Eu rodava o “Cartoon” – um tablóide de humor, lançado no final da década de 80 – na “Tribuna da Imprensa”.
A Tribuna – lendário jornal, editado pelo jornalista Hélio Fernandes, irmão do cartunista Millôr Fernandes – ficava alí na Rua do Lavradio, 98, na Lapa, num casarão de três andares, com uma enorme escada de madeira que rangia quando você subia em direção a redação ou a sala do “Dr. Hélio”.
Gerações de jornalistas que depois se projetaram nacionalmente deram os primeiros passos na Tribuna da Imprensa.
Profissionais como Zuenir Ventura, Paulo Henrique Amorim, Evandro Carlos de Andrade e outros, passaram pela redação da Rua do Lavradio.
A Tribuna da Imprensa e periódicos como “O Pasquim”, “Movimento” , “O Sol” e “Opinião”; denominados alternativos ou carinhosamente de nanicos, foram os primeiros a se insurgir contra a ditadura.
Foi o jornal que mais sofreu intervenção durante o Regime Militar. Teve mais de vinte apreensões e até censores instalados – de junho de 1968 a junho de 1978 – dentro de seu prédio por dez anos.
Em 26 de março de 1981, uma bomba explodiu na sede do jornal. Um ato creditado a defensores radicais da ditadura militar, com o objetivo de culpar os militantes de esquerda.
Hélio Fernandes, hoje com 97 anos, ainda escreve diariamente sua coluna na edição on line do jornal. O jornalista pode ser considerado o último rebelde de uma estirpe de profissionais que se caracteriza pela contundência do texto – às vezes panfletário e sem medir as consequências, mas inegavelmente corajoso.
Foi preso por seis dias em 1973. Eu tinha um bar – “Retiro dos Artistas” – na mesma rua.
Todos os dias, antes de abrir o bar, eu passava na portaria do jornal e pegava um exemplar com manchetes contundentes, sensacionalistas ou não.
Um dia, no bar, o jornalista Tony Martinelli que trabalhou na “Manchete”, me deu um cartão e disse: entrega pro Hélio Fernandes e mostra seus desenhos pra ele.
Eu morria de medo da figura do Hélio Fernandes, sempre mal encarado.
Mas fui lá. Esperei mais de uma hora, sentado numa grande poltrona de couro, numa sala com móveis antigos.
Finalmente ele chegou. Entreguei o cartão e o envelope com meus desenhos.
Ele olhou pra mim, pegou o envelope e disse:
– Deixe aí. Vou ver.
E continuou andando.
Se viu, não gostou.
Com razão. Meus desenhos eram horríveis.