Gustavo de Almeida: Pizzas e “Pizzas”

Para Gustavo de Almeida os cariocas nunca tiveram o hábito de colocar catchup na pizza, a não ser nas de cantina de escola e dos bares da Orla

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Foto: Diana Cabral

Neste feriado, mais uma vez eu navegava no DIÁRIO DO RIO, algo que virou hábito meu de pessoa física mesmo – não apenas por questões profissionais de assessoria de imprensa, mas como morador da cidade. Sem querer criticar os jornalões maiores e de mais investimento, o DIÁRIO DO RIO é hoje o jornal que melhor cobre a cidade, que mostra seus moradores, revela quem está fazendo algo, sem as barreiras menckenianas das redações mais “profissionais” (H.L. Mencken que disse uma vez que “editar é separar o joio do trigo e publicar o joio”). No DIÁRIO DO RIO eu sei que vou receber a notícia de que abriu um café novo perto do meu trabalho, ou vou receber o serviço de um bom restaurante na Ilha da Gigoia – mas sem ser um jornal de turismo ou algo assim. Enfim, o DDR é carioca, feito por cariocas e destinado a cariocas.

E dentro desse espírito eu li uma matéria simpática, de comportamento, com uma lista do que é ser carioca. Tal e qual o Rob Gordon do ótimo “Alta Fidelidade” (filme de 2000, dirigido por Stephen Frears baseado em livro homônimo de Nick Hornby) eu sou fã de listas. Entre itens maravilhosos como “falar mal do JK por ter mudado a capital para Brasília” está o quase obrigatório “Comer pizza com catchup sim, e daí”.

Aqui eu senti a vontade de abrir o debate – e dizer que nós, cariocas, nunca tivemos a tradição de colocar catchup (ou ketchup?) na pizza. Os paulistas, que tentam criar essa polarização (além do chatíssimo “no Rio não tem pizza boa”) criaram essa que é uma das fake news culinárias mais antigas de que se tem notícia.

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Para começar, existem vários pratos chamados de “pizza” – assim como no Rio você pede uma picanha e pode vir muito bem um chã de dentro e tá tudo bem. Pizza é genérico!

Existe a pizza gourmet, sim, aquela que nós temos TÃO BOAS QUANTO AS DE SÃO PAULO (pausa para ser apedrejado por meus amigos de São Paulo): Mamma Jamma, Capricciosa, Bráz e Fiametta (incluo o Artisani, empreendimento novo dos ex-donos da Fiametta do Casa e Gourmet).

Não me peçam para dizer qual a melhor, até porque a graça é ir comendo até descobrir.

Existe a pizza DELIVERY, que é aquilo: Domino’s et caterva. Pede-se na fome e na preguiça.

E finalmente existem os DOIS TIPOS DE PIZZA QUE EM QUALQUER PAÍS OU CIDADE DO MUNDO SÃO FEITAS PARA COMER COM CATCHUP: a pizza de cantina de escola e a pizza “à francesa” dos bares da orla.

A pizza de cantina de escola muitas vezes nem orégano tem. Algumas vezes fazem com pão. Muzzarela? Queijo estepe. Uma delícia, quando sai e é colocada no balcão naquela forma de alumínio. Vende por fatia – e quem compra logo pede o vidro de catchup.

Eu falei VIDRO de catchup. As grandes pandemias provavelmente surgiram quando paramos de fabricar anticorpos com os vidros sujos de catchup e passamos a usar aqueles envelopinhos que só um nórdico do Valhala consegue abrir. Pois bem: nos dão o vidro ou aquela garrafinha plástica e a gente taca catchup NAQUELA pizza. Talvez o certo seria chamarmos de outra coisa e criarmos mais uma diáspora JOELHO X ITALIANO. Chamar aquilo de PÃO DE QUEIJO CARIOCA, quem sabe.

Essa pizza é simplesmente incrível na fome, acompanhada de uma coca-cola de máquina, e é melhor que seja consumida suado e segurando uma bola dente-de-leite da Estrela embaixo do braço.

E tem a pizza ali da orla de Copacabana. As “bolachas” (e não biscoito, pô) de chope vão se empilhando, os comensais vão ficando altos e começam a paquerar as meninas que andam ali pela Atlântica e ganham afagos na auto-estima até o momento em que elas informam que há um preço para o namoro, enfim, tudo vai indo bem até que aparece a famosa FOME DE CHOPE. Só curável com quilos de churrasco ou com a pizza BIG-FAMÍLIA SOPRANO-GIGANTE-ARRANHACÉU-LAGOTAHOE do estabelecimento que acaba de vender mais de 400 chopes pro simpático grupo.

Uma rápida resenha decide que será metade calabresa e metade mozzarella. E o garçom anota e sai para fazer o pedido – mas dá sempre uma recuadinha e dispara:

– Pode trazer “à francesinha”, já com os garfinhos? – pergunta, reencarnando o poetinha por segundos.

Todos evidentemente concordam. Quando a pizza – ou o lago de mozzarella – chega, já fatiada em pedaços muito pequenos, uma LIDERANÇA da mesa assume a missão e pergunta:

– PODE COLOCAR CATCHUP EM TUDO NÉ?

Todos concordam, mas mesmo quando há alguma exceção esta é ignorada. Em dez minutos estará tudo terminado e apenas uns fios de queijo restarão sobre a forma gigante de alumínio.

Pois bem, amigos do DDR e pessoal do lado errado da Dutra (royalties para Arthur Muhlemberg): ESSA “pizza” é com catchup. Em qualquer lugar do planeta. Venham ao Mamma Jamma, ao Brás e à Capricciosa e vejam se sequer existe catchup nesses estabelecimentos? Não existe!

Agora que expliquei nosso hábito, tá na hora é de vocês aí da Paulicéia Desvairada explicarem o purê no cachorro-quente. Fico aguardando!

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