Ferros-velhos dizem que buscam combater a receptação de materiais roubados: ‘A reciclagem não pode acabar’

Em entrevista ao DIÁRIO DO RIO, Michel Assef Filho, porta-voz da Associação dos Recicladores, falou sobre o problema de cabos e outros materiais furtados e vendidos em ferros-velhos e sobre a importância da reciclagem em uma cidade como o Rio de janeiro

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(Foto meramente ilustrativa de um ferro-velho)

Muito se vem discutido acerca do papel do que se convencionou chamar de “ferros-velhos“, mas que na verdade é um setor inteiro que envolve vários aspectos da reciclagem de lixo. São tantos os casos de roubo e furto de grades, tampas de bueiros, tubulações de todo o tipo, fios e cabos de cobre e até pedaços de monumentos e obras de arte históricas, que a população vem pressionando o poder público para tomar alguma ação. Diversas vêm sendo tomadas, como noticiamos aqui, mas o problema continua e é um dos mais falados do momento. Temos noticiado muitas críticas e ataques à atuação dos chamados recicladores (o nome oficial dos “ferros-velhos”), que vêm sendo até mesmo acusados de instrumentalizar moradores de rua e adictos para obtenção de materiais. Ninguém melhor para dar uma opinião sobre o assunto do que a própria Associação dos Recicladores do Estado do Rio de Janeiro (ARERJ).

Antes de responder o questionário de perguntas feito pela reportagem do DIÁRIO DO RIO, Michel Assef Filho, porta-voz da Associação dos Recicladores do Estado do Rio de Janeiro (ARERJ), fez questão de ressaltar que, “embora seja o terceiro país que mais gera lixo, o Brasil recicla menos de 4% dos resíduos produzidos: segundo dados de 2019, somente 73,1% dos municípios brasileiros possuem coleta seletiva. Ainda assim, isso é suficiente para movimentar R$ 12 bilhões na economia e alçar o Brasil à posição de referência, ao menos quanto à reciclagem de latas de alumínio (97,9%) e de papel (60%). Em qualquer lugar do planeta a reciclagem é tratada como uma atividade essencial, tendo em vista que sem ela o mundo entra em colapso”.

Ainda segundo os dados passados por Michel, no Rio de Janeiro, os números são igualmente superlativos. Um estudo realizado na Região Metropolitana do Estado em 2014, com 33 cooperativas de catadores, ou seja, apenas uma pequena parcela de todo universo de catadores, estimou que, naquele ano, foram poupados 77 mil MWh de energia elétrica, 1 milhão de m3 de água e 317 mil árvores – este último indicador, em razão de reciclagem de papel, equivale a aproximadamente 346 campos de futebol do estádio do Maracanã.

“Em resumo, a reciclagem é sinônimo de renda, emprego, equilíbrio ambiental e aumento de produtividade para a indústria nacional, merecendo a mais especial atenção e incentivo por parte do Poder Público”, disse Michel Assef Filho.

Michel Asseff Filho 1 Ferros-velhos dizem que buscam combater a receptação de materiais roubados: 'A reciclagem não pode acabar'
Foto: Michel Assef Filho, porta-voz da Associação dos Recicladores do Estado do Rio de Janeiro (ARERJ). Divulgação

Paralelo a isso há a questão dos ferros-velhos, que, muitas vezes, compram materiais furtados ou roubados em toda cidade. Cabos, fios, peças de ferro, alumínio, cobre e outros objetos de toda sorte são comercializados nesses espaços, tendo ou não fiscalização do Poder Público sobre a legalidade dos mesmos. Sobre esse e outros temas, Michel Assef Filho conversou com o DIÁRIO DO RIO.

DDR: Qual a avaliação do senhor sobre a ideia do vereador carioca João Ricardo Ribas (PSC), de propor um projeto para proibir a concessão de alvarás de funcionamento para “ferros-velhos” em regiões residenciais ou comerciais, restringindo o funcionamento dos Recicladores às áreas industriais?

Michel Assef Filho: Na nossa opinião tal proposta revela como o legislativo está distante da realidade da atividade. A reciclagem não descansa um só minuto do dia, pois os resíduos são descartados pela sociedade a todo e qualquer tempo, nas áreas residenciais, comerciais e industriais. E a reciclagem funciona como uma engrenagem, iniciando-se com os milhares de catadores que fazem o trabalho inicial indispensável de tirar tais resíduos das ruas, lixos, dentre outras dezenas de locais que a sociedade inadequadamente despeja tais resíduos. Imaginar que esses catadores têm a capacidade de transportar tais resíduos para uma área industrial é se distanciar de maneira trágica da realidade. Os postos de coleta desses resíduos precisam estar onde os resíduos e os catadores estão, sob pena de inviabilizar a reciclagem. Se uma peça dessa engrenagem não conseguir trabalhar, a reciclagem inteira colapsa. Desse modo, restringir o funcionamento dos recicladores às áreas industriais é absolutamente ineficiente.

DDR: O que a Associação dos Recicladores tem feito para ajudar a combater esse problema que traz danos frequentes à população, como quedas de internet e de telefone fixo, além do corte de fornecimentos de gás e de eletricidade, por exemplo, por conta do roubo de cabos?

Michel Assef Filho: A Associação não descansa buscando soluções para o problema, que, repita-se, é um problema social que aflige a sociedade mundial há décadas. Mas como não é necessidade e não é desejo da atividade receber materiais oriundos de furtos e roubos, e hoje vem sendo injusta e irresponsavelmente marginalizada, a Associação já apresentou proposta que se amolda com modelos de sucesso experimentados nos EUA e outros países, que é a sinergia entre autoridades e recicladores. A Associação ofereceu formalmente ao Estado um aplicativo de alerta de furtos, no qual é possível que a empresa vítima de furto e roubo comunique por meio desse aplicativo a referida ocorrência – de maneira imediata –, e um alerta é disparado para todas as empresas de reciclagem da região, com a finalidade de identificar o produto furtado ou roubado, bem como o respectivo infrator. Entendemos que esta é maneira mais eficiente de se identificar o produto furtado ou roubado, bem como seu infrator, e não prejudicará a sociedade ou a reciclagem (pois restringir a aquisição de todo e qualquer material que possa ou não ser oriundo de furto – sem que de fato seja um produto oriundo de crime – é absolutamente prejudicial à sociedade, já que esse material vai acabar no aterro, de maneira lastimável, e sem sentido). Essa medida é muito mais eficiente do que qualquer medida imposta pelo Estado até este momento. Ao mesmo tempo, a Associação vem mantendo inúmeras reuniões com o Município e Estado para busca de uma solução. Em outro caminho, a Associação notificou todas as concessionárias de serviços públicos do Estado para buscar informações sobre o número de ocorrências que sofreram nos últimos tempos, assim como os locais mais afetados, mas, infelizmente, pequena parcela colaborou com respostas. Tais informações são muito importantes para que os recicladores possam ter ferramentas de como agir.

DDR: Quanto aos ferros-velhos que foram denunciados, fechados, por essas práticas, qual foi a providência da Associação dos Recicladores do Estado do Rio de Janeiro com relação a estes associados? Que medidas a Associação pode comprovar que tomou contra ferros-velhos e recicladores que comprovadamente atuaram de forma irregular ou ilegal?

Michel Assef Filho: Não há qualquer informação de reciclador que tenha sido condenado por qualquer prática ilegal originada da recente operação policial. Mas caso a Associação obtenha tal informação, imediatamente tomará providência. Portanto, não há comprovadamente a atuação irregular ou ilegal destes recicladores.

DDR: Qual a posição da Associação acerca dos verdadeiros centros de reciclagem informais que vem sendo criados por populações de rua e adictos, em pleno logradouro público? É possível coibir a prática de comprar os materiais produzidos por estas pessoas no meio da rua, para tentar coibir esta atividade? Existe fiscalização da parte da Associação? Há um Conselho de Ética, por exemplo?

Michel Assef Filho: A Associação está incansável na busca da formalização consciente da atividade, mas precisa do auxílio do Estado e do Município para tal fim, e exatamente em razão dessa necessidade é que a Associação vem mantendo entendimentos de busca de soluções para a formalização dos seus agentes. Mas é preciso compreender a realidade dos catadores e recicladores de pequeno porte, que, como já exposto, são indispensáveis para que a reciclagem continue existindo. Ignorar essa realidade durante o processo de formalização poderá colocar em risco todo o setor.

DDR: Para fechar, quais os planos futuros da Associação dos Recicladores do Estado do Rio de Janeiro para mostrar à sociedade que de fato se preocupa com a imagem do setor, e que condena todos os que exercem esta atividade de forma irresponsável, criminosa, ilegal ou irregular?

Michel Assef Filho: Continuar fazendo o que a Associação vem fazendo. Diariamente mostrar a importância da reciclagem, mostrar a realidade desse setor, buscar soluções eficientes com os órgãos públicos para colaborar com a diminuição dos furtos e roubos, mas que não destruam a atividade da reciclagem, e denunciar às autoridades aqueles agentes que venham a atuar de maneira irregular.

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1 COMENTÁRIO

  1. Há de se analisar que a reciclagem é essencial, não temos cultura suficiente para consumo consensual.
    Porém, a atual situação da cidade do Rio exige uma providência imediata pelo abandono administrativo em que se encontra.
    Cito um ferro velho na rua felizardo fortes, próximo a engenho da pedra, com tampas de bueiro e fiação sendo tranquilamente aceitos.
    Poder público tem dúvida?
    Vai lá!!!

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