Ediel Ribeiro: Crise chegou à classe executiva

Cronista do DIÁRIO conta divertida história vivida em um voo

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É o momento mais difícil do voo – exceto a turbulência e a queda, claro.

Tenho a impressão que a fila nos aeroportos foi especialmente inventada para irritar o maior número possível de pessoas.

Felizmente, inventaram as filas preferenciais. Elas têm evitado que mulheres grávidas, deficientes, crianças e idosos morram enquanto esperam para embarcar nos aviões. 

Outro dia, cheguei atrasado para o embarque e entrei correndo na fila prioritária, reservada aos idosos, onde só haviam duas pessoas.

Uma senhora gorda, calçada com um croc vermelho, e arrastando uma enorme mala com rodinhas , na fila ao lado, reclamou: “Ei! Essa é a fila para os idosos!”

Embora eu já tenha direito de frequentar a fila dos idosos, algumas pessoas acham que ainda sou jovem demais para isso.

A funcionária passou a maquininha no meu bilhete e gritou: “ele está na classe executiva.”

– Tenha uma ótima viagem, senhor – disse, me devolvendo o bilhete.

Classe executiva? Minha passagem era para a classe econômica. Das duas uma: ou a maquininha da funcionária estava com problemas ou ganhei o chamado upgrade; quando a companhia faz a troca de classe de surpresa. 

Isso acontece por vários motivos. O mais comum é quando os assentos da classe econômica estão preenchidos e os passageiros precisam ser alocados em outros espaços.

Por motivos óbvios, achei melhor não discutir com a funcionária. O luxo e a exclusividade da classe executiva sempre esteve presente no meu imaginário. Viajar na classe executiva ou na primeira classe significa usufruir de uma série de benefícios, mimos e conforto que não pertencem a simples mortais como eu.

Mas lá estava eu, rumo ao paraíso.

Enquanto caminhava em direção ao avião, comecei a imaginar a vida de rei que me esperava atrás da cortina que separa a classe econômica da classe executiva.

Durante a viagem, provavelmente teria direito a poltronas espaçosas, alta tecnologia, toalhas quentes, licores e chocolates. O champanhe, com certeza vai correr solto. Para comer, cardápios assinados por chefs de renome da América Latina, que incluiriam camarão, salmão,  foie gras e caviar. Bebidas liberadas durante todo o voo e o entretenimento ficaria por conta dos filmes, todos novos, e das aeromoças com uniformes minúsculos e decotes generosos.

Finalmente, eu estava livre do espaço minúsculo entre as poltronas, do corredor apertado e da comida horrível da classe econômica. Eu já não aguentava mais beliscar aqueles biscoitinhos aperitivos acompanhados de um copinho pequeno de Coca-Cola. Uísque doze anos, espere por mim!

Mera ilusão.

O grande feito das companhias aéreas foi tornar um espaço comum, atrás de uma cortina, em um objeto de desejo. E ainda cobrar mais caro por ele. 

A única coisa que diferencia a classe executiva da classe econômica é que os ricos bebem em copos de vidro enquanto os pobres bebem em copos de plástico (vai que um pobre pense em usar um caco de vidro para exigir um pedaço de pizza, ou, pior, sequestrar o avião). E é só.

A crise, e certo, chegou à classe executiva. 

São as mesmas rações minúsculas de  bolachinhas e um copinho de Coca-Cola ou suco industrializado de futas.

Por que, então, pagar mais caro para viajar na classe executiva? Para olhar com ar de superioridade para os miseráveis que viajam na classe econômica. 

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Jornalista, cartunista, poeta e escritor carioca. É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG) e Diário do Rio (RJ) Autor do livro “Parem as Máquinas! - histórias de cartunistas e seus botecos”. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) dos romances "Sonhos são Azuis" e “Entre Sonhos e Girassóis”. É também autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty", publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ), desde 2003, e criador e editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!"

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