Língua Portuguesa: Pontuação Gráfica, Parte 2

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comma por neys fadzil Língua Portuguesa: Pontuação Gráfica, Parte 2

Prezados Leitores do Diário do Rio:
Peço desculpas pela ausência, mas estive um período fora do Brasil, lecionando. Agora, de volta, manterei a periodicidade quinzenal de nossas colunas. Voltamos a abordar pontuação gráfica, dando continuidade ao que havíamos iniciado.

Lembro que suas dúvidas podem ser enviadas ao Centro Filológico Clóvis Monteiro, da UERJ. O e-mail é cefiluerj@gmail.com

Teremos grande prazer em responder.

Abraços,
Marcelo Moraes Caetano

PONTO E VÍRGULA

Serve para:
1) Separar as diversas partes de um período, atendendo a que se tenham mantido tais partes num igual nível de importância ou valor.

Exemplo:
Cabe ao aluno levantar dúvidas e saná-las junto ao professor; cabe a este interessar-se pelas dúvidas daquele e procurar saná-las da maneira mais profunda e explícita.”

Como se percebe, será o fator de preferência entre a vírgula e o ponto e vírgula, neste caso, a pausa respectivamente menor ou maior que se queira imprimir ao período.

Não é muito usual, assim, que se lance mão do ponto e vírgula para se separarem orações ou muito curtas, ou que NÃO tenham sido (ao menos uma delas) já separadas pela pausa menor (que é a vírgula), pois que servirá o ponto e vírgula, no caso de separar orações em que já haja vírgula (ou vírgulas), exatamente de promover uma distinção entre esses dois níveis de pausa, marcando acuradamente uma pausa mais de uma outra menos longa.

Também é usado o ponto e vírgula para estabelecer uma pronta ruptura entre dois membros de um período, dando-lhes, a cada um, uma como autonomia tal, que poderiam, em última instância, mesmo estar separados por ponto simples.

Assim, neste trecho de Machado de Assis:

“- Capitu!
– Mamãe!
– Deixa de estar esburacando o muro; vem cá
.”

Não é a intenção do ponto e vírgula, ali, primordialmente marcar pausa mais longa, senão que, em lugar disso, estabelecer mais visivelmente a existência de dois elementos de igual valor: duas ordens distintas e equivalentes no que concerne, repetimos, ao peso de que gozam. É como se, após o ponto e vírgula, a mãe de Capitu esboçasse novo semblante, reunindo a força necessária a dar ordem diferente daquela que primeiro dera.

Desse modo, não teve a ver o ponto e vírgula, absolutamente, com a extensão do período, nem, numa análise mais profunda, tampouco com uma maior pausa imprimida: teve a ver estreitamente com um juízo de valor dado às partes da frase: tratou-se, pois, de intenção qualitativa, em vez de quantitativa (referente a tempo simplesmente).

2) Separar, como esboçado anteriormente, as partes de um período, desde que já separadas, estas partes (ou uma delas), anteriormente por vírgulas.

Exemplo:

O filho, preocupado com o tempo, correu ao quintal para tirar as gaiolas; a mãe permaneceu muda no canto.”

O vento é nordeste, e vai tangendo, aqui e ali, no belo azul das águas, pequenas espumas que marcham alguns segundos e morrem, como bichos alegres e humildes; perto da terra a onda é verde.” (Rubem Braga)

A lua escondera-se; mudara o tempo; o céu, de limpo que estava, fizera-se cor de lousa; sentia-se um vento úmido de chuva.” (Aluísio Azevedo)

Um cometa passava… Em luz, na penedia,
Na erva, no inseto, em tudo uma alma rebrilhava;
Entregava-se ao sol a terra, como escrava;
Ferviam sangue e seiva. E o cometa fugia…”
(Olavo Bilac)

Juliana, bem alojada, bem alimentada, com roupa fina sobre a pele, colchões macios, saboreava a vida; o seu temperamento adoçara-se naquelas abundâncias; depois, bem aconselhada pela tia Vitória, fazia seu serviço com um zelo minucioso e hábil.” (Eça de Queirós)

Neste longo trecho de Céus e terras do Brasil (de Visconde de Taunay), cabe tão-somente ao ponto e vírgula estabelecer as pausas maiores e as rupturas mais contundentes, isto é, os campos semânticos divididos, aqui, quase que sistematicamente em torno de núcleos temáticos ligados às espécies distintas de animais descritos, já que, como se observa, não há outra pontuação, além da vírgula – que seria demasiado breve aqui -, a cortar membros, dando-lhes certa independência semântica.

A essa hora, também, é que zumbem em torno das plantas e flores milhares de abelhas, azafamadas e diligentes, aproveitando a fresca para a faina mais fadigosa, vencidas todas no esmero do trabalho pela jati, a mandori e a cacheta; voltam as pombas-trocazes com o mesmo dar de asas apressado e misterioso de quando haviam partido; renovam os quero-queros a grita nas margens dos rios e alagadiços, para os quais acodem abandados os grandes e brancos tabuiaiás, os róseos colhereiros e as alvas e puras garças cujas cores mais se aprimoram à luz do sol cadente; piam nos chapadões perdizes sem conta, e nos bosques principiam os jaós os vespertinos chamados.”

3) Iniciar orações coordenadas adversativas e conclusivas, aumentando-lhes os respectivos teores.

Neste ponto, como em outros, concorre a vírgula com o ponto e vírgula, vencendo, por sem dúvida, aquela pontuação que melhor aprouver ao escritor: fica ao ponto e vírgula, como dito acima, a faculdade de acentuar os sentidos, quer o seja adversativo, quer o seja conclusivo.

Exemplo:

“1. O dia começou intensamente ensolarado, mas o cair da tarde esboçou a chuva que cairia à noite.”

“2. O dia começou intensamente ensolarado; mas o cair da tarde esboçou a chuva que cairia à noite.”

OBS. 1: Se se usam algumas das outras conjunções ou locuções conjuntivas (contudo, todavia, no entanto, não obstante, apesar disso) poder-se-á pontuar o período de duas formas basicamente, quais sejam:

“1. O dia começou intensamente ensolarado; porém o cair da tarde esboçou a chuva que cairia à noite.”

“2. O dia começou intensamente ensolarado; o cair da tarde, porém, esboçou a chuva que cairia à noite.”

Foi precisamente esta segunda a modalidade eleita por Camilo Castelo Branco em:

“O povoléu intacto fugira espavorido, que ninguém se atrevia ao filho do corregedor; os feridos, porém, incorporaram-se e foram chamar justiça à porta do magistrado.”

Num outro momento do mesmo Amor de perdição, Camilo elege o outro giro:

“Sabíamos que ela era dama da Sra. D. Maria I; porém, da soberba com que nos tratou ficamos pensando que seria ela a própria rainha.”

Obviamente no segundo caso, ao jogar a conjunção subordinativa para o rosto da oração, é muito mais abrupta a quebra que se estabelece mercê do caráter adversativo, pois que, a partir do porém, e sobretudo graças à pausa que se lhe segue imediatamente, fica o leitor consciente de que as coisas tomaram um rumo inesperado (a peripécia aristotélica), sendo obrigado a permanecer por um tempo suspenso, por causa, já o vimos, da pausa. Naquela primeira modalidade de pontuação é o processo de peripécia um tanto mais suave e fluido, preparando o leitor com menos incisividade.

Vai do gosto do escritor, assim, a condução que se dará ao leitor.

4) Separar os diversos itens e considerandos em leis, decretos, portarias, estatutos, regulamentos etc.

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PhD em Língua Portuguesa pela UERJ. É professor adjunto de língua portuguesa e filologia românica da UERJ e author and content developer da California State University. Tradutor de inglês, francês, alemão, espanhol, italiano, latim e grego, pesquisador das filologias russa e mandarim. Escritor com mais de 40 livros publicados e premiados no Brasil e no mundo. Membro efetivo da Academia Brasileira de Filologia, do PEN Club Rio-Londres, da Académie des Arts, Sciences et Lettres de Paris e da Academía de Letras y Artes de Chile. Em 2011, recebeu a Comenda e a Médaille de Vermeil do Governo francês.

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