquinas quase sem lei. Viajei ali vendo como o Rio é rico em influências. Estavam lá fotos no Mercadão de Madureira que lembravam minha infância, quando caminhava com minha mãe saindo do apartamento onde morava na rua Soares Caldeira. Em outra sala, São Cosme e Damião eram lembrados, nessa tradição tão bonita que acontece anualmente. Bem como São Jorge, o santo guerreiro, cujos festejos de abril une os filhos de Ogum e os devotos católicos.
Outro canto tinha Seu Zé Pilintra em várias imagens com sua vestimenta típica e suingue malemolente. Enquanto isso, os ciganos também eram lembrados, nas figuras de Pablo e Zaíra, o povo nômade cuja terra é a liberdade. Ah, mas tudo começa com Pretos-Velhos na entrada. Vi cachimbos e figas. Lembrei logo de uma de madeira que meu pai tinha, logo ao lado de uma cruz com Jesus Cristo.
O quanto daqueles sangues corre em minhas veias e nas de tantos cariocas e brasileiros? E quantos já pararam para pensar na jornada de seus ancestrais e antepassados? Percorrendo aquelas salas encontrei com o passado que me construiu, e que me permite ser quem sou hoje. O passado presente e futuro que caminha comigo nessa trilha louca chamada vida. Na barba do Preto-Velho vi meu avô. No chapéu do Zé Pilintra, a Lapa da minha juventude. Na bandana do cigano estavam as linhas da minha mão. Senti o sabor doce de Cosme e Damião. Nas gafieiras estavam meus tios.
No outro dia, na rua Joaquim Silva, citada na exposição por causa de Raquel Pick, polonesa mãe de Jacob do Bandolim, estava eu, ao lado da Escadaria Selarón, a dançar forró com meus botões em busca de conclusões.
Não achei nenhuma. Porém, na terça em que o sol apareceu, nasceu, mais uma, crônica carioca.