Ediel Ribeiro: A poesia de Felipe Granados

'Viveu pouco. Levava uma vida boêmia, bebendo de bar em bar e passando noites buscando asilo em pousadas para migrantes, onde dormia por pouco dinheiro em catres nem sempre limpos'

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Conheci a poesia de Felipe Granados pouco depois de sua morte, em 2009.

Granados morreu jovem, aos 33 anos. O poeta ainda hoje é lembrado como o grande poeta cartaginês dos últimos tempos.

Viveu pouco. Levava uma vida boêmia, bebendo de bar em bar e passando noites buscando asilo em pousadas para migrantes, onde dormia por pouco dinheiro em catres nem sempre limpos.

Não teve muito tempo para mostrar ao mundo sua poesia. Publicou uma única coletânea de poemas (Soundtrack, Ediciones Perro Azul, 2005). Colaborou em dezenas de revistas como ‘Amigos de lo Ajeno’, no suplemento ‘Áncora’ do jornal ‘Nación’, de Costa Rica e inúmeras resenhas na revista ‘Soho’.

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Foi um poeta louco; o amigo inconstante; o pai fiel; o errante; o marginal; o doente. A poesia pessoal de Felipe Granados em vez de rebaixar sua obra a fortalece, quando na maioria das vezes essa circunstância costuma produzir o efeito contrário, pois a poesia meramente autobiográfica não costuma resistir ao passar dos séculos.

Granados foi obrigado a realizar um trabalho de vinte anos em poucos meses. Foi da poesia irreverente e juvenil à poesia adulta. Foi forçado a crescer porque não teria tempo. Sua poesia me causa dor e, ao mesmo tempo, uma profunda alegria.

A acidez sombria de sua obra fala de amor e solidão. A contundência dos versos, se derrama sobre o verso que dói.

Fã de Nina Simone e da poesia de Charles Bukowski – que lia sempre antes de dormir – Felipe Granados morreu de AIDS, em 26 de agosto de 2009.

Sua obra poética de alguma forma representa e dá origem à poesia atual de jovens autores da América Latina, como Luis Chaves (San José, 1969); Patricio Grinberg (Buenos Aires, 1970); Frank Báez (República Dominicana, 1978); Héctor Hernández Montecinos (Santiago, 1979) e Gladys González (Santiago, 1981), que compartilham com ele a certeza de uma vida sem futuro, decididos a se redimir pela beleza das coisas mais tangíveis do universo imediato.

Um dos poemas mais bonitos de Felipe Granados

ONE BOURBON, ONE SCOTCH, ONE BEER

Chorei por ti

como se deve chorar

para que seja genuíno.

Chorei embriagado.

Percorri a cidade

com enorme vontade

de não levar meu nome

apenas para que não me tocasse

esta tristeza.

Chorei por ti

caído nos esgotos

como um tipo qualquer

soube então

que às vezes a lua

é melhor vista de um bueiro.

Chorei por ti

em um carro da polícia:

é a primeira vez

que prendem um fulano

pelo delito menor da nostalgia.

Chorei embriagado

e em meu delirium tremens

cheguei a crer

que todos os bêbados

choravam por ti.

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Jornalista, cartunista, poeta e escritor carioca. É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG) e Diário do Rio (RJ) Autor do livro “Parem as Máquinas! - histórias de cartunistas e seus botecos”. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) dos romances "Sonhos são Azuis" e “Entre Sonhos e Girassóis”. É também autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty", publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ), desde 2003, e criador e editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!"
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