Nascida no Rio de Janeiro, em 18 de fevereiro de 1931, Odette Vidal Cardoso, mais conhecida como Menina Odetinha, foi um grande exemplo de exercício das virtudes cristãs. Mesmo tendo vivido tão pouco – faleceu de tifo, em 25 de novembro de 1939 a carioca Odetinha foi considerada pelo Papa Francisco como portadora das chamadas “virtudes heroicas”.
A menina integra o grupo de candidatos a santos da Santa Sé, sendo considerada “venerável serva de Deus”, o que significa que os trâmites passaram da Arquidiocese do Rio, cidade onde Odetinha viveu e morreu, para a alta cúpula do Vaticano, sob o comando da Congregação para as Causas dos Santos. O título é conferido por decreto pelo chefe da Igreja Romana, o que demonstra que o caminho é longo, mas canonização é possível, e segundo fontes da Arquidiocese do Rio, provável.
À BBC News Brasil, a pesquisadora de história do catolicismo na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, Mirticeli Medeiros, esclarece: “Quando há o reconhecimento das ‘virtudes heroicas’, o que significa que a vida da pessoa realmente seguiu os princípios do evangelho de maneira extraordinária, ela passa a ser chamada de ‘venerável'”, afirma Mirticeli, acrescentando que o fato de se tratar de uma criança não modifica os critérios adotados pelos peritos e religiosos encarregados da análise, que perguntam se o candidato a santo levou uma vida baseada no evangelho de maneira excepcional.
O arcebispo do Rio de Janeiro, cardeal Orani Tempesta, lembra que Odetinha, apesar da pouca idade, rezava, cuidava dos pobres e se preocupava com os necessitados, deixando fama de santidade no Rio de Janeiro. O cardeal celebra o fato de a menina ser a primeira da arquidiocese do Rio.
Quem foi?
A menina era filha de um casal de imigrantes portugueses com boa condição financeira, religiosos e caridosos. Foi com eles que ela aprendeu a rezar, a amar Santa Missa, além de cultuar a devoção a Nossa Senhora.
Aos cinco anos, a menina começou a tomar aulas de catecismo, apreendendo todo o conteúdo com tanta facilidade, que dava aula aos colegas. Faltando um mês para completar 7 anos, Odetinha fez a primeira comunhão. Um dos seus sonhos, de acordo com o seu material biográfico, era ver Jesus. Ao longo do tempo, a menina se aprofundou mais na fé, chegando a incorporar o jejum. Ela também relatava à mãe conversas e interações com Cristo.
Diante da doença, Odetinha se mostrou forte, serena e paciente, pois tinha a certeza de que encontraria Jesus Cristo no apagar das luzes. No dia da sua morte, a menina pediu para receber a comunhão. Um sacerdote, estava presente, lhe disse que ela não conseguiria engolir, mas ela insistiu. A ela foram dados um pequeno fragmento da hóstia e água. Odetinha morreu em seguida, recitando uma oração.
O perito do escritório da Causa dos Santos, Padre Nascimento, destaca que a grande marca de Odetinha era a caridade, além da sensibilidade com o sofrimento alheio. O seu amor ao próximo, o exercício puro e intenso das virtudes cristãs e o amor à Igreja da Católica conferem à menina, segundo o sacerdote, as credenciais para a canonização.
À frente da defesa de Odetinha junto ao Vaticano está Paolo Vilotta, que é postulador — uma espécie de “advogado de santos”. Experiente e com trânsito na Santa Sé, Vilotta foi o postulador da causa de Irmã Dulce (1914-1992), que foi canonizada em 2019.
Para Paolo Vilotta, o decreto de Francisco está embasado em profundos estudos feitos por consultores históricos e teológicos e, posteriormente, por cardeais e bispos, que manifestaram um parecer positivo. O decreto, de acordo com Vilotta indica que a menina viveu as virtudes cristãs em grau heroico, o que coloca o seu processo que começou em 2013, em um ponto importante e fundamental.
O próximo passo rumo à sua santidade é a beatificação, mas para isso, os estudiosos da Santa Igreja devem reconhecer um milagre atribuído à Odetinha após sua morte. A menina, que é objeto de devoção popular há mais de 80 anos, especialmente no Rio, conta centenas de relatos de curas milagrosas atribuídos à sua intercessão. Os casos serão estudados nos próximos anos por uma junta de médicos que atuam como consultores do Vaticano. Para que a beatificação ocorra é mais importante declarar que a ciência não tem como manifestar a graça alcançada – mas declaração deve ser unânime.
O fato de a Menina Odetinha ter vivido tão pouco não representa um obstáculo em sua beatificação, segundo os estudiosos, que levam em conta a devoção e a prática cristã diferenciadas, caso dos dois pastorinhos de Fátima, Jacinta e Francisco, que teriam visto Nossa Senhora e, mais tarde, morrido na epidemia de gripe espanhola.
Em entrevista ao G1, o pesquisador José Luís Lira, fundador da Academia Brasileira de Hagiologia e professor da Universidade Estadual Vale do Aracaú, do Ceará, afirmou: “A venerabilidade de Odetinha a coloca à frente das outras crianças, sem a presença do martírio, que são estudadas no Brasil em causas de canonização”, comentou o estudioso, que cita o caso de Odetinha em seu livro À Caminho da Santidade.
Com informações do G1 e BBC News Brasil.